Regulamentação da Lei da Imigração ficou aquém das expectativas As alterações que constam do novo regime jurídico para a imigração, decididas no último Conselho de Ministros, pode não vir a provocar grandes alterações na vida dos milhares de imigrantes em situação ilegal no nosso país. “Infelizmente as mudanças não serão tantas como nós gostaríamos”, começa por confessar Rosário Farmhouse, directora do Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) de Portugal. A definição de uma data limite – Março de 2003 – poderá implicar o fim do caminho para muitos imigrantes, como explica a directora do JRS-Portugal. “Há muita gente que não fez descontos porque a Segurança Social começou a não aceitar inscrições dos que se encontravam em situação irregular, há casos em que os patrões fizeram descontos fictícios e os imigrantes não o podem provar, penso que há algumas limitações e premissas que serão difíceis de colocar em prática”, refere. Outra novidade tem a ver com a preferência dada aos imigrantes que demonstrem o conhecimento da língua portuguesa. Na prática, isto significa que boa parte dos 6500 imigrantes que deverão entrar em Portugal, ao abrigo do relatório de oportunidades de emprego anunciado segunda-feira, poderá ser oriunda dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa. Esta intenção é registada no preâmbulo da nova lei que regula a entrada de estrangeiros no país. Para Rosário Farmhouse, “todas as discriminações, ainda que positivas, criam injustiças”. Além da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa, estão referenciados os “imigrantes de outros países que já tenham tido contacto com a língua e a cultura portuguesas”, o que pode significar um espaço de abertura para os imigrantes eslavos. “Pelo que li no preâmbulo, será normal dar prioridade àqueles que conhecem a nossa realidade, dado que terão maior facilidade de integração, mas limitar a entrada no país a pessoas da CPLP é injusto – até porque há muitos brasileiros e africanos que não nos percebem com facilidade”, aponta a directora do JRS-Portugal. RESPOSTAS LIMITADAS A política de imigração do Governo agora tornada pública assenta, fundamentalmente, num regime de quotas (6500 vagas em 2004), definidas de dois em dois anos. A lei deixa em aberto uma alteração à execução do relatório que define as quotas, podendo este ser suspenso “sempre que as condições do mercado de trabalho, que estiveram na base da sua elaboração, se alterem significativamente”. Esta opção clara em fazer do mercado de trabalho o motor da imigração incomoda particularmente o Serviço Jesuíta aos Refugiados. “Temos sempre a hipótese de pedir autorizações de residência por razões humanitárias ou de saúde, mas este é sempre um processo muito lento e limitado a casos muito esporádicos”, assinala Rosário Farmhouse. A redacção do decreto regulamentar estabelece, de facto, que os imigrantes tenham de apresentar uma promessa de contrato de trabalho nos consulados portugueses, assinada pelo empregado e pelo empregador, o comprovativo da oferta de emprego no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e da apresentação na Inspecção Geral do Trabalho (IGT). Outra das exigências para o processo de legalização é a obrigatoriedade de o imigrante apresentar o registo criminal no país de origem e em Portugal. A experiência do JRS, através do programa dos médicos, ensina que tal registo “tem de ser solicitado pelo próprio e se as pessoas estão numa situação de irregularidade não podem lá ir”, constata Rosário Farmhouse. A necessidade de uma maior capacidade de resposta por parte dos consulados e embaixadas nos países de origem volta a ser lembrada por esta responsável. “Temo muito que a actual incapacidade seja um factor limitativo para muitos imigrantes”, alerta. O futuro, aliás, não se afigura muito melhor em função dos novos decretos regulamentares. “Quanto mais se complicam os processos, mais tendência há para recorrer a mecanismos que estão fora do sistema. Estar legal devia obedecer mecanismos rigorosos, mas fáceis, que as pessoas pudessem cumprir: o aumento das dificuldades só propicia condições para o aparecimento de novas redes ilegais”, vai avisando esta responsável.
