Conferência do arcebispo de Braga na VI Jornada da Família, Vila Nova de Famalicão

Educar e Testemunhar

Educar e Testemunhar segundo a Boa-Nova de Jesus Cristo é uma verdadeira “emergência” na missão da Igreja.

Ao longo dos séculos a Igreja exerceu a sua missão no campo do ensino. Os discípulos reuniram-se em torno de Jesus, Mestre da Palavra, pedagogo exímio, porque cheio da sabedoria de Deus-Pai. A primeira comunidade cristã era assídua ao “ensino dos apóstolos” e ao testemunho que davam do amor de Deus. A Igreja, com a graça do Espírito Santo, com o contributo de homens e mulheres sábios, desde sempre ajudou a desvendar o mistério da criação e do homem.

 Estamos numa sociedade e num tempo novo que exige de nós o esforço contínuo de repensar os modelos educativos. O que significa educar? Que educação para hoje? Que projectos educativos existem? Como educar e para quê? São questões que certamente já foram levantadas e debatidas ao longo desta Jornada de reflexão.

Não sem razão se diz que as figuras tradicionalmente educativas se adaptaram, por via das circunstâncias do tempo, às correntes pedagógicas do facilitismo e da lei do menor esforço. Acomodaram-se aos conselhos de pedagogias centradas na auto-realização individual sem vislumbrar uma cultura da fraternidade e da partilha de valores. Um panorama que contagiou a Família, a Escola e a própria Igreja. Assim:

A família, na sua forma materna e paterna, já não ousa contrariar as crianças e permite precocemente, por demissão ou por omissão, todo o tipo de experiências que desequilibram o crescimento integral da pessoa. É preciso clareza e comunhão no exercício do testemunho parental. Onde está um sim também pode estar um não.

·A escola, na perspectiva redutora de uma formação pluricultural, não tem sido capaz de delinear um projecto educativo respeitador e promotor de uma cultura verdadeiramente humana. Impõe-se a todo o custo uma ideologia educativa estatal com a consequente eliminação silenciosa de todas as propostas educativas que orientem para os valores do testemunho, da autoridade, da seriedade, da vontade de trabalho e de iniciativa, da fé e da visão cristã do mundo.

A Igreja, na sua tarefa irrenunciável de apresentar um projecto educativo à luz do pensamento cristão, nem sempre tem sido capaz de propor um itinerário de crescimento e de diálogo entre a fé e a razão. A formação dos agentes educativos da Igreja é urgentíssima porque estamos a perder oportunidades únicas de testemunhar com a vida o anúncio primordial da fé cristã. É tempo de perguntar se a actual catequese é um itinerário que educa e forma discípulos de Cristo? As famílias sentem-se responsáveis pela catequese dos seus filhos? Como temos acompanhado aqueles jovens que após o crisma não regressam à comunidade? O que temos para lhes oferecer? Que novos ministérios poderão surgir nas nossas comunidades à luz dos dons variados dos nossos jovens? Será que a proposta de anunciar o Evangelho na comunidade se resume à presença dominical, a ser leitor, acólito ou membro do grupo coral?

Se estes tradicionais lugares de educação estão a perder a sua capacidade de formar teremos de voltar a acreditar na família como a primeira escola da esperança e da comunhão. Não basta ser pai ou mãe. É preciso ter a humildade para reconhecer que educar exige disponibilidade, encontro, presença e acompanhamento. Também as comunidades cristãs devem exercer essa missão educadora na fé, testemunho e desafiando os jovens a colocar os seus dons ao serviço do próximo.

Nesse sentido é para a Igreja um autêntico desafio criar novos ministérios que se aproximem dos dons dos mais novos de modo que as suas qualidades possam ser acolhidas para o crescimento da comunidade. Indico alguns ministérios possíveis: a utilização das novas tecnologias (página da internet do arciprestado ou da paróquia); a elaboração de uma equipa de jornalismo que elabore o boletim paroquial e divulgue a fé cristã na comunicação social; a formação de equipas de voluntariado de acção social (tantos jovens formados em Ciências Sociais!); iniciativas de índole cultural onde o pensamento cristão seja apresentado com criatividade e originalidade (por exemplo apresentar uma exposição bíblica a partir das artes plásticas ou da pintura com crianças da catequese ou jovens formados em Belas Artes). Não podemos exigir que venham somente à Eucaristia dominical, é preciso que a comunidade acolha com a alegria as várias sinergias e dons ao serviço do Evangelho.

Neste compromisso activo e no exercício de uma cidadania pensante, permiti que partilhe convosco uma preocupação, um apelo e um compromisso:

1 ) Preocupa-me a redução da educação a uma certa demagogia ideológica. Ultimamente verifica-se uma polarização da perspectiva economicista da educação. Por nosso lado não podemos deixar de dizer que o ensino privado não pode ser visto como contraponto do estatal. O ensino privado é ensino público na medida em que está ao serviço de toda a sociedade na formação dos quadros directivos e do tecido produtivo do nosso país. Certamente que a questão económica não é despicienda mas é necessário garantir o direito das famílias poderem escolher o modelo educativo para os seus filhos.

2) Apelo a uma educação integral resultante de testemunho de vida e da competência técnica de todos aqueles que interagem no acompanhamento vocacional das crianças e dos jovens. Uma educação que não seja auto-realização ou funcionalista mas que eduque as novas gerações para uma cidadania exigente e activa na luta por um progresso justo e humano.

3) Como cristãos não podemos deixar de propor uma educação católica, universal e diversificada, que toque as grandes questões da nossa existência. Educar na fé é seguir a pedagogia de Jesus que inicia os discípulos a partir do testemunho relacional com Deus, Seu e nosso Pai.

Por isso, a todos deixo uma palavra de encorajamento para darmos razões de esperança às novas gerações. A vós, pais e educadores na fé, peço que testemunheis com a vida aquilo que ensinais, porque vós sois os primeiros responsáveis no crescimento harmonioso e sadio dos vossos filhos. Não desanimeis na bela missão de educar humanamente aqueles e aquelas que darão continuidade à obra da criação de Deus.

Famalicão, 29 de Janeiro de 2011

D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga

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