A cruz escondida

Neste Natal, a Fundação AIS lembra os cristãos do Médio Oriente e Terra Santa

“O Líbano está a desaparecer…”

Foi uma terra de vida fulgurante. Hoje, aos poucos, o Líbano está a transformar-se num país fantasma, onde a vida é quase impossível, onde o dinheiro deixou de ter valor, onde falta quase tudo a começar, tantas vezes, pelo pão. Quem pode, parte. Agora, com a guerra entre o Hamas e Israel, o medo ainda é maior… Os que ficam são os mais pobres ou os que ainda sonham com um Líbano renascido. Como a Irmã Hounda…

Hounda Tannoury ainda não se resignou à ideia de que não há futuro para o Líbano. Mas tudo parece dizer o contrário. A moeda desvalorizou-se ao ponto de os bancos fecharem portas, o desemprego passou a ser algo normal e afecta cada vez mais famílias, e a outrora robusta classe média engrossa agora a fila dos pobres, dos que, tantas vezes, têm de recorrer a instituições de solidariedade, à própria Igreja para conseguirem ter um pouco de pão na mesa. Falta tudo no Líbano. Os combustíveis, a electricidade, os medicamentos… Até a esperança. E agora, com a guerra mesmo ao lado, entre o Hamas e Israel, todos têm medo de que o conflito galgue fronteiras e atinja também o Líbano. O país está a esvair-se e nada parece conseguir inverter este rumo suicida. A Igreja está a viver também tempos particularmente duros. A área do ensino é um exemplo trágico do que está a acontecer. Cerca de três centenas de escolas do Líbano são geridas pela Igreja Católica. Isto significa uma responsabilidade directa pela educação de milhares de crianças e jovens, mas também pelos salários de milhares de professores. Como o Estado está sem recursos, todos os subsídios que normalmente eram atribuídos ao ensino deixaram de ser pagos. Mas a Igreja não quer fechar escolas, não quer enviar os alunos para casa, não quer despedir os professores. É um dilema que tira o sono à Irmã Hounda Tannoury, directora de uma escola em Jabboule. “O Líbano está a atravessar uma crise económica sem precedentes. As escolas estão a ficar sem fundos, com dificuldades em pagar aos professores”, explica a irmã a uma equipa de reportagem da Fundação AIS. Tannoury refere que esta é uma questão mesmo difícil. Se alguma escola fechar portas, isso significa, por exemplo, que centenas de crianças correm o sério risco de passar fome. As palavras são duras, mas a realidade é cruel. “Muitos dos nossos pais não têm dinheiro sequer para comprar pão para os seus filhos. É muito humilhante”, confessa-nos a responsável pela escola de Jabboule.

Viagem sem regresso

A região onde se situa esta escola é essencialmente agrícola, mas tudo parece estar parado por ali. Falta água, falta electricidade, falta já, tantas vezes, às próprias pessoas a energia vital para se enfrentar o destino. Parece que os Libaneses estão a desistir. Cada vez é maior o número dos que fazem as malas à procura de um país onde possam viver com dignidade, onde possam ver crescer os filhos sem a angústia de não terem nada para lhes dar de comer, ou onde possam cuidar dos mais velhos, dos idosos e dos doentes, sem sobressaltos. Muitos arriscam tudo numa viagem que poderá não ter regresso. Mas o Líbano é essencial para a presença dos Cristãos no Médio Oriente. Se a comunidade cristã partir ficará um vazio que dificilmente será preenchido. Tudo isto atormenta também a irmã, que faz o que pode e o que não pode para contrariar os sinais de tempestade que se acumulam nos céus libaneses. “É triste ver que as pessoas estão a pensar em abandonar esta terra. Nestas regiões, os Cristãos são cerca de 10%, e nós encorajamo-los muito a ficar, porque eles são um símbolo do Cristianismo. Gostamos de ter um país, mas estamos a perdê-lo. Está a desaparecer. O Líbano está a desaparecer…” A Irmã Hounda Tannoury sabe que ter uma escola é como gerir um tesouro. Um tesouro feito também dos sonhos dos alunos, rapazes e raparigas como Joseph. “Esta escola fez-me amar mais Jesus Cristo. Agradeço sempre a Deus por me ter dado esta oportunidade. Agradeço sempre a Deus pelos meus pais, pelos meus amigos. Ele deu-me esta escola maravilhosa e eu tenho muitos planos. O meu objectivo é ser médico.” É por jovens assim que a Irmã Hounda nos pede ajuda. Ela precisa de manter a sua escola de portas abertas. A Igreja precisa de manter todas as suas escolas a funcionar, os seus hospitais a funcionar, para que a comunidade cristã possa continuar a viver no Líbano. A Igreja procura ajudar os que ainda não desistiram deste país essencial para a presença do Cristianismo no Médio Oriente…

Paulo Aido | www.fundacao-ais.pt

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