Descobertos mais de 70 corpos numa igreja em Lubero, na RD Congo
Podemos ignorar?
Mais de 70 corpos foram encontrados numa igreja protestante numa aldeia no território de Lubero e o Padre comboniano Marcelo Oliveira, em missão há vários anos na República Democrática do Congo, não tem dúvidas em afirmar que se tratou de um massacre. “Esta é uma situação preocupante a que, como cristãos, não podemos ficar indiferentes”, diz o sacerdote numa mensagem enviada para a Fundação AIS.
“O último incidente de que temos informação é o massacre de mais de 70 pessoas que foram encontradas mortas dentro de uma igreja protestante no território de Lubero”, diz o Padre comboniano Marcelo Oliveira, numa mensagem de voz enviada para a Fundação AIS em Lisboa. “Retidas como reféns durante alguns dias, acabaram por ser massacradas numa aldeia de Maiba, sempre no território de Lubero”, esclarece ainda o missionário, não confirmando a informação de que os corpos estariam decapitados e desconhecendo-se ainda quando ocorreu o crime, embora tudo aponte para o final da semana passada. Para o Padre Marcelo, este massacre revela uma “situação preocupante a que, como cristãos, não podemos ficar indiferentes”. As palavras do sacerdote traduzem a inquietação também pelo agravamento da situação humanitária nas províncias do Kivu Norte e do Kivu Sul, palco de combates entre forças rebeldes que, apoiadas pelo vizinho Ruanda, têm vindo a conquistar uma série de cidades e vilas e aldeias na região. “Continuamos a assistir na República Democrática do Congo a um crescente fluxo de ataques, depois da tomada da cidade de Goma, de seguida a cidade de Bukavu, em seguida ainda a cidade de Uvira, para onde eles pouco a pouco se aproximam. Forças rebeldes, com grande assistência do exército do Ruanda, continuam a atacar cidades, aldeias, e a massacrar por onde passam, criando terror, pavor, provocando a fuga de todas estas populações. Uma grande quantidade de pessoas começa a refugiar-se no país vizinho, no Burundi, e fala-se de 100 mil pessoas que teriam já entrado, atravessado a fronteira”, esclarece o sacerdote.
“Quem sofre é o povo”
Os combates na região estão a provocar uma profunda crise humanitária que tenderá a agravar-se, pois os esforços diplomáticos em curso parecem ser insuficientes para travar o avanço dos militares do grupo M23, apoiado pelo Ruanda. “No meio disto tudo, quem sofre é o povo”, sintetiza o missionário comboniano português. “Os militares continuam também a morrer, mas a grande parte da população sofredora são os populares. E, sobretudo, mulheres e crianças continuam a ser vítimas de violação, de perseguição por parte de pessoas sem coração, que não têm o mínimo de sentimentos de compaixão e de amor ao próximo”, acrescenta. “E, por isso, continuam a matar de maneira horrível”, diz ainda o sacerdote lembrando que na passada quarta-feira, dia 19, a ministra dos Negócios Estrangeiros do Congo denunciou também esta situação no Conselho de Segurança da ONU, tendo ela mesma referido “que se trata de um massacre a céu aberto”. “É esse o desejo do Ruanda, de poder massacrar, perseguir, martirizar o povo para que possa liberar o terreno e possam balcanizar toda esta grande parte que é riquíssima e que contém tantos minérios que o Ruanda continua a exportar e que continua a enriquecê-lo, mas com uma riqueza que não é sua, mas que é de outro país”, conclui o Padre Marcelo Oliveira. Praticamente todos os dias, deste país de África, chegam notícias de violência, de abusos de direitos humanos, de exploração indigna dos recursos naturais. Praticamente todos os dias vemos, ouvimos e lemos estas histórias, estas notícias. Podemos ignorar?
Paulo Aido