Reitora da UCP destacou importância da Encíclica «Fratelli Tutti», «poderoso documento de evangelização, tratado de política e grande ensaio de teoria cultural»
Lisboa, 14 out 2022 (Ecclesia) – A reitora da Universidade Católica Portuguesa (UCP afirmou hoje que neste “tempo do conflito” falar de fraternidade “é um gesto contracorrente”, exemplificando com vários conflitos e crises migratórias.
“Não falo apenas da escalada bélica na guerra da Ucrânia, mas também daquilo que se passa nas outras zonas quentes do globo: Da Somália à Etiópia, no Médio Oriente, no Afeganistão, as tensões no sudeste asiático, no mar do sul da China, sem esquecer nunca a América Latina”, referiu Isabel Capeloa Gil, numa intervenção em vídeo, no Congresso Missionário 2022.
A reitora da Universidade Católica Portuguesa (UCP) afirmou que “no tempo do conflito” que se vive “falar de fraternidade é um gesto contracorrente”, e, para além da guerra, as sociedades são polarizadas, “minadas pelo dissenso radical”, oriundo também de um aprofundar das desigualdades e de “uma radicalização do discurso público”, que leva a uma “tribalização social”.
‘Fraternidade Sem Fronteiras’ é o tema do Congresso Missionário 2022 que começou esta manhã e termina no sábado, decorrendo no auditório Cardeal Medeiros, da UCP, em Lisboa.
Na segunda conferência do dia, intitulada ‘A Fraternidade na Cultura do Diálogo’, Isabel Capeloa Gil explicou que, no contexto de guerra cultural, a Encíclica ‘Fratelli Tutti’ (2020) gdo Papa Francisco, sobre a fraternidade e a amizade social, é “um poderoso documento de evangelização”, e também “um tratado de política e um grande ensaio de teoria cultural”.
A encíclica Fratelli Tutti’, referiu a professora catedrática de Estudos de Cultura, debate com “perspicácia a questão da identidade”, uma das chaves interpretativas para a qual a parábola do Bom Samaritano convoca, porque interpela à identificação com as personagens, demonstrando que o gesto cristão é o de sair.
A relação entre o homem ferido e o samaritano, esse outro da cultura judaica, assenta no entendimento de que a identidade não pode ser uma estratégia de criação de fronteiras, de muros entre um grupo de indivíduos, uma comunidade e todos os outros; A parábola mostra-nos essa exigência de respeito pelo outro”.
Para a presidente da Federação Internacional de Universidades Católicas (FIUC) discutir a fraternidade num tempo de “crescente desumanidade” decorre de dois princípios, da “natureza ético antropológica”, que funda o gesto de cuidar na corresponsabilização, e “cuidar significa reconhecer na diferença antropológica que os outros representam uma mesma identidade”, e de “ordem estético antropológico”, que reside na afirmação do gesto estético como manifestação da dignidade.
A reitora da UCP realça que, muitas vezes, a forma como os outros são representados, nomeadamente os migrantes e refugiados, nos media socias, nos jornais, mas também em modelos e formas artísticas, passam por “uma negação da verdadeira humanidade do outro”.
“Quando se cria numa determinada sociedade a imagem de que alguém que etnicamente diferente é uma potencial ameaça à segurança do país, quando alguém que pratica uma religião diferente é uma ameaça ao nosso ethos”, prosseguiu.
Os migrantes e refugiados são “um desafio para os nacionalismos europeus”, e, na Europa, “o discurso social, cultural, e político” sobre a figura do migrante normalmente enquadra-se em duas narrativas distintas, a da necessidade e da emergência, “chegam por necessidades vitais”, e a da segurança, “podem constituir uma ameaça à segurança nacional dos países”.
Segundo Isabel Capeloa Gil, em ‘A Fraternidade na Cultura do Diálogo’, para o Papa Francisco existe outra narrativa, que é a “do cuidado em torno de um objetivo de ação, a amizade social”.
CB/OC