Declaração da Conferência das Comissões Europeias Justiça e Paz

Quais São as Fronteiras para a Solidariedade na Europa?

Nós, da Conferência das Comissões Europeias Justiça e Paz da Igreja Católica, representando 25 países Europeus, aceitámos um convite da Comissão Espanhola Justiça e Paz, e de Sua Eminência o Cardeal Carlos Amigo Vallejo, para vir a Sevilha, de 18 a 22 de Setembro de 2009, para realizar a nossa Assembleia-geral e um Workshop internacional sob o tema “Quais são as fronteiras para a solidariedade na Europa?”

O tema da solidariedade reveste-se de um significado especial, no contexto do nosso mundo crescentemente globalizado. Não admira que a globalização e as questões ligadas a este fenómeno tenham sido predominantemente tratadas na última Encíclica Caritas in Veritate do Papa Bento XVI, em que se afirma que: “A sociedade cada vez mais globalizada torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos” (Nº19).

Em Sevilha, tivemos a oportunidade de examinar os desafios à solidariedade – política, social, cultural e económica – tanto ao nível nacional como ao nível internacional. A experiência que partilhámos ali deu-nos um sentido renovado das nossas responsabilidades – como indivíduos, como Europeus e como Igreja – para enveredar por acções que enfrentem os desafios e para abater as barreiras que bloqueiam a solidariedade.

O papa João Paulo II disse-nos que “o trabalho humano é a chave, provavelmente a chave essencial, de toda a questão social” (Laborem Exercens, 3). Caritas in Veritate afirma também que este trabalho deve ser “decente” (Nº63). A experiência deste workshop confirmou esta visão. Uma reunião com o staff da Forja 21, uma ONG que providencia apoio aos jovens que procuram emprego, fez realçar a importância da resolução do problema do desemprego juvenil – presentemente uma preocupação séria de muitos países Europeus. Precisamos de investir nos jovens, que são o nosso futuro, facilitando o seu acesso ao emprego, que lhes permita participar na sociedade e alcançar o seu pleno potencial. O significado do desemprego como barreira à participação tem que ser reconhecido.

Uma visita ao enclave Espanhol de Ceuta na costa Marroquina permitiu-nos aprender mais sobre a dimensão humana dos desafios postos pela migração – um fenómeno estreitamente ligado à globalização e intimamente conectado com o problema do desemprego. Os 600 migrantes actualmente encurralados em Ceuta, enquanto esperam pela resolução legal do seu estatuto residencial, um processo que pode demorar três anos – se não forem antes deportados – são, na maior parte, jovens que desejam e esperam ansiosamente por trabalho, e no entanto estão impedidos de o fazer. Forçados a abandonar as suas casas em resultado da violência e/ou do desemprego e/ou pobreza extrema, empreenderam uma longa e perigosa jornada para alcançar a Europa, em busca de trabalho e de uma vida melhor. Em vez disso, encontram-se confinados nas margens da sociedade Europeia, com a liberdade severamente limitada, incapazes de participarem, contribuírem, ou fazerem escolhas sobre o seu futuro. De facto, alguns destes jovens disseram-nos: “Não temos futuro” A solidariedade pede-nos que façamos tudo o que pudermos para lhes dar algo para alcançar.

A enorme dupla vedação, encimada por arame farpado, que divide a cidade de Ceuta do resto do continente Africano, é uma poderosa representação visual do medo que procura manter os que experimentam necessidades tão longe das nossas portas quanto possível. Sentimos todos um sentimento de responsabilidade partilhada por este muro – em parte financiado pela União Europeia. Deitámos abaixo o muro de Berlim há vinte anos e erigimos outros muros noutras partes.

Na praia de Algeciras, os representantes das Comissões Justiça e Paz, em conjunto com os representantes da igreja local e de comunidades mais vastas, partilharam um momento de oração por todos que perderam as suas vidas ao tentarem alcançar a Europa.

A exclusão social, o medo e a insegurança eram também evidentes na nossa visita ao Polígono Sur, que serviu para esclarecer as ligações entre pobreza e violência. Face aos problemas de violência da nossa sociedade é tentador retirarmo-nos atrás de muros, vedações cada vez mais altas e condomínios fechados. Contudo, esta solução não é viável a longo prazo. O que necessitamos é de uma resposta activa, fundada na solidariedade, que se dirija às causas profundas desta violência – desemprego, pobreza, exclusão social. A visita terminou com uma nota de esperança, quando vimos sinais de que tais medidas estão já a começar a tomar forma, através de um “plano de acção social participativo”, que começa a ser presentemente implementado, com a participação activa dos residentes.

A visita à Seville Acoje, a primeira organização estabelecida em Espanha para fornecer apoio aos migrantes e promover a sua integração na comunidade local, mostrou um poderoso exemplo de pessoas que vislumbraram as necessidades e estão a fazer tudo o que podem para as resolverem. Isto é conseguido através das redes e de trabalho social comprometido. O trabalho desta organização lembra-nos que a verdadeira solidariedade exige respeito pela diversidade cultural, em espírito de hospitalidade.

São muitos e complexos os problemas examinados no workshop internacional, requerendo soluções a curto prazo, para os que experimentam actualmente a pobreza, o desemprego e a exclusão, e a longo prazo, com vista à superação das causas estruturais. Tal implica o reconhecimento que não nos podemos distanciar dos problemas políticos, sociais e económicos dos países Africanos. Através desta experiência fomos também capazes de alargar a nossa compreensão sobre a verdadeira e efectiva solidariedade, incluindo as suas dimensões ética e espiritual, e a necessidade de um compromisso pessoal por parte dos que estão envolvidos no processo. Daí que a solidariedade possa vir a permitir transformar as fronteiras em lugares de encontro, onde nos seja possível reunir como irmãos e irmãs.

Desejamos concluir, agradecendo à Comissão Espanhola Justiça e Paz, a Sua Eminência o Cardeal Amigo de Sevilha, ao Bispo Antonio Ceballo de Cádiz e Ceuta, e a todos que nos receberam durante o workshop internacional, os quais recordaram a nossa responsabilidade Cristã para cuidar dos mais vulneráveis, a nível local, nacional e internacional, porque para a Igreja ninguém é estrangeiro.

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