Homilia de D. Manuel Pelino na vigília de oração na presença das Relíquias de Santa Margarida Maria

Santa Margarida Maria, Mensageira do coação de Jesus

1.O amor de Deus no coração humano de Jesus

A visita das relíquias de Santa Margarida Maria Alacoque entende-se no desempenho da missão confiada por Deus a esta religiosa francesa. Santa Margarida, através de experiências místicas admiráveis, foi escolhida por Deus para mensageira do amor do Coração de Jesus. Assim o reconhece a Igreja através do Seu Magistério. Nascida na Borgonha, cedo ficou órfã de Pai que era Juiz e Notário. Na sua orfandade sofreu muito com a indiferença de alguns familiares. Como ela própria relata na sua autobiografia, cultivou desde criança uma profunda devoção a Nossa Senhora e à presença de Jesus no Santíssimo Sacramento que ia visitar sempre que lho permitiam. À medida que crescia, sentia atracão pela vida consagrada. Numa doença grave, prometeu a Nossa Senhora que, se alcançasse a cura, se consagraria a Deus como religiosa. Fez a Primeira Comunhão aos nove anos e o Crisma aos vinte e dois. Preparou-se e viveu intensamente a espiritualidade do Sacramento do Espírito Santo. Nessa altura acrescentou ao nome Margarida o de Maria. Depois, apesar da resistência da Mãe e dos irmãos, entrou para o Convento da Visitação, fundado 60 anos antes por São Francisco de Sales que anunciava para as religiosas da sua fundação: "Terão o Coração de Jesus por morada e mansão neste mundo".

É interessante que alguns familiares de Margarida Maria, sabendo da vontade dela de se consagrar à vida religiosa, queriam-na encaminhar para um outro convento, mas ela, no interior do coração, sentia que o seu lugar era no convento de Santa Maria da Visitação. Uma vez, contemplando um quadro de São Francisco de Sales, ficou presa do olhar paternal e amoroso deste santo e começou a considerá-lo com um bom pai espiritual. Entrou no convento da Visitação em Paray-le-Monial, aos 24 anos. Desde a sua entrada, Margarida Maria ofereceu-se ao Coração de Jesus.

Na sua vida religiosa, quando estava em adoração diante do Santíssimo Sacramento, foi favorecida com visões extraordinárias da presença visível de Jesus. Estas experiências místicas repetiram-se ao longo de dois anos, na primeira sexta-feira de cada mês. Numa sexta-feira, oitava do Corpo de Deus, Jesus manifestou-se-lhe na imagem do coração trespassado e Margarida ouviu: "Eis o Coração que tanto tem amado os homens e que a nada se poupou até se gastar e consumir para testemunhar o seu amor".

Tendo contado, como era seu dever, à sua superiora as visões, encontrou incompreensão e provações que a fizeram sofrer muito. A direcção espiritual de um sacerdote Jesuíta, Padre de la Colombière, deu-lhe apoio e consolação. No último período da sua vida, sendo mestra de noviças teve a consolação de assistir à propagação da devoção ao Coração de Jesus.

Santa Margarida levou uma vida escondida, entregue ao amor de Deus, dedicada à oração e à adoração eucarística onde contemplou o Coração de Jesus ferido pelos pecados da humanidade e fonte de água viva que vivifica o mundo. Na sua humildade foi escolhida para ser mensageira do amor de Deus, traduzido na imagem do Coração de Jesus. O essencial da mensagem desta santa pertence à espiritualidade da Igreja que sempre se sentiu convidada a contemplar o coração de Cristo trespassado na cruz, donde brotou sangue e água, símbolo dos sacramentos que constituem a Igreja. No coração do Verbo Encarnado, Deus amou-nos com um coração humano. Só no amor de Deus o coração humano encontra a paz, a luz e a liberdade, como exclamava Santo Agostinho: "Fizeste-nos para Vós Senhor e o nosso coração anda inquieto enquanto não descansar em Vós".

2. Actualidade do Apostolado da Oração

A partir do convento de Paray-le-Monial propagou-se por toda Igreja a devoção ao Coração de Jesus. Da oração e da contemplação do mistério da eucaristia, vividas por Santa Margarida, brotou um movimento de apostolado que fez crescer em muitos corações o amor de Deus e desenvolver a espiritualidade cristã. A devoção ao Coração de Jesus produziu frutos que alimentaram a vida cristã de gerações de crentes, como a participação nos sacramentos da Eucaristia e da Penitência, sobretudo nas primeiras sextas-feiras. A visita das suas relíquias vem avivar e actualizar esta proposta de espiritualidade. Uma proposta muito necessária e actual para a nossa época e apoiada pelo Movimento do Apostolado da Oração, um movimento eclesial constantemente recomendado pela Igreja.

De facto, notamos na cultura actual um défice de espiritualidade. As pessoas cuidam muito dos aspectos exteriores, da aparência visível mas por dentro experimentam o vazio, a pobreza do coração. Ou porque põem de lado a vida espiritual, ou porque esta se desvirtua por correntes emocionais. A espiritualidade proposta pelo Apostolado da Oração é bíblica, eucarística, relacionada com a vida quotidiana e empenhada na missão. Orienta para o oferecimento das obras do dia fazendo da vida uma oferta unida à oferta de Cristo na cruz renovada na Eucaristia. Através da espiritualidade do oferecimento os cristãos participam assim na obra da redenção e na difusão do evangelho. Os elementos fundamentais pertencem, portanto, ao património da espiritualidade cristã e são bastante actuais. A passagem das relíquias é um incentivo a revitalizar este Movimento que foi um dos pilares mais sólidos da acção pastoral das nossas paróquias.

Diante das relíquias de Santa Margarida, peçamos a Deus, por sua intercessão, que nos ajude a aprofundar o amor do Salvador, a deixarmo-nos transformar por ele e a testemunhá-lo no mundo. Que a sua visita nos incentive também a redescobrir a importância e a reanimar nas nossas paróquias o Movimento do Apostolado da Oração.

Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém

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