Testamento vital: D. Manuel Clemente teme «limitação na defesa da vida humana»

Projecto lei é esta Quinta-feira discutido na Assembleia da República

A Assembleia da República discute esta Quinta-feira, o projecto de lei sobre o «testamento vital», um projecto apresentado pelo Partido Socialista.

Esta medida permite que qualquer pessoa deixe por escrito que tratamentos médicos quer ou não receber, se no futuro se vir incapacitada para o fazer.

Uma medida que "pode indiciar o respeito pela pessoa humana", mas que "deixa a pessoa e a equipa médica acorrentada a um momento", alerta D. Manuel Clemente.

"Em princípio, pode parecer de respeito pela decisão da pessoa. Mas um testamento é algo que fica escrito, no momento e corresponde a uma circunstância precisa", aponta o bispo do Porto. "Ficar acorrentado, a pessoa ou a equipa de médicos, a uma coisa que se escreveu em circunstâncias de vida, que podem corresponder a momentos de angustia ou desespero, é não respeitar a pessoa, mesmo que pareça um respeito ao que ela deixou escrito".

"A pessoa é mais do que aquilo que escreveu", sublinha à Agência ECCLESIA, indicando o dever de "atender ao bem maior da pessoa, onde há valores a defender e a promover".

D. Manuel Clemente reconhece que esta projecto "pode abrir a porta ao debate sobre a eutanásia". A Conferência Episcopal Portuguesa, na última reunião plenária em Abril, reflectiu sobre esta questão. Estava prevista a publicação de uma nota pastoral sobre a eutanásia que não se concretizou. Os bispos consideram o texto "uma boa base para um estudo aprofundado", que a CEP tornará público oportunamente.

Segundo D. Manuel Clemente as pessoas "passam por momentos de grande angustia, por momentos de «tudo ou nada». Tomar isso como absoluto, pode conduzir a um desinteresse no acompanhamento da pessoa, e isso perigoso".

A posição da CEP na defesa da vida é conhecida. "Já nos pronunciámos diversas vezes sobre a defesa da vida e a sua fase final". D. Manuel Clemente prefere aguardar para "perceber como esta questão é apresentada nos programas partidários".

Intitulado «Direitos dos doentes à informação e ao consentimento informado», o documento permite que, por exemplo em caso de doença terminal, a pessoa possa recusar a priori intervenções ou tratamentos. "Através da declaração antecipada de vontade, o declarante adulto e capaz, que se encontre em condições de plena informação e liberdade, pode determinar quais os cuidados de saúde que deseja ou não receber no futuro, no caso de, por qualquer causa, se encontrar incapaz de prestar o consentimento informado de forma autónoma", refere o diploma.

A declaração, obrigatoriamente feita por escrito, passa a ser um "elemento fundamental para apurar a vontade do doente", em situação de incapacidade de decisão autónoma. No entanto, esta situação encontra limites no grau de conhecimento que o "outorgante tinha do seu estado de saúde, da natureza da sua doença e da sua evolução" ou ainda do "rigor com que são descritos os métodos terapêuticos que se pretendem recusar ou aceitar".

O projecto define ainda os termos em que a declaração do doente não terá efeitos práticos. "O médico nunca respeita a declaração antecipada quando esta seja contrária à lei ou à ordem pública, quando determine uma intervenção contrária às normas técnicas da profissão, ou quando, devido à sua evidente desactualização em face do progresso dos meios terapêuticos, seja manifestamente presumível que o doente não desejaria manter a declaração".

Nos casos em que um médico não respeite a vontade expressa do doente, terá de fundamentar a decisão, registando-a no processo clínico. Os profissionais de saúde terão também "direito à objecção de consciência", caso em que os estabelecimentos de saúde devem "adoptar formas adequadas de cooperação com outros estabelecimentos", no sentido de garantir que a vontade do doente é respeitada.

Com Diário de Notícias

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