Papa à margem das acusações de encobrimento de pedofilia

Um documentário da BBC, transmitido este Domingo, acusa o actual Papa Bento XVI de encobrimento de casos de pedofilia, a partir da “revelação” de um documento “secreto” da Santa Sé, “Crimen Solliciatonis”. A BBC e aqueles que a citam referem que, durante mais de 20 anos, o homem encarregado de zelar pela obediência aos termos do documento teria sido o Cardeal Joseph Ratzinger. O documento em causa, contudo, já foi objecto de discussão pública em 2003, aquando da crise dos casos de abusos sexual nos EUA e não é “secreto” há muito tempo. “Crimen Solliciatonis” é da responsabilidade do Cardeal Alfredo Ottaviani e o Cardeal Ratzinger só foi nomeado como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé em finais de 1981 – quase 20 anos depois deste documento. O arcebispo espanhol Julian Herranz, presidente do Conselho Pontifício para a Interpretação dos Textos Legislativos, confirmou já em 2003 que um documento do Vaticano, datado de 1962, recomendava que se guardasse segredo sobre casos de padres pedófilos. O documento refere-se aos “piores crimes”: o “abuso sexual cometido por um padre ou a tentativa de abuso”. E pede aos padres que, nestes casos, “façam o maior segredo (…), assim como a vítima (…), sob pena de excomunhão”. Segundo o Arcebispo Herranz, estes termos referiam-se exclusivamente ao contexto da confissão sacramental e não aos trâmites normais dos processos judiciais. Alguns advogados norte-americanos mostraram o texto de 1962 por ocasião do processo contra os padres acusados de pedofilia, nos EUA. O Vaticano emitiu normas específicas sobre esta matéria em 2001 – exgindo ser informado de qualquer caso de abuso sexual -, mas o “Crimen Solliciatonis” tinha já sido automaticamente substituído pelo actual Código de Direito Canónico (promulgado a 25 de Janeiro de 1983), como assegurou o Arcebispo Herranz. Na ordem jurídica, quando uma matéria é reordenada os procedimentos anteriores são suspensos – o que também acontece neste caso. João Paulo II, de facto, reorganizou toda esta matéria e o documento “Crimen Sollicitationis”, de 16 de Março de 1962, deixou de ser válido quase desde o momento em que o actual Papa iniciou funções na Cúria Romana. As várias explicações de hierarquia católica concordam em assinalar que o documento de 1962 – e o habitual sigilo que rodeia estes casos, nos tribunais eclesiásticos – não pretendia proteger os padres culpados, mas garantir um julgamento justo e salvaguardar a reputação do penitente e dos padres inocentes, tratando da violação do sigilo sacramental e não de crimes civis.

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