1. Peregrinos para a cidade de Deus
“Que alegria quando me disseram vamos para a casa do Senhor”! É a alegria e o fortalecimento da fé que vimos procurar na peregrinação ao santuário de Fátima. Neste lugar santo evocamos a visita de Nossa Senhora, revivemos a sua mensagem, ouvimos mais atentamente o seu apelo à conversão ao evangelho como caminho para purificar e renovar a Igreja. O santuário tornou-se um lugar privilegiado da presença de Deus onde a força da graça divina nos envolve profundamente, nos convida à beleza da vida nova em Cristo e nos orienta na construção de um mundo novo. A luz e o amor de Deus que a Virgem Nossa Senhora prometeu, através dos pastorinhos, são oferecidos a todos nós peregrinos para renovar a nossa vida cristã nestes tempos difíceis para fé.
Saúdo todos os fiéis peregrinos, membros do povo santo de Deus na riqueza dos ministérios e carismas, de comunidades e movimentos, os bispos participantes no ministério apostólico, os presbíteros colaboradores na mesma missão, os diáconos servidores do evangelho, os religiosos (as), os seminaristas, os leigos, todos irmãos e irmãs em Jesus Cristo. Congregados à volta do Senhor com a protecção da Mãe do Céu, somos uma manifestação da Igreja, cidade santa, Jerusalém celeste como referia a segunda leitura colhida do Apocalipse. Apesar de empobrecida pelas nossas faltas, a Igreja é adornada com os dons de Deus que a tornam bela e resplandecente. Alicerçada no sólido fundamento dos doze apóstolos, continua a missão de Jesus de reunir todos os povos numa fraternidade universal, significada pelas três portas em cada um dos pontos cardeais.
Ser cristão é pôr-se a caminho para a cidade santa cujo arquitecto e construtor é Deus, como afirma a Carta aos Hebreus, é cultivar a esperança do novo céu e da nova terra onde habita a a paz e a justiça, é procurar a novidade constante de Deus. A nossa condição de discípulos é a condição de peregrinos: habitamos no mundo mas não somos do mundo, aspiramos às realidades do alto, procuramos os valores espirituais do mundo novo inaugurado pela ressurreição de Cristo, a civilização do amor, da verdade e da santidade. Esse é o significado e o fruto da peregrinação. Desinstala-nos da segurança e das comodidades, rompe o nosso individualismo, quebra a monotonia e incentiva-nos a reanimar a fé, a reacender o entusiasmo, a crescer como povo santo chamado das trevas à luz admirável de Deus.
2. Brilhe a vossa Luz
Somos hoje tentados pelo comodismo, pela indolência na prática da fé, pelo desinteresse das realidades espirituais. Como afirmou o cardeal Ratzinger, antes de ser nomeado Papa, “a maior heresia dos tempos actuais é o cansaço da fé, o desgaste com que muitos cristãos vivem a sua relação com Cristo; aquilo que deveria ser motivo de alegria contagiante tornou-se baço”. Sem alegria e sem entusiasmo o cristianismo torna-se um formalismo vazio, um ritualismo sem vida. Peçamos ao Senhor por intercessão de Maria que o exercício da peregrinação nos anime a progredir no caminho do evangelho. Aprendamos com Nossa Senhora a escutar e a guardar a palavra de Jesus, a dispor o coração para acolher o Espírito Santo, a servir o desígnio de Deus: “Quem me ama guardará a minha palavra e meu Pai o amará. Nós viremos a ele e faremos nele a nossa morada” (Jo 14, 23). Esforcemo-nos por crescer na formação cristã através do contacto mais assíduo e da prática mais fiel da Palavra do Senhor que nos ilumina e configura à sua imagem. Não podemos ser discípulos sem disciplina séria no seguimento de Jesus Cristo. Se Cristo habita em nós e determina o nosso estilo de vida, então a sua glória resplandece em nós e, através do nosso testemunho, irradia para o mundo: “Brilhe a vossa luz”.
3. Promessa do Espírito Santo
Tão elevada missão parece estar acima das nossas possibilidades humanas. Acreditamos que Cristo habita em nós mas, na realidade, continuamos expostos às nossas dúvidas e fraquezas, sujeitos aos nossos impulsos egoístas, incapazes de compreender e seguir o caminho da santidade. Jesus tranquiliza-nos, como ouvimos no evangelho: “Não se perturbe nem se intimide o vosso coração: O Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome vos ensinará todas as coisas e vos recordará tudo o que Eu vos disse”. O Espírito Santo não resolve todos os nossos problemas mas comunica-nos o que é necessário para vencer o mal e seguir o caminho da verdade.
Neste tempo pascal, ao aprofundarmos a vida nova que o Senhor Ressuscitado nos chama a viver, somos também confortados com a promessa da força do Espírito Santo que derrama em nossos corações o amor e faz de nós novas criaturas: “Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos dará nova vida aos vossos corpos mortais pelo Seu Espírito que habita em vós”. (Rm 8, 10-11).; é o mandamento novo do amor que faz de nós homens novos; é o amor que salva o mundo do mal, do ódio, da violência, da cegueira. Se escutarmos a voz do Espírito Santo, que ressoa nas Sagradas Escrituras, Ele será o nosso Guia interior no caminho para a verdade, para o amor e para a sabedoria.
O trecho do livro dos Actos, que ouvimos na primeira leitura, mostra-nos a acção do Espírito Santo que guia os apóstolos na missão da Igreja e, através deles, garante a comunhão eclesial que integra as diferenças legítimas na unidade e derruba os muros que dividem ou os particularismos que isolam. “O Espírito Santo e nós decidimos”, afirmava São Tiago para fundamentar a orientação de abrir a porta da fé cristã aos gentios. Face aos desentendimentos que surgem nas comunidades cristãs, não só nas primitivas mas em todas as épocas, e ameaçam a unidade, os apóstolos e os seus sucessores têm a missão de discernir os caminhos do Espírito Santo e garantir a comunhão eclesial, condição indispensável para a difusão do evangelho no mundo. Peçamos ao Espírito Santo que nos ajude a promover uma maior união e integração no único Corpo de Cristo que cresce com a colaboração conjugada de todas as suas células (Cf Ef 4,16).
Realizamos a nossa peregrinação nas vésperas da visita do Santo Padre Bento XVI que coincide com o centenário do nascimento da beata Jacinta e com os dez anos da beatificação dos pastorinhos. A pequena Jacinta é um exemplo admirável de dedicação à Igreja e veneração ao Santo Padre. Mostra-nos, de forma encantadora, a alegria de dar e colaborar. Bento XVI vem como continuador do Apóstolo Pedro confirmar-nos na fé, nestes tempos de descrença e relativismo, e incentivar-nos à missão de levar a luz do amor e da esperança ao mundo. Saibamos acolhê-lo com alegria e atenção. Que a visita do sucessor de Pedro e a memória da beata Jacinta sejam um incentivo a seguir o exemplo da Virgem de Nazaré, estrela da esperança no seguimento de Cristo luz do mundo.
Fátima, 9 de Maio de 2010.
+ Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém