A cultura woke e o wokismo

Padre Manuel Ribeiro, Diocese de Bragança-Miranda

Eis um tema bastante polémico e que bem espelha uma certa e determinada tentativa de doutrinação ideológica da sociedade contemporânea.

É importante afirmar que com a progressiva secularização das sociedades, tende-se a perder o sentido de religião (mas não de religiosidade!) e o sentido teleológico (a teleologia é o estudo filosófico dos fins, isto é, do propósito, do objectivo ou da finalidade). Pensar nesses fins e como esses fins iluminam o ser e o sentido da existência, geram em nós a assunção da consciência de que somos parte integrante de um todo vital, que mutuamente se implica e se supõe.

Por isso, a perda gradual de uma matriz teológica conduz a sociedade a uma perda de referenciais éticos e axiológicos. A noção de bom e de belo – tão queridos na e pela filosofia – encontram verdadeiro sentido quando o Homem se compreende como parte, como parceiro, como gestor do Bem-Comum e da Casa-Comum, como tão sagazmente afirma o Papa Francisco na Encíclica Laudato Si (do ano 2015).

É justo dizer que cada um de nós é fruto de um ambiente, filho de uma determinada época ou de um determinado lugar, e intimamente condicionado pelo seu ambiente social. E se é certo que cada um constrói o seu sentido de verdade, também é certo que através da exposição das ideias – desde que não haja punição por essa partilha – conseguimos chegar a um determinado entendimento, construindo conhecimento e novas formas de ver a mesma e única realidade, ou seja, a vida humana inserida e integrada na vida deste planeta. Esta partilha de visões e de pensamento implica, necessariamente, valores como o respeito, a tolerância e a aceitação da outra opinião, sempre que seja e esteja devidamente fundamentada e justificada.

Herdeira da cultura trotskista, o wokismo parece estar ligado ao renascimento dos movimentos nacionalistas e conservadores, uma vez que a cultura woke pretende não só alterar as estruturas da sociedade, bem como os comportamentos e os padrões sociais estabelecidos. Deste movimento nasce o que hoje denominamos de ‘politicamente correcto’, a ideologia de género, entre outros fenómenos. O wokismo, adotando uma certa roupagem religiosa, quer na sua forma identitária, quer na sua dimensão comportamental, quer no seu linguajar moral e quase inquisitório, assume um certo estilo apologético e de contornos ‘totalitaristas’. Mais, pretende ser um paladino de salvação para um mundo que, supostamente, considera-o decadente, podre e sem sentido. E é precisamente aqui que reside o grande perigo deste movimento.

Notamos que nesta cultura dominante há uma certa ‘policiação’, quer das nossas palavras, quer dos nossos pensamentos. E, pior, parece-me que o movimento woke é usado como uma espécie de instrumento político, com o intuito de implementar doutrinalmente a sociedade actual. Ora, este ambiente social de ‘policiação moral’ e de escrutínio, alicerçado numa lógica do ‘politicamente correcto’, geram na sociedade uma espécie de neblina, com contornos coercivos, totalitários, inquisitórios e com uma enorme hiper-sensibilidade.

Embora haja uma minoria silenciosa a falar desassombradamente deste fenómeno e recordando a frase atribuída a Edmund Burke (filósofo Irlandês do séc. XVIII) “para que o mal triunfe basta que os bons fiquem de braços cruzados”, é preciso reiterar, com assertividade e de forma contundente, que a apresentação de argumentos de matriz e de carisma sofísticos (entenda-se, com o uso de sofismas) destrói os frágeis tecidos sociais e identitários que nos unem e nos fundamentam como Povo, como sociedade, como comunidade e como seres individuais, como herdeiros de um passado e de uma História que nos sustenta e nos projecta.

Creio que seria útil escutar atentamente o podcast “Conversas Visíveis”, do Jornal de Negócios e emitido no dia 2/6/2022, e perceber que “o wokismo, além de ser um pensamento enlatado, apresenta-se como um movimento de moralizadores que pretendem ‘purgar’ as sociedades modernas e ocidentais”.

 

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Agência ECCLESIA

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