Cinema: «Vão-me Buscar Alecrim»

Separado da mulher, Lenny, 34 anos, todos os anos passa uma quinzena de férias com os filhos Sage e Frey de, respectivamente 9 e 7 anos de idade.

Acabado o trabalho, Lenny entra em euforia para distribuir as 24 horas de cada dia por tudo o que quer aproveitar ao máximo: os filhos, os amigos, a namorada, novas experiências. O tempo para si e para os outros. Sem regras nem prioridades, está apostado em transformar duas semanas numa vida e a não impor obstáculos entre si e os seus filhos, que adora. Inevitavelmente, a confusão sobre o seu papel de pai, entre a autoridade e o modelo que deve representar e o desejo de proximidade das crianças instala-se, deixando descambar a relação para a ausência de rumo, a irresponsabilidade, a negligência. Perdido entre as pretensões a melhor pai e melhor amigo, Lenny, com as suas boas intenções e a sua imaturidade, acaba por perder o controlo da situação, com consequências lamentáveis…

Nem fácil nem leve, “Vão-me Buscar Alecrim” é um retrato possível de uma realidade actual, mesmo que não abrangente: a questão mais interessante que nos coloca não é, talvez, tanto a da imaturidade de um pai no seu extremo como ausência de fronteiras, genericamente, entre pais e filhos, a que muitos de nós – que somos pais ou mães – ou todos os outros – que o são – tendemos, de alguma forma, hoje em dia. Aqui, é também um princípio hedonista da sociedade actual que está em causa, – a ideia de que é possível viver (apenas) com e pela alegria e a felicidade – esquecendo que os limites, a autoridade, a distância, como as dificuldades, não são espartilhos mas barreiras de segurança entre as pessoas, nas relações.

Vencedor do Grande Prémio de Longa-metragem “Cidade de Lisboa” no IndieLisboa, “Vão-me Buscar Alecrim” foi a história que convenceu o Júri, a crítica e uma parte do público pela sua autenticidade e crueza. Filmado com o ritmo e o estilo vertiginoso e vibrante que Lenny imprime à sua vida e à relação com os filhos, eis o trabalho dos jovens realizadores e irmãos Josh e Ben Safdie, sério, digno de nota e de boa expectativa em obra futura.

Margarida Ataíde

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