XVIII Jornadas Nacionais da Pastoral Familiar

Intervenção de D. António Carrilho na sessão de abertura Saudação e palavra de abertura 1. Ao iniciarmos os trabalhos das XVIII Jornadas Nacionais de Pastoral Familiar, a minha primeira palavra, como Presidente da Comissão Episcopal do Laicado e Família (CELF), é de saudação e agradecimento. Saudação aos membros da Comissão e do seu Secretariado Nacional (SNALF) aqui presentes, e especialmente à Equipa do Departamento Nacional de Pastoral Familiar, a quem dirijo, também e desde já, um sincero agradecimento pela generosidade com que se empenhou na organização destas Jornadas, apostando em fazer delas um tempo de cuidada formação, de maior conhecimento mútuo, de convivência e oração, de partilha entre pessoas de Dioceses e Movimentos diversos. Desde já, pois, muito obrigado à Equipa do Departamento e a quantos colaboraram com ela, muito obrigado também a todos os Conferencistas e Animadores dos Grupos, pessoas bem conhecidas e de comprovada competência nas matérias que lhes estão confiadas. Saudação e agradecimento a todos os presentes, sacerdotes e leigos, vindos de mais longe ou de mais perto, através dos Secretariados/Serviços Diocesanos ou dos Movimentos de Pastoral Familiar: agradeço a vossa participação, que constitui, sem dúvida, um claro testemunho de interesse pelas questões da família, que se revestem de particular importância e acuidade, nesta hora da vida da Igreja e da Sociedade portuguesa. “A transmissão da fé na família” 2. Decorrem as presentes Jornadas, tendo como acontecimento eclesial de referência o V Encontro Mundial das Famílias com o Papa Bento XVI, realizado em Valência (Espanha), na 1.ª semana de Julho p.p.. Queremos fazer memória desse Encontro, trazê-lo até nós, retomando o seu tema base A transmissão da fé na família e aprofundando a sua mensagem através das conclusões do Congresso Teológico-Pastoral, já publicadas no Osservatore Romano em língua portuguesa, e sobretudo pelas intervenções do Papa no discurso da vigília de oração, na noite de sábado, e na Homilia da Missa do Encerramento, na manhã do domingo. São dois textos, já editados entre nós, que será bom conhecer e dar a conhecer na íntegra, até como proposta de reflexão e debate nas famílias cristãs e nos Movimentos de Espiritualidade e Pastoral Familiar. Foi bom ver como o Congresso abordou o tema, centrando-o na vivência e na experiência de fé que os pais e toda a família transmite, quando se vive o ideal cristão de família. Não é, apenas, uma questão de “ensinar a doutrina” e iniciar os filhos na oração ou de os encaminhar para a catequese paroquial, mas a vida toda da família em experiência de fé, por onde passam todas as realidades que a caracterizam e afectam: o amor, a vida, o trabalho, a economia, o sofrimento… É o que podemos ler nas Conclusões do Congresso: “A família foi sempre lugar privilegiado para a transmissão do Evangelho. Os pais transmitem a fé mediante o seu ser e o seu viver como cristãos. Quando os filhos sentem a generosidade e o sentido cristão da vida, através das palavras e do comportamento dos pais e dos avós, aprendem gradualmente a seguir o seu exemplo, e orientam-se para os valores religiosos e para a vida sacramental: o sentido da paternidade de Deus, o amor pela Eucaristia, a devoção à Santíssima Virgem, o amor ao próximo, etc.”(n.26) Interpelações e desafios 3. Ao fazer memória do V Encontro Mundial das Famílias aqui diante de vós, famílias cristãs e agentes da pastoral familiar, eu não posso deixar de destacar algumas afirmações que lá foram acentuadas e constituem verdadeiras interpelações e desafios à nossa acção pastoral. Disse-as à chegada de Valência, e repito-as agora, certo de que poderão contribuir para novas atitudes na vida de família e novos caminhos de renovação da pastoral familiar. Assim: – Há que ter a consciência de que a família é importante para formar o homem e a mulher, é o melhor lugar de humanização; e que a família cristã é indispensável para formar o cristão, é o principal âmbito da educação da fé. – A hora presente é de “emergência educativa” para todos e de todos os membros da família e dos jovens, em particular, promovendo-se e apoiando a descoberta dos valores humanos e cristãos, necessários à vida em família e em sociedade. Desta emergência resultará o que se chamou “a conversão dos pais aos filhos”, deixando os pais de estarem “ausentes”, como tantas vezes acontece, para se tornarem “presentes” aos filhos, com mais tempo para eles e maior esforço de compreensão do “mundo cultural deles” (música, leitura, TV, etc.). – É preciso reconhecer a importância e o valor do testemunho das famílias cristãs na nova evangelização, como pequenas “Igrejas Domésticas”, e a necessidade delas viverem uma experiência de Igreja na Igreja. Nestes aspectos muito se espera dos Movimentos e Serviços de Pastoral Familiar. – Há necessidade de maior intervenção das associações de famílias na vida social e política, na afirmação pública dos valores e na promoção/defesa dos direitos da família. Em termos mais operativos, o próprio Papa Bento XVI sublinhava a necessidade de : – intensificar esforços de evangelização e catequese das famílias, mediante formas de comunicação e linguagem que torne acessível e mais compreensível o pensamento da Igreja sobre o fundamento antropológico da família e o enriquecimento significado pelo matrimónio cristão; – criar “redes de apoio” às famílias, através da acção conjunta dos serviços paroquiais e diocesanos, movimentos familiares e outras associações eclesiais, consoante as suas capacidades e carismas. Família e Vida na Sociedade actual 4. Como dizia há pouco, estas Jornadas decorrem num tempo em que as questões da família e da vida se revestem de particular importância e acuidade na Sociedade portuguesa. Já o referia a CELF na Nota Pastoral a propósito da última Semana da Vida, em Maio p.p., ao escrever: “Não podem deixar de nos preocupar, neste momento, alguns aspectos da cultura ambiente que são abertamente contrários à cultura da vida tal como a tradição da Igreja a entende, e certos comportamentos que se vulgarizam e questões que apontam para nova legislação, sem salvaguardar a prioridade do serviço à vida e o respeito pela dignidade humana. Entretanto foi publicada, com data de 26 de Julho, a Lei 32/2006 sobre a Procriação Medicamente Assistida (PMA) e acaba de ser aprovada no Parlamento, na tarde do dia 19 deste mês de Outubro, a proposta de novo referendo para a chamada despenalização do aborto, designado por “interrupção voluntária da gravidez”. Como católicos, quais são as nossas atitudes e posições nestas matérias? O presente contexto cultural, social e político exige, sem dúvida, que os católicos conheçam e saibam afirmar os princípios relativos aos direitos fundamentais da pessoa humana, o primeiro dos quais é o direito à vida. Saibam discernir o que é exigência da própria natureza, da moral natural, e o que é imperativo da fé, da moral cristã. Esclareçam as suas consciências e sejam capazes de agir em conformidade e coerência: quando estão em causa direitos fundamentais da pessoa humana a “razão” terá de prevalecer sobre as razões do “coração”, designadamente nas Leis, tanto no caso da PMA como no caso do aborto, seja na lei vigente, seja na anunciada despenalização, ou melhor dito, liberalização (cf. Razões para escolher a vida, Nota Pastoral do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa, Fátima – 19 de Outubro de 2006). Princípios não negociáveis Quanto ao aborto, todos sabem que a Igreja sempre o condenou, porque considera que desde o primeiro momento da concepção, existe um ser humano, com toda a sua dignidade, com direito a existir e a ser protegido. Como escreve o Senhor Patriarca D. José Policarpo, em comunicado do passado dia 19, “se nós lutamos por uma Lei do Estado que defenda a vida humana desde o seu início é porque se trata de um valor universal, de ética natural e não apenas de um preceito da moral religiosa”; e ainda: “há muitos homens e mulheres que, não sendo crentes, são contra o aborto, porque defendem a dignidade da vida, desde o seu início”. Deixar-se conduzir pela “razão” e pela fé não significa menosprezar o “coração”, esquecer a dor e o sofrimento das pessoas, as razões de ordem moral, social, económica e outras que as levam a abortar. Ser pela “cultura da vida” obriga a defendê-la e a promovê-la, a procurar soluções e respostas positivas, com justiça e sentido de fraternidade, com “coração”, afinal! Quanto à Lei da PMA, também o que está em causa e importa salvaguardar, em consciência, para além das disposições da Lei promulgada, é o respeito pela vida e dignidade do embrião, como ser humano que é; na verdade, nem tudo o que é tecnicamente possível é aceitável do ponto de vista da ética natural e da moral cristã. Recordo a este propósito o que disse Bento XVI, no dia 30 de Março p.p., aos Parlamentares participantes no Congresso promovido pelo Partido Popular Europeu: “No que se refere à Igreja Católica, o interesse principal das suas intervenções no campo público é a tutela e a promoção da dignidade da pessoa e, por conseguinte, ela chama conscientemente a uma particular atenção aos princípios que não são negociáveis. Entre eles, hoje emergem os seguintes: – tutela da vida em todas as suas fases, desde o primeiro momento da concepção até à morte natural; – reconhecimento e promoção da estrutura natural da família, como união entre um homem e uma mulher baseada no matrimónio, e a sua defesa das tentativas de a tornar juridicamente equivalente a formas de uniões que, na realidade, a danificam e contribuem para a sua desestabilização, obscurecendo o seu carácter particular e o seu papel social insubstituível; – tutela do direito dos pais de educarem os próprios filhos. Estes princípios não são verdades de fé mesmo se recebem ulterior luz e confirmação da fé. Eles estão inscritos na natureza humana e, portanto, são comuns a toda a humanidade.” Maior atenção à família 5. Neste domínio do debate social e político sobre as questões da família, gostaria ainda de me referir ao Decreto-Lei n.º 155/2006 de 7 de Agosto, cuja publicação poderá ter passado despercebida a muita gente e que merece uma especial atenção por parte das famílias e das organizações que delas se ocupam. Através desse diploma são criados, no âmbito do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, dois órgãos governamentais: a Comissão para a Promoção de Políticas de Família e o Conselho Consultivo das Famílias, cuja composição, competências e modo de funcionamento aí se definem. Deixando de parte outros comentários, que a leitura do diploma facilmente sugere, designadamente no seu preâmbulo, quanto à própria noção de “família” ou de “famílias”, verificamos que não há qualquer referência expressa à participação de uma instituição ou pessoa representativa da Igreja Católica como tal, tanto na Comissão como no Conselho. Quanto à Comissão, prevê-se, no entanto, a possibilidade de participarem “nas suas reuniões, a pedido do seu Presidente, representantes e técnicos de departamentos governamentais ou outras entidades públicas ou privadas, bem como cidadãos cuja audição ou contributo sejam relevantes para a actividade da Comissão” (Art.º 6.º 4); quanto ao Conselho, para além das instituições já designadas, prevêem-se “oito representantes das organizações não governamentais representativas das famílias” e “três personalidades de reconhecido mérito no âmbito das políticas sociais” [Art.º 7.º 3 – c) e j)]. Na designação destas pessoas e entidades, não estaria bem o Governo se desconhecesse ou não tivesse em conta a acção da Igreja pelas famílias, com as famílias e junto das famílias, através de tantas instituições (associações, movimentos, grupos), dedicadas à formação dos jovens e, em especial, dos noivos e casais. Como é importante, também, que estas instituições da Igreja assumam as suas responsabilidades públicas, cooperando no debate das questões e lutando para que sejam respeitados e garantidos em legislação adequada os direitos das famílias. Votos finais 6. Caros Amigos: obrigado, mais uma vez pela vossa presença e participação. Que o Encontro corresponda às vossas expectativas e possa constituir um novo impulso para implantação e renovação da Pastoral Familiar entre nós, assegurando efectivamente a solicitude da Igreja pelas famílias, tendo em atenção as suas aspirações, os seus problemas e reais necessidades. Fátima, 21 de Outubro de 2006 + António José Cavaco Carrilho Presidente da Comissão Episcopal do Laicado e Família

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