Líbano: de modelo de tolerância à instabilidade

O Líbano foi, até à década de setenta do século passado, um modelo de tolerância e convivência entre as suas diversas comunidades étnicas e culturais. Cristãos, muçulmanos e drusos tinham encontrado uma fórmula de partilha de poder que permitiu, durante muitos anos, a estabilidade política e o desenvolvimento económico do país. O Líbano, a chamada Suiça do Médio Oriente, era o símbolo daquilo que se desejava para o Médio Oriente. De então para cá tudo mudou. Nos meados dessa década, por razões sobejamente conhecidas, o país foi palco de uma destruidora guerra civil que marcou profundamente as relações entre as diversas comunidades, dando à Síria o pretexto ideal para uma intervenção militar em larga escala. Damasco acabou com a guerra civil, mas fez do Líbano um protectorado seu. Só que atentado contra Rafic Hariri, imediatamente atribuído a Damasco, veio alterar o “status quo” As grandes manifestações populares que se seguiram, e a pressão internacional, obrigaram à retirada da Síria. Muitos acreditaram então que estavam criadas condições para o Líbano recuperar a sua dignidade nacional e a sua imagem exemplar de país tolerante e democrático. Mas, infelizmente, o país já estava profundamente contaminado por uma divisão aparentemente insanável, sobretudo a partir do momento em que o Hezbollah assumiu o estatuto de movimento dominante entre a comunidade muçulmana. O seu êxito na resistência à intervenção armada israelita no Líbano conferiu-lhe mesmo uma grande dimensão política nacional. Protegido pela Síria, este movimento aproveita todas as oportunidades para garantir o regresso de Damasco à política do país, e a queda do governo actual é uma das condições para esse regresso. O cerco ao centro de Beirute e a última greve geral inscrevem-se claramente nesta estratégia. Só que, e como se depreende dos tumultos estudantis, o Hezbollah não faz a unanimidade entre os muçulmanos. Por isso, há mesmo quem tema que o Líbano se venha a transformar, rapidamente, um novo palco de confronto entre xiitas e sunitas. A probabilidade daquilo que alguns chamam a “iraquização” do Líbano é cada vez maior. Finalmente, e para tornar mais confusa e perigosa a situação naquele país, temos de acrescentar ainda a divisão que atingiu a comunidade cristã maronita. A fidelidade a alguns dos antigos senhores da guerra é responsável por esta divisão e faz com que, por exemplo, as iniciativas do Hezbollah tenham apoio público e entusiasta de muitos cristãos. O Líbano está a transformar-se numa manta de retalhos em vias de se romper.

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