Mensagem de Bento XVI para o 98.º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado

Queridos Irmãos e Irmãs!

 

Anunciar Jesus Cristo, único Salvador do mundo, «constitui a missão essencial da Igreja, tarefa e missão, que as amplas e profundas mudanças da sociedade atual tornam ainda mais urgentes» (Exort. apost. Evangelii nuntiandi, 14). Aliás, hoje, sentimos a urgência de promover, com novo vigor e novas modalidades, a obra de evangelização num mundo onde a queda das fronteiras e os novos processos de globalização deixaram as pessoas e os povos ainda mais próximos, tanto pela expansão dos meios de comunicação, como pela frequência e a facilidade com que indivíduos e grupos se podem deslocar. Nesta nova situação, devemos despertar em cada um de nós o entusiasmo e a coragem que impeliram as primeiras comunidades cristãs a ser intrépidas anunciadoras da novidade evangélica, fazendo ressoar no nosso coração as palavras de São Paulo: «Se anuncio o Evangelho, não tenho de que me gloriar, é antes uma obrigação que me foi imposta: ai de mim, se eu não evangelizar!» (1 Cor 9,16).

O tema, que escolhi para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado em 2012 – «Migrações e nova evangelização» –, nasce desta realidade. De facto, a hora presente chama a Igreja a realizar uma nova evangelização inclusive no vasto e complexo fenómeno da mobilidade humana, intensificando a ação missionária tanto nas regiões de primeiro anúncio, como nos países de tradição cristã.

O Beato João Paulo II convidava-nos a «alimentar-nos da Palavra para sermos “servos da Palavra” no trabalho da evangelização… [numa] situação que se vai tornando cada vez mais variada e difícil com a progressiva mistura de povos e culturas que caracteriza o novo contexto da globalização» (Carta apost. Novo millennio ineunte, 40). Com efeito, as migrações dentro ou para fora da nação, como solução para a busca de melhores condições de vida ou para fugir de eventuais perseguições, guerras, violência, fome e catástrofes naturais, produziram uma mistura de pessoas e de povos sem precedentes, com novas problemáticas do ponto de vista não só humano, mas também ético, religioso e espiritual. As atuais e palpáveis consequências da secularização, a aparição de novos movimentos sectários, uma difundida insensibilidade à fé cristã, uma acentuada tendência à fragmentação, tornam difícil focalizar uma referência unificadora que encoraje a formação de «uma só família de irmãos e irmãs em sociedades que se tornam cada vez mais multiétnicas e interculturais, onde também as pessoas de várias religiões são estimuladas ao diálogo, para que se possa encontrar uma serena e frutuosa convivência no respeito das legítimas diferenças», como eu escrevia na Mensagem do ano passado para este Dia Mundial. O nosso tempo está marcado por tentativas de cancelar Deus e a doutrina da Igreja do horizonte da vida, enquanto ganham terreno a dúvida, o ceticismo e a indiferença, que gostariam de eliminar todo e qualquer referimento social e simbólico da fé cristã.

Em tal contexto, sucede frequentemente que os migrantes que conheceram Cristo e O aceitaram se sintam impelidos a considerá-Lo como não relevante na própria vida, a perder o sentido da fé, a deixar de se reconhecerem como parte da Igreja, acabando muitas vezes por viverem uma existência que já não é caracterizada por Cristo e pelo seu Evangelho. Cresceram no seio de povos marcados pela fé cristã, mas depois com frequência emigram para países onde os cristãos são uma minoria ou a antiga tradição de fé já não é convicção pessoal, nem confissão comunitária, mas está reduzida a um facto cultural. Aqui a Igreja enfrenta o desafio de ajudar os migrantes a manterem firme a fé, mesmo quando falta o apoio cultural que existia no país de origem, lançando mão inclusive de novas estratégias pastorais, assim como de métodos e linguagens para um acolhimento vivo da Palavra de Deus. Em alguns casos, trata-se duma ocasião para proclamar que, em Jesus Cristo, a humanidade se torna participante do mistério de Deus e da sua vida de amor, abrindo-se a um horizonte de esperança e de paz através, nomeadamente, do diálogo respeitoso e do testemunho concreto da solidariedade, enquanto, noutros casos, há a possibilidade de despertar a consciência cristã adormecida, através dum renovado anúncio da Boa Nova e duma vida cristã mais coerente para fazer descobrir a beleza do encontro com Cristo, que chama o cristão à santidade em todo o lado, mesmo em terra estrangeira.

Mas o atual fenómeno migratório é também uma oportunidade providencial para o anúncio do Evangelho no mundo contemporâneo. Homens e mulheres provenientes das mais diversas regiões da terra, que ainda não encontraram Jesus Cristo ou que O conhecem só de maneira parcial, pedem para ser acolhidos em países de antiga tradição cristã. Em relação a eles, é necessário encontrar modalidades adequadas para que possam encontrar e conhecer Jesus Cristo e experimentar o dom inestimável da salvação, que para todos é fonte de «vida em abundância» (cf. Jo 10,10); os próprios migrantes desempenham um papel precioso a este respeito, porque podem, por sua vez, tornar-se «anunciadores da Palavra de Deus e testemunhas do Senhor Ressuscitado, esperança do mundo» (Exort. apost. Verbum Domini, 105).

No exigente itinerário da nova evangelização em âmbito migratório, assumem um papel decisivo os agentes pastorais – sacerdotes, religiosos e leigos – que se encontram a trabalhar num contexto cada vez mais pluralista: em comunhão com os seus Ordinários, inspirando-se no Magistério da Igreja, convido-os a procurar caminhos de partilha fraterna e anúncio respeitoso, superando contrastes e nacionalismos. Por sua vez, as Igrejas tanto de proveniência, como de trânsito e de acolhimento dos fluxos migratórios saibam intensificar a sua cooperação em benefício tanto dos que partem como daqueles que chegam e, em todo o caso, de quantos têm necessidade de encontrar no seu caminho o rosto misericordioso de Cristo no acolhimento do próximo. Para uma frutuosa pastoral de comunhão, poderá ser útil atualizar as tradicionais estruturas que atendem os migrantes e os refugiados, dotando-as de modelos que correspondam melhor às novas situações em que aparecem diferentes culturas e povos a interagir.

Os refugiados que pedem asilo, fugindo de perseguições, violências e situações que põem em perigo a sua vida, têm necessidade da nossa compreensão e acolhimento, do respeito pela sua dignidade humana e seus direitos, assim como da consciência dos seus deveres. O seu sofrimento reclama dos diversos Estados e da comunidade internacional que haja atitudes de mútuo acolhimento, superando temores e evitando formas de discriminação e que se procure tornar concreta a solidariedade também mediante adequadas estruturas de hospitalidade e programas de reinserção. Tudo isto exige uma ajuda recíproca entre as regiões que sofrem e aquelas que, anos após anos, acolhem um grande número de pessoas em fuga e também uma maior partilha de responsabilidades entre os Estados.

A imprensa e os outros meios de comunicação desempenham um papel importante para fazer conhecer, com imparcialidade, objetividade e honestidade, a situação de quantos foram forçados a deixar a sua pátria e os seus afetos e desejam começar a construir uma nova existência.

As comunidades cristãs reservem particular atenção aos trabalhadores migrantes e suas famílias, acompanhando-os com a oração, a solidariedade e a caridade cristã; valorizando aquilo que enriquece reciprocamente e promovendo novos projetos políticos, económicos e sociais, que favoreçam o respeito pela dignidade de cada pessoa, a tutela da família, o acesso a uma habitação condigna, ao trabalho e à assistência.

Sacerdotes, religiosos e religiosas, leigos, e sobretudo os jovens e as jovens, mostrem-se sensíveis e ajudem incontáveis irmãs e irmãos que, tendo fugido da violência, se devem confrontar com novos estilos de vida e com dificuldades de integração. O anúncio da salvação em Jesus Cristo será fonte de alívio, esperança e «alegria completa» (cf. Jo 15,11).

Por fim, desejo recordar a situação de numerosos estudantes vindos de outros países que enfrentam problemas de inserção, dificuldades burocráticas, aflições na busca de alojamento e de estruturas de acolhimento. De modo particular, as comunidades cristãs mostrem-se sensíveis com tantos jovens que, além do crescimento cultural, têm necessidade – precisamente devido à sua tenra idade – de pontos de referência, cultivando no seu coração uma profunda sede de verdade e o desejo de encontrar Deus. De modo especial, as Universidades de inspiração cristã sejam lugares de testemunho e de irradiação da nova evangelização, aparecendo seriamente comprometidas, no ambiente académico, não só em cooperar para o progresso social, cultural e humano, mas também em promover o diálogo entre as culturas, valorizando a contribuição que podem dar os estudantes estrangeiros. Estes sentir-se-ão impelidos a tornar-se, eles mesmos, protagonistas da nova evangelização, se encontrarem testemunhas autênticas do Evangelho e modelos de vida cristã.

Queridos amigos, invoquemos a intercessão de «Nossa Senhora do Caminho», para que o anúncio jubiloso da salvação de Jesus Cristo infunda esperança no coração daqueles que se encontram, em condições de mobilidade, pelas estradas do mundo. A todos asseguro a minha oração e concedo a Bênção Apostólica.

Vaticano, 21 de setembro de 2011

BENEDICTUS PP. XVI

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