Ação social de proximidade, uma política divina

Padre Luis Costa, Caritas de Coimbra

Entre humanos, uma breve nota prévia que nos torne mais próximos e contextualize o essencial de cada afirmação.

A Diocese de Coimbra, há mais de meio século, tem procurado, através da sua Caritas, atualizar a vivência do espírito da Parábola do bom Samaritano, a partir das suas cinco grandes orientações: ver, encher-se de compaixão, aproximar-se, agir e partilhar.

Esta “filosofia” evangélica atualiza-se em cada gesto e ensinamentos partilhados nos diferentes serviços distribuídos por toda a diocese, em mais de 100 equipamentos e estruturas de apoio, que suportam os serviços de várias respostas sociais.

A Caritas de Coimbra faz hoje das estradas de 26 concelhos e 266 paróquias o meio de ligação a cada pessoa, grupo ou comunidade, abraçando conjuntamente o desafio de estender a mão a quem mais sofre, no desejo de alavancar cada situação pontual ou estrutural, de forma sustentada e permanente.

Uma adequada ação social de proximidade requer uma dinâmica própria. Não se compadece com números ou estatísticas, mas impõe-se com o seu ritmo único muito à semelhança da educação duma criança. Isto é ação Caritas.

Estes tempos de “crise”, como lhes chamamos, estão a obrigar-nos a ver a realidade que somos e que temos duma forma muito especial. Como já não há dividendos para distribuir por uns tantos pobres, começamos a reconhecer quanto de paternalismo e assistencialismo envolve a nossa ação. Alimentámos, com elevadas teorias e fantásticos programas, uma sociedade para a auto desculpabilização e para a subsidiodependência; promovemos a sua auto demissão dum processo que lhes pertence. No entanto, o primeiro passo para o combate à pobreza é, necessariamente, ver os pobres com a máxima consciência do mistério que cada pessoa humana encerra e a máxima objetividade pessoal e técnica.

As diversas campanhas, mais ou menos mediáticas, continuam a reclamar de todos nós um “encher-se de compaixão”. Esta atitude implica sensibilizar-se para perceber o drama humano que se esconde por detrás dos números, das estatísticas, das imagens. Significa responsabilizar-se pelo bem comum, é isso que está em causa. Sintonizar com a dor do outro , assumindo o seu sofrimento, incarnando a sua angústia e revolta, tantas vezes legítimas, como suas e por inteiro e… aproximar-se.

A parábola de Jesus inverte um conceito assumido: o próximo não é aquele que está ao nosso lado e precisa de ajuda, porventura por ser pobre, mas é aquele que se aproxima do que precisa de ajuda. Aproximar-se é então uma atitude comprometida. É sair ao encontro do outro e da sua circunstância, como quem ama. Uma vez lá, consegue ver a realidade a partir da perspetiva daquele que lá se encontra, sem perder a sua, mas tocando a circunstância a partir de dentro, onde, provavelmente, o dinheiro é pouco, a informação é escassa, o ambiente pesado. Aproximar-se sem lhe retirar o que ainda lhe resta: a dignidade e a capacidade para sair do buraco onde caiu, assente na esperança que se faça luz numa noite que parece sempre longa demais.

Junto destes, durante as noites longas, é necessário agir. Agir bem, na humildade de o fazer com quem reclama a nossa atenção e com outros, que sabem coisas diferentes, em rede, em articulação e cooperação. Agir bem é uma exigência que reclama a máxima perfeição técnica, na expressão do bem programar, calendarizar, distribuir tarefas, pedir responsabilidades, encaminhar, acompanhar, preencher fichas, fazer relatórios, concorrer a projetos, ou simplesmente avaliar.

Depois destes passos, exigir-se-á partilha. Partilhar géneros, dinheiro, mas também conhecimentos, competências técnicas e profissionais, afetos, tempo, vida. E isto é difícil, mais do que se imagina.

Para a Caritas, partilhar é dar sem esperar nada em troca e assumir parte do custo da libertação da pobreza, semeando grãos para uma cultura que transforme o dar pontual em prática de vida.

Quem incarna esta “filosofia” evangélica, a partir do sentir de cada comunidade, arrisca-se a ter de se implicar por inteiro. Expressão disso é a Caritas de Coimbra, que de comunidade em comunidade, com cada uma delas, concretizou o mandato de Jesus: «vai e faz desse modo»: projetou, executou, acompanhou e entregou ou ainda mantém sobre a sua responsabilidade, mas sempre subsidiariamente, porque está como quem serve.

Eis o tempo para alterar paradigmas, uma provocação única a construirmos uma sociedade samaritana à maneira de Jesus.

Padre Luis Costa, Caritas de Coimbra

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