António Estanqueiro, Professor e Formador
A coragem não é ausência de medo. É a capacidade de agir com determinação e enfrentar os desafios da vida, apesar do medo.
Universalmente admirada em diferentes tradições filosóficas, culturais e religiosas, a virtude da coragem permite-nos superar o medo em situações difíceis e fazer o que é certo, na medida certa, pelo motivo certo.
Todas as virtudes morais estão interligadas. Na perspetiva de alguns pensadores, a coragem é a mais importante. Sem esta força da alma, não se pode garantir a prática de qualquer outra virtude humana.
Covardia e imprudência
A coragem encontra-se entre dois extremos: a covardia de quem teme o que não deveria temer e a imprudência de quem não teme o que deveria temer.
Durante toda a vida, convivemos com o medo, um estado de alerta que nos prepara para reagir a ameaças físicas e psicológicas. Em situações realmente perigosas (por exemplo, perante uma arma apontada ou um animal feroz), a emoção do medo pode levar-nos a lutar ou fugir e, desse modo, salvar-nos a vida. Neste sentido, o medo é um fator de proteção e segurança.
Muito diferente é o medo irrealista, um sentimento negativo que aprisiona a alma e impede a vida digna. Há covardia quando alguém sabe o que é correto fazer e não o faz ou quando adota passivamente a opinião da maioria e não obedece à voz da sua consciência, por medo excessivo e falta de confiança. Disse Mahatma Gandhi: “O medo tem alguma utilidade, mas a covardia não.”
No extremo oposto à covardia, está a temeridade ou imprudência. Os destemidos agem com excesso de confiança, desvalorizando os perigos, como se não sentissem medo de nada. Facilmente confundem coragem com impulsividade ou paixão. Falta-lhes autocontrolo.
É imprudência praticar ações demasiado ousadas ou atrevidas, muitas vezes condenáveis, que põem em risco a nossa vida ou a vida dos outros. Basta pensar nas manobras perigosas que vemos nas nossas estradas!
Uma pessoa corajosa precisa não só de confiança, mas também de uma boa dose de prudência para tomar as decisões certas, no momento oportuno. Nem toda a coragem é virtuosa.
A luta pelo bem
A coragem funciona como uma faca de dois gumes. É uma força interior que pode ser usada para fazer o bem ou para fazer o mal. Há bondade e maldade na natureza humana.
Ser corajoso não consiste apenas em ter consciência dos perigos e estar disposto a enfrentá-los. A coragem só é virtude moral se estiver ao serviço do bem, se defender a dignidade e os direitos humanos.
A maldade de racistas, xenófobos, fanáticos e criminosos, por mais corajosa que pareça, não deixa de ser maldade inaceitável. Será virtuosa a coragem de pessoas egoístas e envenenadas pelo ódio, que abusam do poder e maltratam os mais fracos com crueldade? Não!
Habitualmente, associamos a virtude da coragem ao comportamento de heróis (bombeiros, polícias, militares ou trabalhadores humanitários) capazes de enfrentar perigos e arriscar a própria vida para salvar a vida de alguém. Muitas outras pessoas altruístas praticam, todos os dias, atos de grande coragem física, psicológica ou moral. São modelos inspiradores para a formação integral dos jovens.
Ninguém é obrigado a ser herói. Mas todos devemos fazer o bem que depende de nós e mudar o que pode ser mudado, olhando para o futuro com esperança.
A luta pelo bem desafia-nos a manifestar, de forma consciente e voluntária, atitudes corajosas na vida pessoal, familiar, social e profissional. Isto implica, por exemplo, abraçar a nossa imperfeição, assumir a responsabilidade pelos nossos erros, dizer a verdade nas situações em que a mentira nos parece mais benéfica e denunciar os comportamentos injustos ou violentos de pessoas que têm o poder de nos ameaçar e prejudicar. Desafio maior é perdoar a quem nos ofende.
Ser verdadeiramente corajoso significa lutar pelo bem com persistência, mesmo em circunstâncias adversas. Guiados pela nossa consciência moral, cuidando de nós e dos outros, damos sentido à vida e contribuímos para uma sociedade mais fraterna.
António Estanqueiro
Professor e Formador