D. António Ferreira Gomes: Um bispo conciliar no exílio III

O padre e investigador português, Nuno Vieira, em entrevista à Agência ECCLESIA sublinha que durante o período em que D. António Ferreira Gomes esteve em Valência (Espanha) “a polícia espanhola controlava-o” e passava informações à congénere portuguesa. Depois da primeira e segunda parte, Nuno Vieira relata episódios do exílio do bispo do Porto.

O padre e investigador português, Nuno Vieira, em entrevista à Agência ECCLESIA sublinha que durante o período em que D. António Ferreira Gomes esteve em Valência (Espanha) “a polícia espanhola controlava-o” e passava informações à congénere portuguesa. Depois da primeira e segunda parte, Nuno Vieira relata episódios do exílio do bispo do Porto.

AE – Ele sabia que estava controlado pela polícia política de Portugal e Espanha?
NV – Não há conhecimento de agentes da PIDE na diocese de Valência, mas sabe-se que a polícia espanhola passava informações à polícia portuguesa. A polícia espanhola controlava-o.

AE – Mesmo nas visitas pastorais?
NV – Algumas sim.

AE – Alguns discursos dele eram proferidos na língua de Camões com receio de ser mal entendido em castelhano. Ele dominava a língua de Cervantes?
NV – Ele dominava o castelhano, mas sentia-se mais à vontade a falar português. As testemunhas da época dizem que ele falava um «portunhol», por outro lado seria também uma desculpa para não entrar em determinados temas.

AE – Existe alguma razão específica para que D. António Ferreira Gomes tenha ido viver para uma casa de religiosas e não para a casa episcopal?
NV – Não há tradição em Valência que o bispo titular viva com os seus auxiliares. D. Marcelino Olaechea vivia no Paço Episcopal e o seu auxiliar, D. Rafael González Moralejo, vivia noutra residência. O bispo titular tinha uma vida autónoma.

AE – Apesar de exilado, D. António Ferreira Gomes escreve uma missiva [datada de 27 de novembro de 1961] a Guilherme Braga da Cruz onde sublinha que “afinal o desterro é a liberdade e alguma possível aspiração de verticalidade”.
NV – Era liberdade porque lutava pela causa da liberdade. Ele continuava a pensar que era possível a liberdade. Foi um homem com grande liberdade interior e isso ficou demonstrado quando ele voltou a Portugal.

AE – Mas os discursos feitos na diocese levantina não tinham o mesmo teor daqueles que fazia no Porto.
NV – Não podia fazê-los. Primeiro por cortesia com o arcebispo que o recebeu, por outro lado ele também sabia a situação delicada em que se encontrava. Teve de ser muito prudente para chegar ao fim.

AE – D. António Ferreira Gomes nunca pensou em fixar-se, definitivamente, em Valência?
NV – Suponho que não. Apesar do sucesso que teve e de ser reconhecido – foi convidado para os grandes actos sociais – sempre desejou, até pelo seu temperamento, voltar ao Porto. Foi homem muito empenhado na diocese – fazia cerca de 60 visitas pastorais por ano – mas também dedicou muito do seu tempo a preparar as sessões do II Concílio do Vaticano.

AE – No início, devido à situação deliciada esteve ausente dos media. Depois, no fim de mostrar o seu valor e de ser conhecido, deu alguma entrevista a algum órgão de comunicação social?
NV – Não existe nenhuma entrevista de D. António Ferreira Gomes. Nas consultas feitas, todos são unânimes: o bispo do Porto era um homem muito reservado.

AE – Mas em Portugal concedeu entrevistas.
NV – Em Valência, a situação era muito comprometedora. Apesar de se considerar livre interiormente, D. António Ferreira Gomes estava muito condicionado na acção.

(Continua na próxima semana)
LFS 

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