Jacques Mourad, o novo Arcebispo de Homs, recorda o tempo de cativeiro
“O terço foi a minha arma”
Esteve em cativeiro dos jihadistas do Estado Islâmico em 2015 durante cerca de cinco meses, período em que foi ameaçado de morte, tendo chegado até a ser colocado perante um pelotão de fuzilamento. Sobreviveu a tudo, confiando em Nossa Senhora e na oração do Terço, que diz ter sido a sua arma espiritual. Conseguiu fugir e agora, oito anos depois, foi consagrado como Arcebispo de Homs. Para os cristãos da Síria, não podia haver melhor notícia…
Ordenado a 3 de Março como Arcebispo sírio-católico de Homs, na Síria, D. Jacques Mourad é um verdadeiro símbolo da resistência da comunidade cristã que tem sido forçada a enfrentar, ao longo da última década, a violência da guerra e do terrorismo, e agora também da pobreza. Nascido há 54 anos em Alepo, a história do novo prelado está indelevelmente ligada aos cinco meses em que esteve em cativeiro às mãos de um dos muitos grupos terroristas que alimentaram a guerra na Síria. Um cativeiro que o próprio recordou em diversas iniciativas da Fundação AIS, como a Noite dos Testemunhos, promovida há alguns anos pelo secretariado francês da Ajuda à Igreja que Sofre. Há, na história do novo arcebispo, uma data que nunca mais esquecerá: 21 de Maio de 2015. Foi nesse dia que homens armados invadiram o convento de Mar Elian, de que era responsável, e o arrastaram dali, como refém, juntamente com um jovem postulante. Depois de quatro dias fechado e vendado dentro de um carro, levaram-nos para Raqqa. Foi assim que começou o tempo de sequestro, quase cinco meses, em que Jacques Mourad chegou a ser ameaçado de morte e a testemunhar o rapto também de 250 pessoas da sua paróquia. Foram cinco meses de cativeiro que reforçaram poderosamente a sua fé. No encontro promovido pelo secretariado francês da Fundação AIS, Mourad recordou essa viagem e a proximidade que sentiu com Nossa Senhora. “Na estrada para Raqqa, em direcção ao desconhecido, uma frase ressoava dentro de mim e que me ajudou a aceitar o que se passava e a entregar-me ao Senhor: ‘Estou a caminho da liberdade…’. A presença da Virgem, Nossa Mãe, e a oração do terço foram a minha arma espiritual.”. Revisitar hoje esse testemunho ajuda a compreender os tempos duros que os cristãos tiveram de enfrentar no auge da guerra na Síria.
Os outros reféns
Nesses anos, com o país transformado num campo de batalha, ninguém estava seguro em lado algum. Levado para Raqqa, Jacques Mourad acabou por ficar retiro numa casa durante 84 dias. Um tempo que também não esquecerá jamais. “Quase todos os dias entravam na minha cela e faziam perguntas sobre a minha fé. Vivi cada dia como se fosse o último. Mas não cedi. Deus concedeu-me duas coisas: o silêncio e a amabilidade. Fui assediado, ameaçado de decapitação em várias ocasiões, submetido a um simulacro de execução para renegar a minha fé.” A 4 de Agosto de 2015, o grupo jihadista ‘Estado Islâmico’ conquistou Al-Qaryatain e, no dia seguinte, de madrugada, fez cerca de 250 reféns cristãos que foram levados para uma região perto de Palmira. Uns dias mais tarde, o Pe. Mourad foi levado ao encontro desse grupo de reféns. É por essa altura que começa a planear a própria fuga, o que veio a acontecer a 10 de Outubro. Numa cena digna de um filme de acção, Mourad fugiu dos jihadistas saltando para cima de uma mota conduzida por um amigo muçulmano. Quando recorda esse episódio vê também aí a presença de Deus e de Nossa Senhora. “Com a ajuda de um jovem muçulmano, consegui sair de Al-Qaryatain apesar dos riscos que isso implicava. E, novamente, a mão misericordiosa de Deus e de Nossa Senhora protegeram-me e acompanharam-me. E nesse caminho de deserto, a palavra ‘liberdade’ voltou a surgir.” A ligação do novo Arcebispo de Homs dos Sírios à Fundação AIS é antiga e enche todos de esperança, como lembra Regina Lynch, directora de projectos da AIS. “Durante a sua provação, o Padre Jacques continuou a dar um forte exemplo de valores cristãos, apoiando os seus fiéis e dando testemunho àqueles que os perseguiam. Agora, como bispo, encontra-se numa posição única para continuar a encorajar os cristãos a permanecerem nas suas terras e a serem fiéis às suas crenças, mas também a empenharem-se no diálogo com os muçulmanos e a trabalharem para uma coexistência pacífica.” E como é importante acreditar numa Síria reconciliada onde todos tenham lugar, onde todos possam viver em paz…
Paulo Aido