Padre Miguel Lopes Neto, Diocese do Algarve
A mensagem central do cristianismo é de amor, compaixão e acolhimento ao próximo. Jesus Cristo, nos seus ensinamentos, enfatizou a importância de cuidar dos necessitados, dos marginalizados e dos estrangeiros. No Evangelho de Mateus 25:35-36, Ele diz: “Porque tive fome, e me destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era estrangeiro, e me acolhestes; estava nu, e me vestistes; adoeci, e me visitastes; estive na prisão, e fostes ver-me.” Esta passagem bíblica sublinha a obrigação moral dos cristãos em ajudar e acolher aqueles que estão em situação de vulnerabilidade, incluindo os imigrantes.
No entanto, observa-se um contraste crescente entre os ensinamentos da doutrina e a postura de alguns crentes contemporâneos, em relação aos imigrantes. Esse paradoxo pode ser explicado por fatores sociopolíticos, económicos e culturais, que influenciam a opinião pública e as políticas de imigração. A preocupação com a segurança, o impacto financeiro e a preservação da identidade nacional são frequentemente citados como razões para a resistência ao acolhimento de imigrantes.
A mim, surpreende-me, sobretudo, que haja a perceção de sentido de insegurança, associado a uma maior imigração. Quem deve sentir-se inseguro não são os residentes e naturais de Portugal, mas os imigrantes. São esses que são atacados nas suas residências, onde tantas vezes são altamente explorados, com altíssimos preços de aluguer e que, por isso, habitam essas casas em condições desumanas. Também são vítimas de xenofobia e racismo, só porque tiveram o azar de nascer no Nepal, Paquistão, India, etc. Estas atitudes obscurecem a responsabilidade cristã de acolher o próximo e, muitas vezes, são elas que fomentam as reações violentas por parte destes grupos populacionais: se me perseguem, tenho de me defender; se me injuriam, respondo na mesma moeda; se não aceitam a minha cultura, não aceito a deles e também os passo a tratar usando comportamentos racistas e xenófobos. O mal atrai o mal e o bem atrai o bem.
A perspetiva cristã de acolhimento pode e deve ser conciliada com a sustentabilidade da segurança social. Os imigrantes, muitas vezes vistos como um fardo económico, na verdade, podem contribuir significativamente para a economia e a sustentabilidade dos sistemas de segurança social. Em muitos países, a população está a envelhecer (é o caso de Portugal), havendo uma menor proporção de trabalhadores ativos em relação aos aposentados. Isso coloca uma pressão crescente sobre os sistemas de segurança social, que dependem das contribuições dos trabalhadores ativos para sustentar as pensões e os serviços sociais.
Os imigrantes, especialmente os jovens, podem ajudar a equilibrar essa equação demográfica. Ao ingressarem no mercado de trabalho, eles contribuem com impostos e para a segurança social, ajudando a financiar os serviços públicos e as reformas. Estudos mostram que, em muitos casos, os imigrantes são mais propensos a ocupar empregos que são menos desejados pelos trabalhadores locais, preenchendo lacunas importantes na força de trabalho e impulsionando a economia. Além disso, a diversidade trazida pelos imigrantes pode fomentar a inovação e a criatividade, beneficiando a sociedade como um todo.
Do ponto de vista cristão, acolher os imigrantes não é apenas um ato de compaixão, mas também uma forma de contribuir para o bem comum. A resistência ao acolhimento de imigrantes pode ser vista como uma falha em viver de acordo com os princípios fundamentais do cristianismo. Ser cristão implica reconhecer a dignidade e o valor de cada ser humano, independentemente de sua origem. Isso inclui trabalhar para criar uma sociedade mais justa e inclusiva, onde todos têm a oportunidade de prosperar.
Portanto, é possível ser cristão e apoiar o acolhimento destas pessoas, vendo-os não como uma ameaça, mas como uma oportunidade para fortalecer a comunidade e promover a sustentabilidade. Os cristãos são chamados a ser exemplos de amor e hospitalidade, refletindo os ensinamentos de Jesus em suas ações e atitudes. Ao fazer isso, não apenas cumprem seu dever religioso, mas também contribuem para uma sociedade mais coesa, equitativa e sustentável. Ao abraçar essa responsabilidade, os cristãos podem honrar sua fé e ajudar a construir um futuro melhor para todos.