A cruz escondida

Ajudar a Igreja na Ucrânia, um compromisso para esta Quaresma

O banquete dos pobres

Sopa quente, café, pão. Talvez mais alguma coisa. À porta da Casa dos Irmãos Albertinos, em Lviv, há sempre alguém à espera, há sempre uma mão estendida. A casa, amarela, é bem conhecida em toda a cidade. A guerra na Ucrânia veio aumentar ainda mais o número dos pobres, dos sem-abrigo, dos que precisam de ajuda para sobreviver. Os tempos estão muito difíceis, mas a porta continua sempre aberta para, como nos diz o Irmão Bernard, “mostrar que a vida é mais forte do que a morte” …

A fila é grande. São homens e mulheres a quem, por vezes, já se perdeu a idade. São pessoas com olhares gastos, cinzentos, apagados. São pessoas com os rostos enrugados, com vidas duras. Muitos são sem-abrigo, outros, tendo casa, nada têm para comer. O Irmão Bernard é um destes homens consagrados que assumiram a missão de olhar pelos últimos da sociedade. A fila à porta da casa amarela dos Irmãos Albertinos em Lviv é sempre grande. Mas desde que a guerra começou na Ucrânia, com a invasão das tropas russas em 24 de Fevereiro de 2022, que tem aumentado o número dos que procuram ali sossegar o estômago nem que seja apenas com uma sopa e um naco de pão. No Inverno, quando as temperaturas ficam escandalosamente muitos graus abaixo de zero, parece que se acentuam ainda mais os sinais que identificam os pobres e os indigentes de Lviv. O frio empobrece as pessoas. É por isso que lá dentro da casa dos Irmãos Albertinos o vapor do quente da panela da sopa ou o aroma do café parecem, para quem está cá fora na fila, uma verdadeira promessa de banquete. O Irmão Bernard conhece a maior parte dos que acorrem ao abrigo desta congregação. Ele próprio diz que eles “são como uma equipa de emergência, de primeiros-socorros”. Apesar disso, apesar de estar ali há anos a fazer todos os dias quase sempre os mesmos gestos, a distribuir comida, a sossegar a fome, o seu olhar ainda se comove com a miséria, com os que não têm nada, com os que vivem na maior indigência. Esses, que são os últimos da sociedade, são a razão de ser destes irmãos. É para eles que trabalham, que se levantam todos os dias, é para eles que mobilizam boas vontades para terem sempre pelo menos uma panela a fumegar ao lume. É para eles que vivem. “O homem da rua, com problemas, alguém que está com frio, alguém que passa fome, é o nosso dia-a-dia. É para isso que estamos aqui”, explica-nos.

“Nada faríamos sem a Fundação AIS”

A maior parte dos que fazem fila à porta da casa amarela dos Irmãos Albertinos em Lviv são alcoólicos, sem-abrigo, têm problemas de drogas ou de jogo ou fugiram da guerra. Todos sabem que ali são acolhidos. Que são bem acolhidos. É o caso de Volodymyr Mack. A tal ponto que Volodymyr agora tornou-se voluntário e tenta retribuir a ajuda que lhe deram ajudando outros que, como ele, também sentiram a vida madrasta. “Ajudo em tudo o que é preciso fazer”, conta a uma equipa de reportagem da Fundação AIS. Agora, Volodymyr até já pernoita na casa amarela, num quarto com beliches. Sente-se bem. Sente-se seguro. Talvez se sinta mesmo em casa. “Fiquei mais calmo porque aqui há mais tranquilidade”, confessa. “Há menos ruído das sirenes de ataque aéreo”, acrescenta. As sirenes, que anunciam bombardeamentos, que avisam da queda de mísseis, desassossegam todas as pessoas, deixam os nervos em franja. São um som maldito que importa esconjurar, ao contrário do badalar do sino que algum dos irmãos toca a avisar que a refeição está na mesa. É o banquete dos pobres. Sopa quente, café e pão. “Esperemos que chegue para cerca de 300 pessoas”, diz o Irmão Bernard Jerzy Charnucha. “Esta é uma cadeia de solidariedade onde não pode faltar nenhum elo”, acrescenta. “Mas nada faríamos sem a Fundação AIS. Sem vós, não existiríamos. Temos de estar ao lado dos oprimidos, devido à situação familiar ou à pobreza, devido à doença mental, ao vício ou à guerra. Temos de os acompanhar, e não abandoná-los, para mostrar que a vida é mais forte do que a morte…”, diz ainda este religioso que é a alma da casa amarela onde ninguém fica de fora, onde todos têm lugar à mesa.

Paulo Aido

 

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Agência ECCLESIA

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