Fátima: Igreja circular, elemento linear e interacção com outros artistas

À conversa com… Alexandros Tombazis, Arquitecto grego ortodoxo e projectista da Igreja da Santíssima Trindade Voz Portucalense (VP) – Como se deu o início deste projecto? E como ganhou a decisão de lhe ser entregue a obra desta Igreja única em Portugal? Alexandros Tombazis (AT) – Fui pré-seleccionado, entre outros arquitectos, para um concurso internacional que o Santuário organizou em 1997 e tive a sorte de ganhar o concurso para o projecto do edifício. Uma das condições do concurso era, no caso de ser ganho por um arquitecto estrangeiro, ter a colaboração de arquitectos e engenheiros portugueses. Quando fomos escolhidos, colaborámos com a Paula Santos, arquitecta do Porto, e muitos engenheiros portugueses. No meu escritório, os meus principais colaboradores foram Stavros Gyftopoulos e Sophia Paraskevopoulou. VP – O que é que recorda de modo especial nestes 3 anos de árduo trabalho e construção? De que forma descreve este projecto, comparando com outros que tem? AT – Na verdade foram cerca de dez anos e não três desde o concurso. Foi um projecto muito interessante e um grande desafio. Conheci pessoas maravilhosas que se tornaram amigos. É muito recompensador trabalhar com pessoas dedicadas. VP – Antes desta missão, já conhecia Portugal? Despendeu muito tempo em Fátima, deixando a Grécia por longos períodos? AT – Sim. Já tinha estado em Portugal várias vezes antes do concurso e tinha já executado, após um outro concurso, um edifício em Vila do Conde. Nestes 10 anos de envolvimento com o projecto da nova igreja vim a Portugal entre 60 e 80 vezes, não me recordo exactamente. VP – Pode explicar-nos as razões e ideias da concepção da Igreja da Santíssima Trindade? No que toca à localização, nome, condições, tamanho, luz natural, aspectos cristológicos e teológicos e muito mais… AT – A igreja está situada no espaço do Recinto interrompendo a vista entre a Basílica e o Centro Pastoral Paulo VI. O princípio que esteve na base do projecto foi uma aproximação cuidada ao lugar e à interacção da nova igreja com os restantes edifícios. Geometricamente há a considerar duas formas base que dominam toda a arquitectura; um círculo e um elemento linear que o intersecta. O círculo permite uma maior fluidez das pessoas à volta da igreja. Além disso permite que um maior número de pessoas esteja próximo do Altar, como nos teatros antigos. Finalmente, numa forma circular todos podem ter noção do espaço interior e sentir-se membros de uma mesma assembleia. A luz natural é de uma importância vital. A cobertura foi desenhada com todo o cuidado procurando criar um ambiente tranquilo que conservasse energia tornando-se assim um edifício sustentável. A cobertura é intersectada por duas vigas que criam um eixo central e que crescem em altura à medida que se aproximam do altar contrariando a ligeira pendente do pavimento interior. A luz natural entre ambas é fundamentalmente de Sul acentuando o trajecto da procissão desde a entrada da igreja até ao altar. Lateralmente, uma estrutura metálica em “shed” liberta o espaço interior de quaisquer pilares e permite o uso da luz natural. O controlo das lamelas existentes nas janelas nestes elementos metálicos é feito automaticamente permitindo a criação de diferentes cenários de acordo com os ambientes pretendidos: mais festivos, mais suaves, mais acentuados, mais sombrios, etc. A Igreja tem 33.000m2 e pode também ser usada para Assembleias. Pode, aliás, ser dividida em duas partes: numa pode estar um pequeno grupo para cerca de 3.000 pessoas ou pode preencher-se a sua capacidade máxima de 9.000 pessoas. VP – Fátima é um Santuário Internacional. Foi propositado o plano de ter algumas partes e objectos da Igreja, dentro e fora, por mão de artistas de outros países? AT – Sim, foi uma forte intenção do Santuário e do Reitor de envolver no projecto artistas de diferentes países procurando salientar o ecumenismo do espaço. Estou muito grato ao senhor Reitor por me ter permitido propor diferentes artistas. VP – Porquê estes artistas e não outros? Há alguma razão especial por existir um só artista fora da Europa (do Canadá)? AT – Muito provavelmente haverá, no futuro, mais artistas de outros países, como também fora da Europa. VP – Acredita que o espaço da nova igreja será suficiente para acolher tantos fiéis, pelo menos nas maiores Peregrinações anuais? AT – Como mencionei anteriormente, a nova igreja tem capacidade para cerca de 9000 lugares sentados e a intenção é que seja utilizada sobretudo quando as condições atmosféricas forem más. Para as grandes peregrinações o espaço do Recinto será sempre usado. VP – Que peça de arte mais aprecia na Igreja da Santíssima Trindade? Realmente gosta da nova Cruz Alta? O que lhe parece? AT – Julgo que o trabalho dos diferentes artistas é de grande qualidade, incluindo as duas cruzes: a que está sobre o altar, da escultora irlandesa Catherine Greene, bem como a do exterior, do escultor alemão Robert Shad. Na minha opinião são ambas importantes obras de arte. VP – Na Comunicação Social têm-se ouvido e/ou lido números diferentes do custo total deste projecto. Pode esclarecer-nos sobre o valor exacto? AT – Infelizmente não lhe posso dizer o custo exacto do projecto, uma vez que este aspecto tem sido tratado pela FASE, que é a responsável pela fiscalização e gestão do empreendimento. Mas acredito que se situe nos 45 milhões de euros. VP – Fale-nos um pouco, por favor, dos seus outros grandes projectos que tem não somente na Grécia, mas também no Chipre, na Noruega, na Ásia, etc… AT – Tenho tido a sorte de, ao longo dos últimos 40 anos, ter estado envolvido com outros colegas do escritório em inúmeros projectos em diferentes países, muitos resultado de concursos. Poderia mencionar algumas casas, museus, universidades, edifícios de habitação, escritórios, centros culturais, uma mesquita entre outros… Para mim a Arquitectura é muito mais que uma simples profissão. É uma preocupação que toma o nosso corpo e alma. Quando uma pessoa se apaixona pelo seu trabalho, a arquitectura é altamente recompensadora, mas com isto não me refiro ao dinheiro! VP – Que avaliação e impressão tem do mais famoso Arquitecto português da actualidade, Álvaro Siza Vieira? AT – Eu convidei o Arq. Álvaro Siza para desenhar um painel de azulejos com 150m de comprimento, narrando as vidas de S. Pedro e S. Paulo. Ele fez um trabalho maravilhoso. É um grande artista, um verdadeiro e grande arquitecto e, além disso, é modesto e sem arrogância, como infelizmente muitos de nós não somos. Julgo que ele deu uma belíssima contribuição para o projecto e eu estou muito grato por tê-lo conhecido.

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top