Vaticano II: Dei Verbum, um debate

Repercorrer as vicissitudes do debate sobre a Dei Verbum é um observatório útil para reconstruir as dinâmicas do Vaticano II a partir da pluralidade de posições sobre o papel da Escritura na vida da Igreja, desde a reflexão teológica sobre a dimensão bíblica da revelação, à historicidade dos evangelhos, ao valor da infalibilidade até à relação da Escritura com a quotidianidade da experiência cristã, inclusive numa perspetiva ecuménica. Precisamente devido à relevância da constituição para os temas tratados e ao seu papel na história do Vaticano II parece oportuno promover – ainda – pesquisas sobre a Dei Verbum, que constitui «um marco miliário no caminho eclesial», como se lê na exortação apostólica pós-sinodal Verbum Domini do Papa Bento XVI.

A partir das propostas (vota) para o futuro concílio dos bispos, dos superiores das ordens religiosas, das universidades e instituições académicas e das Congregações romanas compreende-se a multiplicidade de posições e de abordagens, que oferecem um interessante cenário da Igreja. Foi dedicado um amplo espaço à definição da relação entre Escritura e tradição na transmissão da revelação; sobre este tema desenvolveu-se, nos últimos anos do pontificado de Pio XII, um debate vivaz entre os que apoiavam a superioridade da tradição em relação à Escritura e os que achavam necessário reconsiderar de forma mais unitária a relação entre Escritura e tradição na transmissão da revelação. Precisamente a multiplicidade e a amplitude das propostas relativas à Escritura como tema para o futuro, não só fazem referência a um debate, não isento de tensões, que se tinha desenvolvido ao longo do século XX no âmbito da Igreja Católica e, em geral, do cristianismo, mas demonstram quanto era necessária a redação de um esquema para o futuro concílio através do qual se poderiam enfrentar as questões, num sentido mais amplo, relacionadas com a leitura e o conhecimento, por um lado, da Sagrada Escritura, e por outro, da relação entre ela, a tradição e o magistério na transmissão da revelação.

Riccardo Burigana, ‘L’Osservatore Romano’

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