Pe. Armando Ribeiro, Director da Edição Portuguesa de “L’Osservatore Romano” De há uns tempos para cá, os grandes meios de comunicação falam diariamente do Iraque. Acrescentam-lhe outra palavra terrível e destruidora: guerra. O mundo teme perante a possibilidade de se associarem as duas palavras, apesar do protesto que ecoou por todo o mundo: não à guerra. Ergue-se também a voz de João Paulo II. De longe, no tempo, vem essa voz que instituiu e celebra anualmente o Dia Mundial da Paz e, a esse propósito, dirige ao mundo uma Mensagem. E quando se deu conta de uma «mentalidade perversa de guerra, de terrorismo e de sangue, lançando uma sombra negra de tristeza sobre a aurora de um novo ano», fez-se ouvir para gritar: «a religião tem um papel vital para suscitar gestos de paz e consolidar as condições de paz». «Paz» tem sido a palavra mais repetida em homilias e discursos, saudações dominicais ou catequeses de quarta-feira, encontros ou mensagens, tornando-se «espada de dois gumes» ao fazer-se presente em Bagdade e Washington. «Não há alternativa à paz», «multipliquem-se os gestos de paz ao longo do ano». «A paz é possível e necessária», proclamou, recordando os «quatro pilares sobre os quais construir uma paz duradoura», no dizer de João XXIII: «a verdade, a justiça, o amor e a liberdade». E acrescenta: «a paz é um bem precioso a pedir a Deus e a construir com todo o esforço, mediante gestos concretos de paz» (Mensagem de 1 de Janeiro de 2003). João Paulo II falou de gestos concretos de paz. Assim se entende o envio dos seus representantes a Bagdade e Washington. Ao Iraque foi o Cardeal Roger Etchegaray, que levava consigo uma mensagem para Sadam Hussein, cujo conteúdo permaneceu secreto. Um sorriso de esperança ficou para a História, perante as suas declarações: «abriu-se um pequeno clarão, ninguém pode desanimar; sim, a paz é ainda possível no Iraque e para o Iraque. Volto a Roma, clamando-o mais vigorosamente que nunca». A Washington foi outro Cardeal, Pio Laghi; nova mensagem, agora para Georges Bush, outro segredo e mais um sorriso que todos querem para o mundo que olha estes dois Presidentes como aqueles em cujas mãos está a paz ou a guerra. Em sentido inverso, João Paulo II abriu as portas do Vaticano a várias autoridades, capazes de influir no movimento de paz e alargar os caminhos da esperança: Tarek Aziz, Vice-Primeiro-Ministro do Iraque, foi recebido pessoalmente por João Paulo II, o mesmo sendo concedido a Kofi Annan, Secretário-Geral da ONU, José Maria Aznar, Tony Blair e Sílvio Berlusconi, Primeiros-Ministros da Espanha, da Inglaterra e da Itália, respectivamente, e ainda J. Fischer, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha. D. Jean-Louis Tauran, Secretário do Vaticano para as Relações com os Estados, encontrou-se, em reunião conjunta, com os Embaixadores acreditados junto da Santa Sé, noutra iniciativa junto daqueles que, certamente, melhor assimilam o pensamento da Igreja e o sabem transmitir aos Governos que representam. Com a paz todos ganhamos, com a guerra todos perdemos. A conclusão parece fácil, mas infelizmente não é. Por isso, João Paulo II fez novo convite e um apelo para um dia diferente na Quarta-Feira de Cinzas: «este ano, empreenderemos o itinerário penitencial rumo à Páscoa com um compromisso mais forte de oração e de jejum pela paz, posta em dúvida por crescentes ameaças de guerra… A paz é dom de Deus, que deve ser pedido com confiança humilde e insistente. Sem nunca nos darmos por vencidos perante as dificuldades, é preciso procurar e percorrer todos os caminhos possíveis a fim de evitar a guerra, que traz sempre consigo lutos e graves consequências para todos». E fez um pedido aos peregrinos portugueses presentes na Praça de S. Pedro, naquele dia: «rezai pela paz». O silêncio só é de ouro, quando a palavra é de prata. Pensamos que a voz da Igreja é palavra de ouro a penetrar nos espíritos e no coração de todos. Assim seja com a palavra de João Paulo II, nas suas iniciativas de paz.
