Cristianismo e mediações visuais

Representações estão no centro da reflexão sobre a transmissão da experiência cristã

A construção da imagem de João Paulo II foi um dos exemplos apontados por Alfredo Teixeira para sublinhar a relação do cristianismo contemporâneo com as mediações visuais. O director do Instituto Universitário de Ciências Religiosas considera que a comunicação social foi um dos principiais artífices da “narrativa de heroicidade” do pontífice polaco, nomeadamente através da cobertura das suas viagens.

“Para as pessoas comuns, talvez tenha sido o primeiro Papa de que conheceram o nome próprio”, observou o professor da Faculdade de Teologia durante o primeiro painel da Jornada «Ver para Crer? Cristianismo e Culturas Visuais», que decorre hoje em Lisboa.

Neste sentido, a importância de João Paulo II para a História passará pela “hermenêutica visual” que lhe está associada.

A sua capacidade de “transformação da sociedade” e o poder de inscrever a mensagem cristã e a Igreja no centro do debate cultural devem muito ao impacto dos gestos que realizou. “No diálogo inter-religioso, por exemplo, eles estiveram muitas vezes à frente da doutrina”, referiu Alfredo Teixeira, que evoca uma “certa transcendência” que João Paulo II parecia ter face aos “poderes terrenos”.

A atracção dos meios de comunicação social por Karol Wojtyla traduz igualmente a sua influência “no cerne dos grandes dramas do século XX, em particular na Europa pós II Guerra Mundial”.

A iconografia do pontífice não se construiu apenas com as grandes atitudes simbólicas. A normalidade do seu quotidiano também foi retratada, sem que essas imagens tivessem diminuído a figura de João Paulo II.

Da verdade cristã à estética relacional

O percurso entre a verdade cristã e a estética relacional foi ilustrado por Paulo Pires do Vale, através de um conjunto de imagens de arte contemporânea.

O Antigo Testamento e, sobretudo, a primeira vinda de Cristo, sinalizaram a existência do Deus que se aproxima do ser humano e se manifesta no seu íntimo.

Esta ruptura na concepção do transcendente assinalou uma alternativa ao universo religioso tradicional, abrindo a História a uma “verdade relacional” que, para o filósofo, valoriza “a existência concreta, o presente, o quotidiano, a pessoa, o marginal, o incógnito” e a acção em favor de outros.

Esta perspectiva está na origem de uma “arte da saída da arte”, que “não se satisfaz com a dimensão retiniana e contemplativa ”, sugerindo antes uma “arte participativa”.

Na “estética relacional”, o artista “é um facilitador de experiências”, ao passo que o espectador deixa de o ser, tornando-se “actor” da interpretação da obra de arte. Esta, por sua vez, está permanentemente inacabada, na medida em que se abre aos significados do observador e produz uma comunidade em seu torno.

Representações pictóricas

Na terceira parte do painel, o Pe. João Eleutério defendeu que a “celebração católica da eucaristia é um exemplo onde as mediações nos fazem viajar entre a «mimesis» [imitação] e a «anamnesis» [memória]”.

O actual coordenador da «School of Christian Studies», em Macau, descreveu uma experiência designada «À mesa com Jesus», realizada na paróquia de Santa Isabel, em Lisboa.

Durante os encontros, destinados a uma população infantil, o teólogo procurou sublinhar as “contiguidades” entre a Bíblia e as representações pictóricas.

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