José Augusto Mourão, Sophia de Mello Breyner Andresson, Adélia Prado ou Bob Dylan são algumas moradas onde o padre Miguel Vasconcelos confirma uma intertextualidade existente, locais onde lê Deus. No caminho espiritual que foi fazendo, o estudo da Teologia, deu ao padre Miguel, palavras para dizer Deus, se dizer a si próprio e a realidade que o rodeia, mas, de forma honesta, diz não ter a certeza de ser Deus a falar-lhe. Nesta conversa, o sacerdote ordenado em 2017, recorda as relações que o fizeram querer “viver o risco da fé” e percebe o “tesouro” e a “terra sagrada” que lhe é confiado por ser padre, por ajudar a fazer da Igreja um lugar onde tudo o que de mais profundo uma pessoa é, “possa ser dito, escutado e acolhido”.
«As pessoas confiam nos padres, não porque sou eu, mas porque sou padre e isso é uma distinção importante, que me dá serenidade. Essa confiança dá acesso ao que as pessoas são de mais íntimo. Estamos diante de algo precioso, é um tesouro na vida da Igreja: há um lugar para que aquilo que sou de mais profundo possa ser dito, escutado e acolhido. O acesso privilegiado ao coração das pessoas é perigoso porque qualquer passo em falso ou falta de tato, pode ferir e essa vulnerabilidade precisa ser tratada como terra sagrada. E eu preciso de repetir isso todos os dias. Eu sou uma pessoa como as outras, tenho fragilidades, e reconhecer que não estou em meu nome, é fundamental»
«A experiência da fé não tem nada de seguro ou fixo e quando tem, provavelmente estamos a domesticar a experiência do Evangelho. Quando lemos os Evangelhos não há nada que desinstale mais, que tire mais o chão, que nos dê menos conforto. Quando estou muito confortável com a fé, estou mal, estou instalado e precioso do Espírito santo para desarrumar a casa»
«As nossas palavras são sempre curtas, a nossa capacidade de formular é frágil e contar com dois mil anos de gente à procura das palavras certas e da melhor forma de dizer o mistério que experimentamos, é extraordinário»
«Nós somos todos a mesma coisa, feitos da mesma massa. Sempre que há uma procura honesta da verdade, da beleza e da bondade, eu posso não dar esse nome, mas estou a caminho de Deus. E se Deus me der essa graça, hei-de encontra-lo e dar-lhe um nome. Se a minha vida de padre poder servir isso, fico muito feliz».