Papa confessa desejo de que todos os processos sejam «gratuitos»
Cidade do Vaticano, 23 jan 2015 (Ecclesia) – O Papa alertou hoje para a necessidade de ponderar a ligação entre a falta de fé e nulidade do Matrimónio católico, durante o encontro de abertura do ano judicial do Tribunal da Rota Romana.
“O juiz, ao ponderar a validade do consentimento expresso, deve ter em conta o contexto de valores e de fé – bem como a sua carência ou ausência – em que a intenção matrimonial se formou”, disse Francisco, perante os membros deste tribunal da Santa Sé.
O Papa afirmou que a Igreja "conhece o sofrimento de muitos núcleos familiares que se desagregam, deixando atrás de si as ruínas de relações afetivas, de projetos, de expectativas comuns”.
Nesse sentido, pediu que em cada tribunal eclesiástico haja pessoas competentes para “aconselhar sobre a possibilidade de introduzir uma causa de nulidade matrimonial”, evitando que as limitações financeiras impeçam “o acesso de todos os fiéis à justiça da Igreja”.
"Os sacramentos são gratuitos, os sacramentos dão-nos a graça, e um processo matrimonial diz respeito ao sacramento do Matrimónio. Quanto gostaria que todos os processos fossem gratuitos", confessou.
A reflexão assinalou que a falta de conhecimentos dos conteúdos da fé católica pode levar ao que o Direito Canónico chama de “erro que determina a vontade”.
“Esse erro ameaça não só a estabilidade do Matrimónio, a sua exclusividade e fecundidade, mas também a ordenação do Matrimónio para o bem do outro”, advertiu.
Esta eventualidade, disse Francisco, já não deve ser vista como algo de “excecional”, porque a crise do Matrimónio “tem muitas vezes na sua raiz a crise de um conhecimento iluminado da fé”.
“Na verdade, o abandono de uma perspetiva de fé conduz inexoravelmente a uma falsa compreensão do casamento”, precisou.
Em casos de dúvida sobre a validade do casamento, assinala o Papa, o juiz deve verificar se houve “um vício de origem do consenso”, seja por falta de uma intenção “válida” seja por um “grave défice na compreensão do próprio Matrimónio”.
O Papa aludiu ao “contexto humano e cultural” em que se forma esta “intenção matrimonial”, marcado atualmente por uma “crise de valores”.
Bento XVI, Papa emérito, tinha abordado a ligação entre “carência de fé e união matrimonial não válida” na abertura do ano judicial de 2013, afirmando que essa carência pode, ainda que “não necessariamente, ferir também os bens do matrimónio”.
Francisco instituiu em setembro de 2014 uma comissão especial de estudo para a reforma do processo matrimonial canónico, com o objetivo de simplificar os procedimentos, um problema que esteve em debate no recente Sínodo extraordinário dos Bispos sobre a família (5-19 de outubro).
A Rota Romana é o tribunal ordinário da Santa Sé, constituído pelo Papa para julgar processos de apelo (segunda instância); julga também em terceira e última instância as causas julgadas por ele próprio e por outros tribunais eclesiásticos.
O tribunal tem entre os seus auditores o religioso português Manuel Saturino da Costa Gomes, da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos).
OC