Renovar a esperança, desbravando caminhos

Parece claro a muita gente que a visita de Bento XVI a Portugal nos bafejou com a renovação da Esperança. Nas suas diferentes comunicações e contactos, mostrou que existem motivos para uma forte união a favor do entendimento mútuo, respeitando o pluralismo, e do bem comum. No domínio social – onde se situa esta breve reflexão – talvez se possam realçar quatro propostas fundamentais: a intensificação do diálogo; a intervenção nos mecanismos socioeconómicos; a dinamização das instituições eclesiais de acção social; e o papel dos leigos na Igreja e na sociedade. Não sendo possível abordar agora as quatro propostas, limito-me à primeira – o diálogo. E, porque escolho uma abordagem prospectiva – não tendo a veleidade de interpretar o pensamento papal – detenho-me, tão somente, no imperativo dialogal dentro das nossas realidades económicas e sociopolíticas.

Antes de mais, há que evitar a tendência para reduzir o diálogo eclesial ao que se recomenda entre a Igreja e o mundo, particularmente o mundo da cultura. Apesar da sua relevância, não podemos continuar a manter duas graves lacunas, muito antigas entre nós: Refiro-me ao diálogo social no interior da Igreja, e ao diálogo de intervenção nas diferentes estruturas da ordem terrestre.

O diálogo social no interior da Igreja, praticamente inexistente até agora, tem como base as relações entre trabalhadores, empresários e outros agentes económico-sociais, e visa fundamentalmente: O aprofundamento da realidade económico-social e da doutrina social da Igreja; a procura dos consensos possíveis para a solução dos problemas socioeconómicos; à luz dessa doutrina; o contributo para uma opinião pública, plural, dentro e fora da Igreja; o apoio de rectaguarda aos católicos empenhados nas associações sindicais, empresariais ou de outra natureza, na negociação colectiva, na concertação social…

O diálogo de intervenção nas diferentes estruturas da ordem terrestre deveria realizar-se, dentro e fora delas. A família, o espaço de convívio, a escola, a creche, o lar ou centro de dia, a empresa, a associação, o meio de comunicação social, o departemento público, a unidade de saúde, o partido político, o órgão de soberania… são exemplos de estruturas onde se impõe que os cristãos actuem, sistematicamente, a favor da justiça, da solidariedade e da humanização. O convite pontifício a que façamos das nossas «vidas lugares de beleza» aponta claramente neste sentido; e interliga-se com o apelo conciliar para se «impregnar e aperfeiçoar com o espírito evangélico a ordem temporal» («A postolicam Actuositatem», 1965, nº. 5). O próprio Bento XVI se fez eco deste apelo no nº. 29 da encíclica «Deus Caritas Est», 2005: «É missão dos fieis leigos configurar rectamente a vida social, respeitando a sua legíma autonomia e cooperando, segundo a respectiva competência e sob a própria responsabilidade, com os outros cidadãos». Em fidelidade a estas interpelações, ocorre perguntar: Quantos grupos e movimentos de leigos portugueses actuam assim, de maneira sistemática? Qual a articulação – comunhão – entre eles? Que propostas apresentam para a solução dos graves problemas com que se debate o povo português? Avaliam periodicamente os resultados da sua acção, bem como seus consensos e desentendimentos? Programam regularmente novas acções para o futuro, respeitando sempre a base evangélica e o fim último comuns, a par do saudável pluralismo sociopolítico?

Acácio F. Catarino

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