D. Manuel Martins deixou críticas à flexisegurança, um dia após a cerimónia que assinalava o Dia de Portugal, onde o Bispo Emérito de Setúbal foi agraciado pelo Presidente da República. Falando sobre “a situação do trabalho em Portugal é disso exemplo”, este reponsável disse à Agência ECCLESIA que a Igreja tem de pronunciar-se “mas de forma a ser ouvida, não é com papeis ou documentos”, de modo a que “o desenvolvimento seja acompanhado de solidariedade e manifeste a preocupação de considerar o homem como elemento responsável na construção da história”. A situação actual do país “merece uma atenção tão grande que nos devíamos pronunciar de uma forma mais visível”. O trabalho, a economia “assente numa filosofia neo-liberal”, a flexisegurança “considera cada vez menos o homem”, conferindo-lhe uma posição “exclusiva de produtor” e acrescente ser “repugnante ouvir falar em flexisegurança e na mobilidade, quando sabemos que o essencial não é garantido”. Na semana passada, Alfredo Bruto da Costa defendeu que a flexisegurança é “um documento do mais puro neo-liberalismo”. O presidente do Conselho Económico e Social foi o convidado do programa “Diga Lá, Excelência”, da Renascença e do jornal “Público”, onde deixou criticas ao documento defendido pela Comissão Europeia. Na sua opinião, o modelo de flexisegurança caminha para “garantir a flexibilidade e quase nada para garantir a segurança”. Bruto da Costa lembra que, no nosso país, 40% das pessoas em situação de pobreza estão empregados ou trabalham por conta própria, o que – diz – leva a concluir que a pobreza é um problema de política económica e não (apenas) de redistribuição da riqueza. Por outro lado, acrescenta que, segundo o estudo sobre a pobreza, que está ainda a ser feito, a maioria dos pobres são famílias tradicionais e que os desempregados representam apenas 3% dos pobres. Para o futuro, Bruto da Costa defende que a segurança social tem que ser financiada não apenas pelos rendimentos do trabalho mas também pelos rendimentos do capital. CNJP A Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) defende que o conceito de flexisegurança deve ser apreciado com cautela e que a sua aplicação no nosso país deve ter em conta as suas particulares características institucionais, sociais e económicas. “No caso português, existem fortes condicionantes a uma aplicação do conceito de flexisegurança, já que o Estado e o sistema de segurança social continuam a enfrentar graves restrições financeiras”, alerta a Comissão, lembrando ainda que “a actividade económica não tem apresentado potencial para um ritmo crescente e suficiente de criação de emprego” e que há baixos níveis de qualificação de grande parte dos trabalhadores. Num documento intitulado ” Um contributo para o Livro Branco das Relações Laborais”, divulgado em Maio passado, a CNJP lembra “a existência de limites à aplicação das várias vertentes da ‘flexibilidade’ impostos pelo respeito da dignidade humana”. Por outro lado, assinala este organismo católico, “não é pertinente falar de ‘flexibilidade’ sem a conjugar com ‘segurança’ através de, nomeadamente, prestações sociais adequadas, politicas activas do mercado de trabalho eficientes, que apoiem de forma eficaz as transições de estatuto profissional e assentem na antecipação e gestão rápida da mudança”. Para a CNJP, em toda esta problemática deve ser tida, devidamente, em conta o papel e a opinião dos parceiros sociais. A Comissão quis participar na discussão pública deste tema e “vir expressar a sua opinião, à luz da Doutrina Social da Igreja, acerca de uma matéria que incide directamente sobre a dignidade da pessoa humana”. O documento assinala a importância do “direito do trabalho, numa perspectiva universal de defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores e de dignidade do trabalho”, “o papel central da negociação colectiva”, “as novas exigências do mundo do trabalho” e “as deslocalizações”. A CNJP critica os que defendem a “necessidade de se eliminar o princípio constitucional português da proibição dos despedimentos sem justa causa”. “Mais do que por respeito a uma norma constitucional, é por respeito à dignidade do trabalho e à dignidade humana que consideramos inaceitável despedir um trabalhador sem ter que se apresentar razões justificativas ou motivos baseados em critérios de justiça”, aponta o documento. A quem lamenta a “rigidez da legislação de trabalho”, considerando que a mesma “dificulta o investimento estrangeiro”, a CNJP responde que “a conflitualidade social resultante de situações sentidas como injustas e que não respeitem a equidade no tratamento dos trabalhadores poderá ocasionar um ambiente social que também não é certamente atractivo”. “A modernização do direito do trabalho poderá ser alargada à questão da flexisegurança, desde que a introdução da mesma seja tratada num clima de franco diálogo social, isto é, as condições da sua implantação sejam negociadas, caso a caso, pois dessa forma poder-se-á evitar maior conflitualidade social”, defende a CNJP.