A presença dos sacerdotes das várias paróquias da Diocese neste Pontifical Crismai é porventura a manifestação mais significativa da unidade e da comunhão do Presbitério. A renovação das promessas sacerdotais remete-nos para a exigência da nossa fidelidade que o testemunho generoso e alegre como sacerdotes manifesta.
O Espírito, anunciado na profecia de Isaías, profecia que Jesus na Sinagoga de Nazaré solenemente declarou cumprida precisamente naquela ocasião, é o mesmo que recebemos na Ordenação Sacerdotal pela imposição das mãos do Bispo, e cujo envio sobre os novos padres o bispo ordenante pede ao Pai do Céu na Oração que formaliza o Sacramento.
O amor de Deus, através de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, irrompe na humanidade com a força da libertação, o bálsamo da plenitude da alegria, a abundância da Graça.
A nós, sacerdotes, muito particularmente nestes tempos difíceis que vivemos, cabe-nos a missão de continuar a anunciar e realizar esta Boa Nova na nossa vida e na vida dos outros, com gestos de comprometida solidariedade e proximidade dos que mais sofrem e precisam. Esta é a nossa vocação, este é o serviço a que somos chamados. Neste momento em que publicamente testemunharemos as nossas interiores disposições, consenti que convosco recorde a mensagem que o Santo Padre nos dirigiu em Fátima na tarde do passado dia 12 de maio: “Permiti abrir-vos o coração para vos dizer que a primeira preocupação de todo o cristão, nomeadamente da pessoa consagrada e do ministro do altar, há de ser a fidelidade e a lealdade à própria vocação, como discípulo que quer seguir o Senhor. A fidelidade no tempo é o nome do amor, de um amor coerente, verdadeiro e profundo a Cristo Sacerdote. […] Isto supõe, evidentemente, uma verdadeira intimidade com Cristo na oração, pois será a experiência forte e intensa do amor do Senhor que há de levar os sacerdotes e os consagrados a corresponderem ao seu amor de modo exclusivo e esponsal.”
Por este comportamento em relação ao Senhor e aos irmãos passa portanto a garantia da nossa fidelidade. No contexto a que no parágrafo anterior fiz referência, continua muito viva na memória e mais ainda certamente nas nossas atitudes, a orientação muito prática e muito concreta de Sua Santidade, quando a seguir, nos recomendou uma vida fraterna e solidária: “A fidelidade à própria vocação exige coragem e confiança, mas o Senhor quer também que saibais unir as vossas forças; sede solícitos uns pelos outros, sustentando-vos fraternalmente. Os momentos de oração e estudo em comum, de partilha das exigências da vida e trabalho sacerdotal são uma parte necessária da nossa vida. Como é maravilhoso quando vos acolheis uns aos outros nas vossas casas, com a paz de Cristo nos vossos corações! Como é importante que vos ajudeis mutuamente por meio da oração e com conselhos de discernimentos úteis!” E depois de referir as situações “de certo esmorecimento dos ideais sacerdotais ou a dedicação a atividades que não concordem integralmente com o que é próprio de um ministro de Jesus Cristo”, conclui com o repto veemente, verdadeiro programa de convivência sacerdotal: “É hora de assumir, juntamente com o calor da fraternidade, a atitude firme do irmão que ajuda seu irmão a manter-se de pé.”
A Santíssima Eucaristia Crismal que estamos a viver é como se fosse a preparação próxima do presbitério e de cada um de nós, para a celebração do Tríduo Pascal, a culminar na gloriosa Ressurreição do Senhor.
Os cristãos em Portugal, nos grupos apostólicos a que pertencem, ou individualmente, com particular atenção e seriedade, refletiram e responderam a um inquérito que lhes foi apresentado – repensar a pastoral na Igreja em Portugal. Eu sei que foi a comunhão recomendada pelo Santo Padre que presidiu às reuniões nos vossos ambientes pastorais e vos deu a consciência de que não podemos limitar-nos a olhar atentos para a movimentação empenhada dos nossos fiéis, apreciando criteriosamente os resultados com a preocupação de encontrar a linha pastoral mais eficiente. Temos de interpelar-nos também com muita sinceridade e humildade, com o objetivo de encontrarmos o caminho de uma séria conversão. O tempo litúrgico que estamos quase a concluir é para nós, tempo de graça, tempo de salvação, como o temos pregado aos outros, a pedir-nos a pessoal renovação interior a todos necessária. O perdão do sacramento da penitência que assiduamente recebemos e tão abundantemente distribuímos nesta quadra quaresmal, é sempre o caminho por excelência da conversão que nos é pedida.
Permiti que neste contexto acrescente e partilhe convosco uma reflexão de Bento XVI, dirigida aos participantes no curso acerca do foro interno da Penitenciaria Apostólica e que considero pertinentíssima.
Ouçamos então o Santo Padre: “Desejo meditar convosco sobre um aspeto às vezes não suficientemente considerado, mas de grande relevância espiritual e pastoral: o valor pedagógico da Confissão sacramental. […] A disponibilidade fiel e generosa de sacerdotes à escuta das confissões, segundo o exemplo dos grandes santos da história, de são João Maria Vianney a são João Bosco, de são José Maria Escrivá a são Pio de Pietrelcina, de são João Cafasso a são Leopoldo Mandic, indica-nos a todos o modo como o confessionário pode ser um «lugar» real de santificação.”
Enumerarei as três situações apontadas por Sua Santidade, cuja riqueza de conteúdo me parece oportuna e adequada a este momento. “Quantas vezes – diz Bento XVI – na celebração do Sacramento da Penitência, o presbítero assiste a verdadeiros milagres de conversão que, renovando o «encontro com um acontecimento, com uma Pessoa», fortalecem a sua própria fé. No fundo, confessar significa assistir a tantas «professiones fidei» quantos são os penitentes, e contemplar a obra de Deus misericordioso na história, ver concretamente os efeitos salvíficos da Cruz e da Ressurreição de Cristo, em todos os tempos e para cada homem”.
Sublinha a seguir Bento XVI outra circunstância que consolida as nossas disposições de fidelidade e deve consequentemente merecer a nossa atenção: “Não raro somos postos diante de verdadeiros dramas existenciais, que não encontram uma resposta na palavra dos homens, mas são abraçados e assumidos pelo Amor divino, que perdoa e transforma. […] Conhecer e de certo modo, visitar o abismo do coração humano, até nos aspetos mais obscuros, se por um lado põe à prova a humanidade e a fé do próprio sacerdote, por outro, alimenta nele a certeza de que a última palavra sobre o mal do homem e da história, é de Deus, é da sua misericórdia capaz de renovar todas as coisas.” Quem de nós o não sentiu ao longo da vida?
E com uma constatação que com frequência todos experimentamos, conclui Bento XVI: “Quanto pode aprender o sacerdote de penitentes exemplares pela sua vida espiritual, pela seriedade com que realizam o exame de consciência, pela transparência no reconhecimento do pecado pessoal e pela docilidade ao ensinamento da Igreja e às indicações do confessor. Da administração do Sacramento da Penitência podemos receber profundas lições de humildade e de fé! […] A celebração do Sacramento da Penitência tem um valor pedagógico para o sacerdote, em vista da sua fé, da verdade e da pobreza da sua pessoa, e alimenta nele a consciência da identidade sacramental.” Será a altura providencial para nos interrogarmos. Com que disponibilidade e fidelidade, celebramos e aproveitamos este sacramento da misericórdia e da conversão? Não passará por aqui o propósito que o Senhor nos pede na renovação das promessas sacerdotais?
Como expressão de comunhão, já de longa data, no Pontifical Crismal, agradecemos ao Senhor a Graça que para a Diocese é a riqueza dos novos padres ultimamente ordenados, o P. André Filipe, o P. António Jorge, o P. Bernardo Maria, o P. José Filipe, e recentemente o P. Tiago André; comungamos também a gratidão e o júbilo de Mons. Armando Ribeiro, P. João André e P. Manuel Pinto de Almeida pelos 50 anos do seu sacerdócio e também do P. Carlos Carvalho e P. Francisco Marques a celebrar as suas Bodas de Prata sacerdotais; sufragamos as almas do P. Delfim Pedro, P. Armando Tomé, P. Lacerda, P. Alberto Ferreira e P. Samuel, do Diácono Manuel Assunção Amorim, e ainda as mães do P. Martins, vicentino, do P. Victor de Carvalho, do P. José Abrunhosa, do P. António Luís, e dos Padres Ramos; a irmã do P. Leontino, e a avó do P. Marcos. Através da oração, acompanhamos os nossos irmãos que testemunham o seu sacerdócio na fragilidade da idade e da doença: Mons. Veríssimo, Mons. Simão, P. Manuel Pinto Afonso, P. Álvaro de Almeida, P. Manuel Pinto de Almeida, P. Mário Lages, P. Duarte Vaz, P. João Duarte de Carvalho, C. Joaquim Mendes de Castro, C. António de Sousa Pinto, P. Lucas Pedrinho, P. Melchior Coelho, P. João Crisóstomo e P. Armindo Rocha. Rezamos pelas mães do P. Justino, dos Padres Seixeira, do P. Samuel, pelo pai do P. Hermínio, pelos pais do P. António Lemos, pelo irmão do P. Ildo e pela avó do P. Paulo Esteves.
À Mãe de Jesus e Mãe dos sacerdotes, nos confiamos, como Presbitério de Lamego, pedindo-Lhe que nos cubra com o Seu manto protetor e abençoe o nosso ministério; e dê a todos os fiéis da Diocese, como anunciou S. Paulo na segunda leitura,a consciência de que são Povo Sacerdotal.
D. Jacinto Botelho, bispo de Lamego