Madalena Abreu, Diocese de Coimbra
O encerramento do Sínodo sobre a sinodalidade despertou reações diversas!
Enquanto alguns expressaram desapontamento e foram encolhendo os ombros com enfado, outros reagiram até com ceticismo. Outros ainda bateram palmas a todo o processo e a este final que aponta uma nova forma de ser Igreja. Mas, como entender este momento? Será este o início de uma transformação profunda ou apenas mais um capítulo de debates internos?
Para Cristina Inogés, teóloga, escritora e uma das 54 mulheres com direito a voto na Assembleia Sinodal, este é um tempo sem precedentes, com implicações que ultrapassam os muros da Igreja. Sendo a primeira leiga a discursar na abertura de um sínodo, Inogés afirma que este foi e é um convite para renovar a própria essência da Igreja. Na sua opinião o coração da sinodalidade define o pontificado do Papa Francisco. E sublinha também que a sinodalidade não é um evento isolado, mas um processo contínuo que exige paciência, conversão e coragem.
E é neste ‘método de trabalho em igreja’ que Francisco propõe com chave uma comunhão na diversidade, uma igreja que celebra as diferenças sem comprometer a unidade. O Papa sorri a um mundo plural, e declara que a Igreja precisa abraçar a inclusão como força transformadora.
O documento final do Sínodo, agora integrado ao magistério eclesial, destaca a necessidade de traduzir ideias em práticas concretas, abordando temas como o combate ao clericalismo, a ampliação do papel dos leigos, o protagonismo dos jovens e a valorização das mulheres. É também sublinhado que a implementação destas mudanças exige compromisso, transparência e confiança em todos os níveis da comunidade eclesial.
Claro que estas mudanças surgem como ameaças aos olhos de muitos católicos. Estas propostas e a forma como podem ir sendo apresentas de vividas não têm um caminho fácil. Por isso, Inogés reforça que essas transformações deverão ser encaradas como como gestos de confiança mútua. E defende uma atitude de escuta, uma cultira de renovação. Nas sua próprias palavras : “Primeiro teremos que nos querer mais, e depois nos acreditar mais uns nos outros”. E aponta casos concretos em Espanha, onde a sinodalidade é realidade há já mais de uma década.
No mesmo espírito, o teólogo checo Tomás Halík, em visita a Portugal, apresenta uma visão complementar no seu novo livro, O sonho de uma nova manhã. Cartas ao Papa. Halík enfatiza que a Igreja do futuro deve ser acolhedora e dialogante, indo ao encontro dos “buscadores espirituais”, aqueles que se afastaram das estruturas institucionais, mas continuam sedentos por respostas espirituais. Halík argumenta que a espiritualidade pessoal deve ocupar o centro da vivência cristã. Denuncia a necessidade de superar a dependência exclusiva de estruturas e rituais, cultivando a fé como uma experiência viva e pessoal. Esta abordagem, segundo ele, será essencial para uma Igreja que busca não apenas manter a sua relevância, mas também está em marcha para se adaptar às rápidas mudanças culturais.
Ambos os pensadores convergem na ideia de que a sinodalidade e a espiritualidade são complementares e fundamentais para a renovação e missão da Igreja. A sinodalidade oferece o caminho de comunhão e participação, enquanto a espiritualidade é a força interior que sustenta essa caminhada.
A Igreja está diante de uma encruzilhada histórica: transforma-se numa comunidade verdadeiramente aberta, inclusiva e missionária, ou corre o risco de perder sua conexão relação com um mundo em constante mudança. Como destaca Cristina Inogés, “agora é o momento de aplicarmos tudo o que refletimos. Vamo-nos sujar, colocar as mãos na massa e abraçar este processo com entusiasmo.”
Em tempos de crises globais e profundas incertezas, a sinodalidade e a espiritualidade oferecem esperança. É a paciência e a coragem para atravessar as “noites escuras” da alma, como descreve Halík, que permitirão à Igreja ser, novamente, um farol de renovação e confiança para o mundo.
O desafio está lançado: será a Igreja capaz de abraçar este novo capítulo e viver plenamente a sua missão como mãe e irmã de toda a humanidade? A resposta virá com passos concretos, sustentados pela coragem de ser uma Igreja que acompanha e se transforma.
E estamos no advento. Para os católicos, comunidade da qual faço parte, é o tempo favorável da esperança. A resposta já está a ser dada.