A cruz escondida

Majed, um jovem cristão sírio “refugiado como o Menino Jesus”…

“Ainda estamos vivos…”

Tem 12 anos e vive com os pais em Zaleh, no Vale de Bekaa. É um refugiado sírio no Líbano. É apenas um entre os cerca de milhão e meio de sírios que passaram a fronteira para o Líbano, fugindo de um país em guerra onde sobreviver todos os dias é cada vez mais difícil. Mas o Líbano está também em profunda crise…

A fronteira entre o Líbano e a Síria separa dois países mas não a tragédia que desespera pessoas, famílias. De ambos os lados da fronteira há relatos semelhantes de pobreza, fome, de miséria absoluta. Se para os libaneses a vida se transformou num tormento, com a economia destruída, que leva já famílias a procurar comida até nos caixotes do lixo, imagine-se como será para os refugiados sírios que procuraram abrigo neste país… Nos últimos 10 anos, desde que começou a guerra na Síria, calcula-se que cerca de milhão e meio de pessoas passaram a fronteira. Fizeram-no em desespero, depois de terem visto o seu país mergulhado numa guerra, com grupos terroristas entrincheirados em discursos de ódio, matando, destruindo, perseguindo as minorias religiosas como os cristãos. O Líbano era o país mais próximo, o caminho mais curto para muitas famílias que partiram muitas vezes apenas com a roupa que traziam vestida. A cidade de Zaleh, no vale de Bekaa, tornou-se numa pátria emprestada para os cristãos sírios. Foi aí que Basman Abbout se abrigou com o filho e a mulher. O filho, Majed, tinha apenas três anos quando fugiram. Praticamente não tem memórias disso. Apenas conhece da Síria aquilo que os pais lhe contam. No entanto, Majed já ouviu vezes sem conta o pai contar como foram aflitivos os últimos dias antes de se terem feito ao caminho, apenas com a certeza de que se ficassem em casa sucumbiriam aos bombardeamentos, às bombas lançadas pelos jihadistas. Basman Abbout conta sempre as mesmas histórias. A sua memória está presa a esses dias, a essas semanas e meses de terror. “Atacaram-nos com armas, apesar de estarmos completamente indefesos. Mataram quinze jovens e incendiaram cinco casas. Corremos, juntamente com todos os outros, sem levar nada connosco, excepto as roupas que trazíamos vestidas. Saímos a correr das nossas casas e fugimos…”

Pedir para sobreviver

Quando chegaram ao Vale de Bekaa devem ter estranhado o silêncio, a ausência do estralejar das balas, das bombas, o cheiro da pólvora, os gritos de dor… Os refugiados sírios, os cristãos que fugiram para o Líbano levaram as mãos vazias. Sem nada, as suas vidas teriam de recomeçar. Majed era apenas uma criança de três anos de idade. Não se apercebeu certamente da aflição dos pais. Foram à procura de um parente, refugiado como eles, que tinha chegado ao Líbano meses antes. Abriram-lhes a porta de uma casa. Era um abrigo para 15 pessoas. Dormiam por turnos, pois não havia quartos que chegassem, nem camas, nem cadeiras, nada. Era inverno. Nem sequer tinham casacos com se embrulhassem fintando o frio. Foi então que ouviram falar no apoio que a Igreja Católica estava a prestar aos refugiados. “O que nos teria acontecido sem esta ajuda da diocese?”, pergunta o pai de Majed. Ao fim de algum tempo, de alguns meses, Basman Abboud conseguiu trabalho e levou a família para uma casa pequena, de dois quartos. Mas o dinheiro não chegava para tudo… De novo, a ajuda da Igreja revelou-se providencial. O projecto “a Mesa da Misericórdia de São João”, promovido com o apoio da Fundação AIS, oferece refeições a refugiados sírios que vivem no Líbano e agora também a famílias libanesas que caíram na mais absoluta pobreza. “Estamos vivos e estamos gratos por todos os que têm sido tão bons para nós”, diz Basman Abboud, sabendo que a sua família está outra vez numa encruzilhada. “Se os Libaneses não têm trabalho e enfrentam uma situação tão difícil, então o que se pode dizer de nós?” Majed tem agora 12 anos. Refugiado no Líbano, ele próprio pode agora contar agora a sua história quase com as palavras emprestadas ao pai. Não fala de guerra como ele mas sim de uma vida de inferno. Tem 12 anos e já sabe o que é pedir para sobreviver. Falta menos de um mês para o Natal. Majed sabe que os tempos estão difíceis mas não desistiu. A esperança é mesmo a última a morrer. “Tornei-me um refugiado, tal como o Menino Jesus, que também teve de fugir com os pais. O meu desejo para o Natal é que as pessoas pensem em famílias como a minha e ajudem os refugiados a ter esperança num futuro melhor. Feliz Natal a todos…”

Paulo Aido

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Agência ECCLESIA

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