A cruz escondida

Brasil: O refúgio de Madre Aparecida onde a monotonia não existe

Do carnaval para o convento

Chegou a ter casamento marcado. Quem a conheceu, alegre e divertida, nunca diria que aquela jovem, amante de cinema, das praias do Rio de Janeiro e do carnaval, alguma vez se deixaria deslumbrar pela vida monástica. E, 54 anos depois de ter atravessado a porta do mosteiro beneditino pela primeira vez, a Madre Maria Aparecida conta a sua história. E sorri…

Madre Maria Aparecida é uma das 15 religiosas beneditinas que vivem na Abadia de Nossa Senhora da Vitória, no interior do Ceará, no imenso Brasil. É um convento de clausura, mas pela alegria que estas irmãs colocam nos mais pequenos gestos do dia-a-dia, dá para entender que se trata de um espaço de verdadeira liberdade. A Madre Aparecida já foi a abadessa deste mosteiro. Com o avançar da idade, passou a emérita, entregando o testemunho a outra irmã. “Sou a Bento XVI da comunidade”, diz, a brincar, mostrando que a alegria da juventude nunca a abandonou, mesmo quando decidiu que a sua vocação significaria ter de abraçar a vida religiosa. Desses anos, a Madre Aparecida recorda as idas à praia, as sessões de cinema, as festas em Niterói, no Rio de Janeiro, e, claro, o carnaval! “Carnaval? Era comigo mesmo!” Mas a sua vida iria mudar. “Jesus estava à minha espera”. Maria namorava. Chegou até a ter casamento marcado. Mas alguma coisa a inquietou. Um dia, decidiu que precisava de repensar toda a sua vida. Entrou numa igreja, sentou-se num banco e as lágrimas começaram a correr-lhe pelo rosto. O coração sobressaltou-se. Era ainda algo de imperceptível, mas uma grande revolução estava já em marcha… A sua vida estava prestes a mudar. Aos poucos, as festas perderam brilho, os passeios junto ao mar deixaram de ter aquele encanto e começou a frequentar a igreja do bairro onde morava. A mãe notou logo que alguma coisa estava a acontecer, pois o coração das mães vê mais fundo do que o próprio olhar. Para a ajudar, convenceu-a a ir a uma consulta com um psiquiatra. Ela obedeceu. A resposta do médico foi certeira. “Olhe – disse o psiquiatra à mãe de Maria Aparecida – sou ateu, mas o que a sua filha tem é aquilo a que se chama vocação.”

 

A descoberta

Embalada pelo diagnóstico do médico, Maria Aparecida decidiu conhecer as irmãs beneditinas em Minas Gerais. Entrou no mosteiro, olhou em redor, escutou o silêncio enamorado de Deus que há naqueles claustros e desistiu de procurar mais. “É aqui!” O pior, o mais difícil, seria dizer à família que a vocação de que falava o psiquiatra estava a empurrá-la para um mosteiro de clausura. Sabendo que seria um choque para todos, Maria fez as malas às escondidas e saiu de casa dizendo que ia visitar a irmã que tinha acabado de se casar. Não teve coragem para dizer, cara a cara, que a sua felicidade estava numa vida dedicada a Deus. Por isso, escreveu uma carta. Quando passou a porta de casa pela última vez, rumo ao mosteiro, estava quase a chegar à caixa de correio uma carta onde Maria explicava tudo. Inspiradas em São Bento, as irmãs beneditinas rezam e trabalham. São a retaguarda orante da Igreja. Hoje, quando a Madre Aparecida lembra esses dias em que fez a mala às escondidas e partiu para o Mosteiro, para a grande “aventura da fé” em que se transformou a sua vida, reconhece que essa decisão foi difícil de entender em sua casa, junto da família. “Foi uma tragédia, mas como foi por Jesus, Ele cuidou de tudo.” Sorrindo, a Abadessa Emérita diz que já não tem saudades da praia, nem do cinema, nem do carnaval. “Aqui, na clausura, nunca senti essa coisa da monotonia.” A Abadia de Nossa Senhora da Vitória, onde a Madre Maria Aparecida vive há 54 anos, foi edificada com o apoio da Fundação AIS. Sabia que a Fundação AIS colabora também, todos os dias, para o sustento destas irmãs que, na sua simplicidade, são a retaguarda da Igreja, sustentando-a com as suas orações?

Paulo Aido | www.fundacao-ais.pt

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