«Não podemos ter medo do todos, todos, todos», assinala bispo de Setúbal
Octávio Carmo, enviado da Agência ECCLESIA ao Vaticano
Cidade do Vaticano, 30 out 2024 (Ecclesia) – O cardeal D. Américo Aguiar elogiou hoje, no Vaticano, a nova “metodologia” promovida pelo processo sinodal lançado pelo Papa, destacando que as mudanças passam, agora, pelo compromisso de cada comunidade, com a participação de todos.
“Esta metodologia permite que olhemos para os desafios e para as prioridades da Igreja de uma maneira diferente, ou seja, temos de ter consciência que alguém tem de ter a última palavra, mas essa última palavra não tem de ser a única palavra”, indicou o bispo de Setúbal, em declarações à Agência ECCLESIA.
“Isto é muito importante desde o Conselho Paroquial de Assuntos Económicos, o Conselho Pastoral Paroquial, o Conselho de Pastoral, todos os níveis de decisão, e temos também de fazer caminho nisso”, acrescentou o responsável português.
A segunda sessão desta assembleia decorreu entre 2 e 27 de outubro, com o tema ‘Por uma Igreja sinodal: participação, comunhão, missão’, na sequência de um processo que começou com a auscultação de milhões de pessoas, pelas comunidades católicas, em 2021; a primeira sessão decorreu em outubro de 2023.
Francisco promulgou documento final, enviando-o às comunidades católicas, sem publicação de exortação pós-sinodal – algo que acontece pela primeira vez, mas que corresponde à possibilidade prevista na constituição apostólica ‘Episcopalis communio’ (2018), do atual Papa, sobre o Sínodo dos Bispos.
“O documento final tem muitas portas e muitas janelas abertas, entreabertas e fechadas, e agora é o aggiornamento de João XXIII [Papa que convocou o Concílio Vaticano II, ndr], cada um, na sua Igreja, na sua diocese, na sua paróquia, na sua comunidade, no seu movimento, os influencers digitais, os missionários digitais: todos têm a obrigação de abrir, de escancarar as portas e as janelas com a metodologia que o Sínodo nos ofereceu, da conversação no Espírito”, assinalou o cardeal D. Américo Aguiar.
O bispo de Setúbal participou na segunda sessão da Assembleia Sinodal por nomeação do Papa Francisco e fala de uma experiência de transformação, nas mais de três semanas de trabalho: “Cada um entrou ‘eu’, com o próprio ego, e saímos ‘nós’ desta experiência e desta metodologia sinodal”.
Ao longo dos trabalhos sinodais, houve várias referências à JMJ Lisboa 2023, em particular ao apelo do Papa em favor de uma Igreja com lugar para todos.
“Não podemos ter medo do todos, todos, todos”, observou D. Américo Aguiar, assinalando que persiste, nalguns setores, “uma reação de medo, de espanto, de preocupação”.
“Pelo contrário, não nos podemos esquecer de que o anúncio do Evangelho é para todos, todos, todos”, insistiu.
Apontando ao futuro, o cardeal português sublinha que a sinodalidade, mais do que uma Assembleia que se concluiu no último domingo, é “um processo e um modo” de ser Igreja.
“Quanto mais ouvir, quanto mais integrar, quanto mais for capaz de escutar, mais as minhas decisões serão acertadas”, assume o bispo de Setúbal.
Regresso como um ‘inter pares’, naquilo que significam as dificuldades, os problemas e as possibilidades de resposta, é assim mesmo que tem de ser. O documento final abre muitíssimas possibilidades, em muitíssimas frentes, agora, é preciso que queiramos fazer”.
O membro da Assembleia Sinodal fala num resultado “muito positivo”, valorizando o facto de o Papa ter dispensado a redação de uma exortação apostólica, após a publicação do documento final.
“Uma das riquezas do documento é que está aberto e, portanto, cada diocese pode tomar um caminho; a comunidade, o instituto, a congregação, os leigos, organizados de maneiras diversas, há muitas possibilidades de concretizar aquilo que o documento apresenta”, indica.
O responsável adianta que, na Diocese de Setúbal, os trabalhos vão ser iniciados “imediatamente”, com a ajuda da Comissão Sinodal que acompanhou a fase de escuta.
D. Américo Aguiar convida a valorizar a dimensão espiritual deste processo, sugerindo que a receção da Assembleia Sinodal passe “por um momento de oração” que abra caminho à “conversação no Espírito”.
O Sínodo dos Bispos, instituído por São Paulo VI em 1965, pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.
OC
No Vaticano, D. Américo está a participar desde segunda-feira na Assembleia Plenária do Dicastério para a Comunicação, como membro deste organismo da Santa Sé.
Os trabalhos, com o tema ‘Por uma comunicação constitutivamente sinodal’, terminam esta quinta-feira com uma audiência concedida pelo Papa e abordam ainda os desafios da inteligência artificial. “Nunca, como hoje, as tecnologias e a comunicação proporcionaram tanta proximidade de todos, mas nunca como hoje, ao fim do dia, as pessoas se sentiram tão sós”, lamenta o bispo de Setúbal. O cardeal português recorda a nova encíclica do Papa, ‘Amou-nos’ (Dilexit nos), sobre a devoção ao Coração de Jesus, em que Francisco aborda este tema. “A inteligência artificial pode fazer tudo, está a fazer tudo, está a proporcionar avanços magníficos, nomeadamente na medicina e em tantos outros campos, mas não ama, mas não ama, e aí está o nosso foco: nesta capacidade de nos conhecermos, de nos amarmos, de nos respeitarmos, de caminharmos juntos, todos, todos, todos”, conclui. Participam nesta assembleia, para além dos responsáveis do Dicastério para a Comunicação, os seus 20 membros, incluindo também D. Nuno Brás, bispo do Funchal, e 20 consultores, especialistas, religiosos e leigos de todo o mundo. |