O alcance da questão do desenvolvimento

Um olhar de Jean-Yves Calvez Os 40 anos da encíclica Populorum Progressio trouxeram à Igreja e ao mundo uma nova perspectiva sobre a questão do desenvolvimento. A convicção é do especialista francês Jean-Yves Calvez, SJ. “A novidade com o Concílio Vaticano II (Gaudium et Spes) e, sobretudo, com a Populorum Progressio foi que o desenvolvimento foi compreendido como um processo universal, uma dimensão fundamental”, referiu, de passagem por Lisboa. Para a Igreja, a questão maior não era, evidentemente, uma questão de teoria simplesmente económica, mas sim a dispa-ridade da injustiça, da flagrante desigualdade, quanto ao desenvolvimento. Essa desigualdade correspondia, na época, à que antes se verificava entre povos colonizadores e povos colonizados. “Com a Populorum Progressio, é verdade, a Igreja dava ao termo desenvolvimento um alcance antropológico e teológico, não simplesmente económico, como também já tinha dado ao trabalho um alcance teológico”, disse Yves Calvez. A encíclica de 1967 ocupa-se, por isso, das medidas a tomar para fazer crescer a produção e para bem a distribuir, enquadrando essas preocupações “no desenrolar do destino humano e do destino dos povos, assim como na evolução dos sistemas sociais”. Num momento de grande choque cultural, a Igreja esforçava-se por ajudar a transpor esta etapa tão delicada. Paulo VI alertava que “a insurreição revolucionária (…) cria novas injustiças, introduz novos desequilíbrios e provoca novas ruínas”. Um outro alerta que ganha, a cada dia, um significado maior tinha a ver com a livre troca nas relações internacionais: “Quando as condições são demasiado desiguais de país para país, os preços que se criam livremente no mercado podem trazer resultados iníquos”. Para Jean-Yves Calvez, esta é “a frase mais nítida” do magistério sobre este problema. Paulo VI falava, por outro lado, da questão da dívida dos países em via de desenvolvimento, muito antes deste ser um problema que interessasse, verdadeiramente, a opinião pública internacional. As consequências de um desenvolvimento “desordenado” eram a perda de fundos e a resposta “irreflectida” das fortes finanças estrangeiras, esmagando os mais pobres. Segundo Jean-Yves Calvez, o grande receio deste Papa era o de um “desenvolvimento unilateral, destruidor ou desconstrutor das culturas, dos homens, das almas. Daí o famoso tema do “desenvolvimento integral”, presente em toda a encíclica. “Não aceitamos que se separe o económico do humano, ou o desenvolvimento das civilizações em que ele se insere. O que conta para nós é o homem, cada homem, cada grupo de homens, até à humanidade inteira”, escrevia em 1961 o padre Lebret, citado por Paulo VI. Uma das passagens mais citadas da encíclica, “o desenvolvimento é o novo nome da paz”, ilustra a preocupação de Paulo VI com a necessidade de um desenvolvimento “integral”, que diminuísse o fosso entre os mais ricos e os mais pobres. O especialista francês deixou claro que, para este Papa, o desenvolvimento “é a passagem, para cada um e para todos, de condições menos humanas para condições mais humanas”. O avanço do liberalismo radical e as crescentes desigualdades continuam a desafiar, hoje em dia, os católicos de todo o mundo. “Os princípios estabelecidos por Paulo VI na Populorum Progressio continuam, de facto, extraordinariamente actuais em relação às assimetrias que conhecemos hoje”, concluiu.

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Agência ECCLESIA

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