A Igreja e os Media, uma relação em transformação

Opções editoriais e sustentabilidade são desafios que se colocam ao Secretariado Nacional das Comunicações Sociais (SNCS) da Igreja Católica em Portugal. Para o cónego João Aguiar, a Igreja tem de saber «o que quer dizer à sociedade»

Numa entrevista ao semanário digital ECCLESIA, o diretor do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais destaca a atenção que o atual Papa tem dedicado aos novos media. Para o cónego João Aguiar, a Igreja tem de saber «o que quer dizer à sociedade» e promover parcerias entre os diversos meios de comunicação de informação religiosa.

 

Agência ECCLESIA (AE) – Nos últimos anos o público tem conhecido uma informação religiosa com a marca Ecclesia, presente na televisão, na rádio e também na Internet. Que percurso tem sido este feito pela Igreja nos conteúdos religiosos?

Cónego João Aguiar (JA) – É um percurso de permanente atualização. Atenta, em primeiro lugar, à necessidade de evangelizar através dos media, sem perder de vista a missão fundamental de os evangelizar e, depois, comunicar Jesus Cristo nas diversas plataformas, através da mensagem escrita, da mensagem audiovisual e hoje, presente no novo continente digital.

 

AE – Numa adequação aos novos tempos?

JA – Precisamente, percebendo que a Internet é um continente novo, habitada por milhões de pessoas e que a obrigação de levar a todos uma pessoa, que é a mensagem da Igreja, urge e, por isso, estamos aí. Não por moda mas pela necessidade de levar a mensagem a esses espaços, nesse modo de ser e de estar.

 

AE – Importa estabelecer parcerias para otimizar a comunicação?

JA – Precisamente. Há necessidade de congregar pessoas na formação, partilhar conteúdos e estruturas. Não quero ser ofensivo, mas parece que muitos teimam ainda ir à caça com o seu galgo ou dar tiros isoladamente. Os tiros podem fazer muito barulho, mas o alvo pode ser fraco. Precisamos aprender a viver mais em comunhão neste momento.

 

AE – Trata-se de comunicar de diferentes formas, na televisão, na rádio, no portal da agência e, mais recentemente no semanário digital?

JA – Trata-se de dizer a verdade de sempre, a pessoa de sempre, nas diversas linguagens e plataformas. A Agência ECCLESIA tem-no feito bem.

Eu tenho a experiência de ano e meio de convívio com os bons profissionais da Ecclesia. Durante este tempo fomos fazendo a evolução para as novas plataformas que o consumidor de hoje exige, ou seja, ter tudo agora e no meio que está mais à mão.

A própria Agência está em processo de restruturação para que possa oferecer os conteúdos nas linguagens dos seus “consumidores”.

 

AE – Restruturação que se estende à presença da Igreja Católica nos media?

JA – Decorrem num momento particularmente difícil. É preciso fazer de forma diferente, habituar os profissionais à linguagem, “saber que Deus não é googlável” (afirmação do jesuíta António Spadaro, diretor da revista «Civiltà Cattolica», ndr), mas há que estar na Internet, com a linguagem digital, sem abandonar os públicos tradicionais.

 

AE – E a Igreja está preparada para investir na comunicação?

JA – Tem feito um esforço de atualização nas linguagens, nos suportes, num esforço assinalável tem investido na formação, até nos seus agentes de pastoral. Não sei se está a meio do caminho ou ainda no princípio, mas é um esforço assinalável. Tenho esperança que este processo vá continuar e, sobretudo, sublinho a necessidade de continuar a fazê-lo.

 

 

AE – Estando há um ano e meio a acompanhar a Ecclesia, que projeto tem para o Secretariado nacional das Comunicações Sociais?

JA – A comunicação depara-se com dois grandes desafios: editorial e de sustentabilidade. O desafio editorial para a Igreja em Portugal implica explicar o que é que a médio e longo prazo quer dizer à sociedade onde está incarnada, através de que linguagem e de que meios. Este é um desafio editorial que para nós tem ainda outro componente.

A secularização galopante do nosso tempo não torna apetecíveis os conteúdos que propomos. Há uma erosão e dificuldades que nos colocam ainda outro desafio que se relaciona com a renovação dos públicos. Temos uma imprensa de inspiração cristã voltada para leitores mais idosos e tradicionais, sendo por isso necessário que na linguagem e nos conteúdos que o nosso tempo faz se vá conquistando públicos mais jovens. E não apenas os que estão dentro da Igreja, mas os outros da Igreja que são todos.

Fazer uma proposta a todos, obriga-nos a estar mais abertos, mais plurais, fiéis mas menos fechados.

Por outro lado, o desafio da sustentabilidade. Vivemos uma crise económico-financeira grave que também se abate sobre os meios de comunicação social, sobre a própria imprensa que é o meio que em muitas dioceses e paróquias ainda domina. Conhecemos a crise do mundo gráfico e podemos estar perante a crise do jornal impresso. Para além da crise financeira temo ainda uma crise de comunhão.

 

AE – Nos últimos anos o Papa tem mostrado uma atenção particular aos novos media e tecnologias, aos bloguistas e recentemente abriu uma conta no twitter. Que percurso é este feito por Bento XVI?

JA – Desde 2009 que encontramos estes temas: Novas tecnologias, novas relações; em 2010 o Papa propôs o sacerdote e a pastoral no mundo digital; em 2011 centrou-se na verdade, anúncio e autenticidade de vida na era digital. No ano passado, em 2012 a perspetiva apresentada foi do silêncio e da palavra como caminho de evangelização. Este ano o Papa alude às redes sociais e aos portais de verdade e de fé.

Ainda não li a mensagem mas não é difícil adivinhar que não estará longe da insistência do uso da Internet, não apenas como um meio de evangelização mas como um ambiente onde o homem hoje vive, que muda também a sua forma de expressão.

Há um novo homem e mulher. Não estamos a falar de técnicas e de instrumentos mas de uma realidade antropológica sobre a qual precisaremos de meditar.

 

AE – Trata-se de uma redefinição nos espaços de evangelização? Sem perder o conteúdo fundamental para o qual o Papa aponta?

JA – Trata-se de pedir que neste mundo digital haja missionários. São necessários missionários digitais, não apenas apaixonados pela tecnologia e ao serviço, mas capazes de colocar alma na Internet.

Hoje vamos ao Google e encontramos tudo à distância de uma palavra. Se fizermos uma procura com a palavra Deus não podemos esquecer que a fé é o encontro pessoal com Jesus Cristo e não uma coisa que aparece no ecrã do computador.

 

AE – A Conferência Episcopal Portuguesa desenvolve o projeto «Repensar juntos a Pastoral da Igreja». Que espaço ocupa a comunicação social neste repensar a pastoral?

JA – Deve ocupar um espaço essencial, não como uma pastoral à parte mas estando presente em todas as pastorais. O monsenhor Celli, o nosso patrão ideológico (presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais, ndr), diz que se a Igreja não comunica não é aquilo que é. É este veículo de comunicação a sua vocação tendo como finalidade provocar a comunhão.

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