Orçamento e emprego… incompatíveis?

Acácio F. Catarino, vogal da Comissão Nacional Justiça e Paz

Parece existir uma consciência bastante generalizada de que o projeto de Orçamento do Estado (OE), para 2013, não contribuirá para a atenuação do desemprego; até se configura altamente provável que o venha a agravar. Isso talvez seja devido, fundamentalmente, a duas causas: a vinculação do Governo aos imperativos da «Troika», decorrentes da situação económico-financeira em que nos encontramos; e a contestação generalizada contra o Governo e a «Troika». O Governo não tem encontrado forma de atenuar os rigores da austeridade; mesmo que, porventura, faça diligências para a alteração do acordo com a «Troika», não o poderá afirmar publicamente, sob pena de ver diminuída a sua credibilidade internacional. A contestação generalizada contra o Governo e contra a «Troika» é formada pela quase totalidade das forças político-sociais; os contestatários sentem-se no direito de suporem que o Governo e a «Troika» não adotam políticas diferentes porque não querem; e, além disso, consideram-se no direito de não formular propostas de solução viáveis, no curto e médio prazos, sem sujeitarem a povo a mais incertezas e sofrimentos.

As medidas previstas no OE, sob o título «emprego e mercado de trabalho» são várias, e obedecem ao seguinte objetivo: «desenvolver uma política de promoção da criação de emprego e de combate ao desemprego através da aposta na formação profissional, da dinamização de políticas ativas de emprego inovadoras e do desenvolvimento de iniciativas de aumento da produtividade e competitividade, nomeadamente no âmbito da legislação laboral». As medidas previstas dão sequência, em geral, às que se encontram já em vigor, como por exemplo: formação profissional, «impulso jovem», estágios, promoção do empreendedorismo, «redução dos custos associados à contratação de desempregados», incentivos à aceitação de ofertas de emprego… A criação de Centros para a Qualificação e Ensino Profissional e o Relançamento do Serviço Público de Emprego (atual Instituto do Emprego e Formação Profissional) são outras medidas previstas. Várias iniciativas previstas noutros capítulos – com realce para a economia em geral e, em especial, para o desenvolvimento regional – podem favorecer o emprego, embora modestamente.

Numa apreciação bastante simplificada, pode afirmar-se que as medidas de política de emprego mantêm as características do passado: centragem na formação e na empregabilidade, em prejuízo do trabalho-emprego; forte incidência na despesa pública; baixa percentagem de desempregados e candidatos ao primeiro emprego abrangidos; risco de os efeitos das medidas serem mais de caráter assistencial do que promocional… Poderia infletir-se a tendência fortemente negativa do OE? – É difícil responder pela afirmativa, dado que não tem sido realizado o «trabalho de casa» na conceção de outras medidas; tanto o Governo como as oposições continuam a apostar sobretudo em medidas que envolvem milhões de Euros; vítimas da obsessão financeira, descuram o que se pode fazer com menos dinheiro, e menosprezam quem atua fora do reino dos milhões.

De entre as entidades sem milhões de Euros, a Cáritas, outras instituições e grupos de ação social têm refletido sobre o assunto e esboçado algumas propostas que podem ser executadas com recursos limitados e mediante a cooperação do trabalho voluntário. Sumariamente, tais medidas repartem-se por quatro grupos: oferta de emprego; procura de emprego; oferta e procura em simultâneo; e mediação política. Do lado da oferta de emprego, sugerem: a difusão de ideias de negócio ou investimento; a criação de cadeias de comercialização, para o escoamento de produtos; o fomento do microcrédito e de outras modalidades de crédito solidário… Do lado da procura de emprego, sugerem: a cooperação entre o IEFP e as empresas de recursos humanos, incluindo as empresas de trabalho temporário cumpridoras da lei; o apoio à criação e funcionamento de grupos de desempregados para atuações em comum e com a ação solidária local… As mesmas entidades sugerem a intervenção integrada na oferta e na procura de emprego, sob a forma de: iniciativas de desenvolvimento local; diálogo social local, e mais alargado, entre representantes de empresários e de trabalhadores; fomento do cooperativismo; iniciativas complementares de ação social e de atividade económica… E, por fim, recomendam a mediação política através de propostas e de influência junto dos centros de decisão política e outros.

Mesmo que o Estado e as forças político-sociais continuem pouco interessadas nestas linhas de ação, nada obsta a que sejam prosseguidas só por entidades privadas, com e sem fins lucrativos. Para tanto, basta que se motivem, se congreguem e promovam ações comuns e complementares. Algumas instituições da Igreja acham-se especialmente bem posicionadas para atuarem nesta direção. Caso avancem efetivamente, podem estar a desbravar caminhos de esperança e a abrir novos horizontes de ação política.

Acácio F. Catarino

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top