Cosmopolis

Em 2000, Eric M. Parker é um bilionário de 28 anos que personifica o paradigma do nosso tempo: o seu poder construído sobre o domínio da informação, a gestão da informação gerida ao nanossegundo, a sua integridade física e emocional obsessivamente protegida por uma redoma que o mantém intocável.

Na vertigem do domínio sobre os mercados, pessoas e todas as coisas, para as quais criou uma noção de equilíbrio, Parker reconhece no entanto o desejo do intangível e a existência de algo que falhou na ambicionada perfeição, que o leva agora a procurar , mais que uma explicação, um sentido. O tempo escapa-se-lhe e a exposição é inevitável.

Eis o filme de David Cronenberg, adaptação do romance de Don DeLillo, 2003. Uma obra inteligente sobre o mundo contemporâneo oferecida agora a um público vasto e diverso que não a receberá, nove anos passados, com o mesmo impacto e surpresa.

Desafio maior o do realizador, compensado em parte pela possibilidade de chegar a quem tivesse ignorado o romance, mas obrigando por outro a situá-lo numa época em que parte do que se discute é mais uma constatação que um olhar visionário. Alterações vividas para muitos na primeira pessoa e um paradigma processado pela mesma informação voraz que é tema do filme: imprensa, comentadores, pensadores ou simples cibernautas. E no entanto, ainda por refletir na profundidade merecida.

“Cosmopolis”, versão cinematográfica, é uma criação simultaneamente lírica e sombria, assente no contraste entre o isolamento virtual do indivíduo e a velocidade do mundo, o devir, que crê poder controlar; entre a ambição do perfeito equilíbrio universal e a diversidade, implícita nessa mesma universalidade, que a todo o momento o desafia.

É do contraste e do desencontro que nenhuma precisão humana suprime que resulta o inefável desejo do intangível. Um caminho a percorrer com Cronenberg em que, sem hipótese de regresso à página anterior, se arrisca perder o espectador. Pois na forma, como no conteúdo, a gestão do tempo cinematográfico, entre a densidade de ideias e diálogos, pede equilíbrio preciso.

 

Margarida Ataíde

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