Especialistas comentam percurso de estudo e reflexão que faz de Joseph Ratzinger uma referência central do pensamento católico nas últimas décadas
Bento XVI é uma das maiores referências do pensamento católico nas últimas décadas e a sua obra tem contribuído para a renovação da teologia, em diálogo com a cultura actual.
A convicção é manifestada por quatro especialistas que escrevem no dossier especial que a Agência ECCLESIA apresenta esta semana, a respeito da figura do Papa que irá visita o nosso país em Maio próximo.
Para João Duque, secretário da Comissão Episcopal para a Doutrina da Fé e Ecumenismo, é possível encontrar no percurso teológico de Joseph Ratzinger, hoje Bento XVI, “um dos maiores e mais equilibrados contributos para a renovação teológica na cultura actual”.
O professor de teologia diz que a figura de Bento XVI tem de ser lida numa linha de continuidade, desde o entusiasmo gerado pelo espírito do Concílio Vaticano II ao cepticismo em relação a determinados modos de aplicação e recepção desse Concílio.
“Sempre que a relação entre verdade da fé cristã e história humana foi interpretada como relativização dessa verdade, que passa a ser construída, em cada circunstância histórica, a partir dos dados do mundo, como se não tivesse uma tradição própria ou como se essa tradição fosse falsa – sempre que uma corrente teológica ou uma tendência pastoral, até mesmo litúrgica, enveredou por essa perspectiva de ruptura, Ratzinger teve dificuldade em aceitar os ímpetos da nova teologia”, explica João Duque.
José Eduardo Borges de Pinho, professor de Teologia na UCP, considera que “na vida, na teologia e na intervenção eclesial” de Bento XVI “o ecumenismo constitui, como uma das consequências essenciais do Vaticano II, uma dimensão imprescindível da vivência e da reflexão teológica católicas”.
O teólogo português observa que o Papa assume um “posicionamento crítico” face a um ecumenismo “superficial” que, “subalternando e não enfrentando até ao fim a questão da verdade, não consegue atingir a unidade propriamente dita”.
O biblista Joaquim Carreira das Neves lembra, por seu lado, que o teólogo Joseph Ratzinger aborda o Judaísmo em todos os trabalhos teológicos que recorrem às Escrituras Hebraicas (Antigo Testamento-AT), sublinhando que “não há qualquer abordagem de teologia cristã que não pressuponha um exame analéptico ao AT”.
O exegeta franciscano recorda que “o filósofo, o teólogo e o pastor-papa J. Ratzinger visitou Auschwitz e Israel, foi orar a sinagogas de judeus. Interrogou Deus sobre o Holocausto, dialogou e orou com rabis nas sinagogas. Determinou como acção primária no seu pontificado o ecumenismo”.
O Papa tem atrás de si um passado de dedicação indesmentível a um programa eclesial e teológico próprio, que o distingue entre os pensadores da Igreja e da própria Europa, onde nasceu e sempre viveu.
João Caetano, Presidente do Centro Académico de Democracia Cristã (CADC), em Coimbra, destaca que foi como filósofo político e teólogo filosófico que Joseph Ratzinger, no período anterior à sua eleição como Papa, reflectiu sobre os conceitos políticos mais importantes do mundo ocidental: democracia, liberdade, governo e Estado, entre outros.
Para este responsável, Bento XVI “vê a democracia como a forma mais adequada de organizar a política, mas assinala-lhe contradições e limitações graves no tempo presente, provocadas pela falta de conhecimento e observação, pelos agentes políticos, de fundamentos morais sólidos, que ele identifica como os valores absolutos do cristianismo”.