LUSOFONIAS – Ano Novo por terras de Malanje

Tony Neves, em  Malanje

Sair da Matola até ao aeroporto de Maputo parecia ser missão impossível, tal o caos instalado em Moçambique após publicação dos resultados das eleições. O país ficou a arder, com destruição de estruturas, estradas bloqueadas, muita pilhagem e bandidos à solta. A insegurança era tal que, no Seminário da Matola, passamos todas as noites despertos, vestidos e calçados, para eventual fuga, se necessário. Mas uma ligeira acalmia na manhã do dia 27 permitiu-me chegar ao aeroporto e viajar para Luanda, como estava previsto.

Angola é sempre a minha segunda casa, pois aqui vivi entre 1989 e 1994 e aqui volto todas as vezes que a agenda mandar ou permitir. Todos os pretextos são razões suficientes para passar alguns dias com este bom povo.

Comecei a visita com a participação, na União dos Escritores Angolanos, no lançamento da última obra de Cremilda de Lima. Seguiu-se a visita ao grande Bairro Rocha Pinto, um dos musseques mais populosos das periferias de Luanda. Ali está a Paróquia da Senhora da Paz, inaugurada a 1 de Janeiro de 2012, confiada aos Espiritanos. É enorme, com muito dinamismo missionário. Tem desafios sociais a que a paróquia também tenta responder, como percebi no encontro que tive com os muitos membros do Conselho Pastoral. Fui recebido por D. Filomeno Vieira Dias, Arcebispo de Luanda, no Paço Episcopal, a paredes meias com a Catedral e o Palácio do Presidente da República.

O domingo arrancou cedo, pois fui levado até ao Golungo Alto pelo P. Gaudêncio Sangando, Provincial dos Espiritanos. A viagem até ao novo aeroporto Agostinho Neto, em Viana, fez-se depressa pois era domingo, mas o trânsito é uma dor de cabeça constante para quem vive no centro de Luanda e tem de usar este novo aeroporto. Ali deixamos o P. Albert Assamba que foi fazer a visita às Lundas. Passamos por Catete, vimos o desvio para o Santuário da Senhora da Muxima e chegamos a Maria Teresa, o cruzamento das estradas que seguem para o Huambo e para Malanje. Decidimos ir para o Golungo pela estrada mais direta, mas os inúmeros e profundos buracos levaram-nos a um arrependimento sem remédio. Esta região, com floresta tropical luxuriante, foi área de café. Aliás – como explicou o P. Silva Ferreira, há seis décadas em Angola –  o Golungo foi a capital do café, em 1860 e teve uma grande fábrica de descasque, que funcionou até à independência e início da guerra civil. Lá vivem e trabalham os Espiritanos e as Irmãs Dominicanas. Encontrei o Conselho Paroquial que, numa prática sinodal antiga, reúne todos os meses. Também pudemos visitar a Escola Cónego Manuel das Neves. Esta terra deu gente grande a Angola, como o Cónego, os irmãos Pinto de Andrade e o Dr. Lopo de Nascimento, que foi primeiro-ministro. Nem por isso tem sido muito desenvolvida nem as estradas estão cuidadas.

Saímos do Golungo em direção a Ndalatando, passando por grandes filas de pessoas a caminho das suas lavras de cultivo. As terras são férteis, as chuvas frequentes e a paisagem verde. Passamos por muitas plantações de banana, mandioca, inhames e milho, base da alimentação do povo. Sim, a banana pão e o assipi (inhame) cozidos foram a delícia do meu pequeno almoço, acompanhado por mangas e papaias muito docinhas. Na viagem, já na estrada nacional que liga Luanda a Malanje, dei-me de caras com uma estrutura moderna, enorme, o Hospital Geral do Cuanza Norte, Mário Pinto de Andrade, inaugurado a 11 de Novembro. A viagem prosseguiu rumo a Kalandula, com uma passagem pelas Quedas, antes de entrar na Missão onde Espiritanos e Dominicanas do Rosário preparam com o povo os 75 anos da Missão. Visitamos a Escola estatal que recebeu o nome do P. Rocha.

A viagem prosseguiu rumo a Malanje, com paragem na Casa do Gaiato, onde encontrei o P. Fernando Fontoura. Malanje mostrou-se enorme e com muito trânsito, tornando-se difícil chegar à Missão, hoje Catedral. Visitei D. Luzizila Kyala, o Arcebispo e pude presidir na Sé à Missa de Ação de Graças pelo ano 2024. Foi às 19h do dia 31 e a enorme catedral estava à pinha, com muita gente no adro. A Missa, dançada e cantada em português e kimbundu, durou duas horas de emocionante e festiva celebração.

Terminada a Missa, houve jantar na Missão a que, no fim,  se juntaram os três Padres do Seminário Espiritano para festejar a ‘Virada’ que fez Malanje sair à rua e participar na festa e ver o fogo de artifício à meia noite. O Dia Mundial da Paz foi dedicado ao Seminário Espiritano que acolhe 21 jovens.

Sem grande tempo para respirar, a visita continua com muita alegria. Prometo dar conta de quanto vou viver e partilhar.

Tony Neves, em  Malanje

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