Mundo tem necessidade de Deus

O Evangelho e o empenho social são inseparáveis; justiça e paz tornem-se forças para a ordem social, salientou Bento XVI na homilia da Missa em Munique Bento XVI pediu aos católicos alemães que rezem para que a justiça e o amor se tornem forças decisivas na ordem do mundo. Na Missa celebrada na esplanada do bairro da feira, perante cerca de 250 mil pessoas, este Domingo, o Papa insistiu no conceito da ordem social como expressão irrenunciável da fé que fala logicamente também de Deus, de que somos filhos. A importância de ter “Deus como centro da realidade e como centro da nossa vida pessoal”, de tal modo que “Deus se torne a força determinante para a nossa vida e para o nosso agir”: foi o aspecto sublinhado por Bento XVI na homilia da Missa, partindo das leituras deste vigésimo terceiro domingo do Tempo Comum. Para o Papa, as três leituras desenvolvem um duplo tema, que no fundo permanece um só: Deus – centro da realidade e da nossa vida. Tanto a segunda Leitura (da Carta de São Tiago) como também o texto do Evangelho querem guiar-nos até Deus, conduzindo-nos assim pelo recto caminho. Ao tema “Deus” (observou Bento XVI), está estreitamente ligado o tema social: a nossa responsabilidade recíproca, pela supremacia da justiça e do amor no mundo”. “O amor do próximo, solicitude pela justiça, é o ponto de referência – a pedra de toque – para a fé e para o amor de Deus” – sublinhou o Papa. Tiago chama-lhe a “lei régia”, real – o que deixa entrever a palavra preferida por Jesus: a realeza de Deus, o domínio de Deus. Isto não quer dizer um reino qualquer que deve chegar um dia. Significa que Deus se deve tornar a força determinante da nossa vida, do nosso agir. É o que pedimos quando rezamos Venha a nós o vosso Reino!” “Pedimos que seja a vontade de Deus a determinar a nossa vontade, de tal modo que Deus reine no mundo”. “A lei da realeza de Cristo é também “lei de liberdade”: se todos pensamos e vivemos segundo Deus, tornamo-nos todos livres. Nasce assim a verdadeira fraternidade”. Detendo-se seguidamente no Evangelho, em que Jesus cura um surdo-mudo, Bento XVI fez notar que “ali se encontram de novo os dois aspectos do mesmo tema”: “Jesus dedica-se aos que sofrem, aos marginalizados. Cura-os e, abrindo-lhes a possibilidade de viver e decidir juntos, introdu-los na igualdade e na fraternidade”. “Jesus indica-nos assim a direcção do nosso agir”. A partir daqui, o Papa sublinhou que a intervenção e cura de Jesus não se limita à surdez dos ouvidos. Comunicando a fé, ele confere um outro “sentido” que tanto falta, e tragicamente, ao homem do nosso tempo. “Não existe apenas a surdez física, que em grande parte coloca o homem fora da vida social. Há uma fraqueza do ouvido – em relação a Deus – de que sofremos especialmente neste nosso tempo. Pura e simplesmente, já não conseguimos ouvi-Lo… Aquilo que se diz dele parece-nos pré-científico, ultrapassado. E com a surdez em relação a Deus, perde-se – naturalmente – também a nossa capacidade de falar com Ele, a Ele. Vem assim a faltar-nos uma percepção decisiva. Correm o risco de extinguir-se os nossos sentidos interiores. Perdendo esta percepção, circunscreve-se de modo drástico e perigoso o raio da nossa relação com a realidade. Reduz-se de modo preocupante o horizonte da nossa vida”. O Evangelho conta que Jesus colocou os dedos nos ouvidos do surdo-mudo, pôs um pouco de saliva na língua do doente e disse Effatà, abre-te… “A mesma coisa realiza Jesus novamente, hoje em dia, repetidamente. No Baptismo, Ele realizou sobre nós o mesmo gesto e nos disse Effatà, para nos tornar capazes de sentir Deus e para nos restituir a possibilidade de falar com Ele. Contudo, o Baptismo, não tem nada de mágico”. “O Baptismo abre um caminho. Introduz-nos na comunidade daqueles que são capazes de escutar e de falar. Introduz-nos na comunhão com o próprio Jesus que foi o único a ver a Deus e que pode portanto falar dele: mediante a fé, Jesus quer partilhar connosco o seu ver a Deus, o seu escutar o Pai e falar com Ele”. “O Evangelho – prosseguiu ainda o Papa, com insistência – convida-nos a tomar consciência de que existe em nós um défice relativamente à nossa capacidade de percepção”. Como exemplo concreto desta limitação de horizonte e de sensibilidade, Bento XVI confidenciou que alguns bispos africanos, reconhecidos pelas ajudas reconhecidas da Igreja alemã para projectos de índole social, deploravam a dificuldade de obter idêntico apoio quando se trata de planos de evangelização. “Obviamente – comentou Bento XVI – há quem pense que os projectos sociais devem ser promovidos com toda a urgência, ao passo que as coisas que dizem respeito a Deus ou mesmo à fé católica seriam de menor importância”. Ora “a experiência daqueles bispos (africanos) é precisamente a de que há que dar a precedência à evangelização: é preciso que seja conhecido, acreditado e amado o Deus de Jesus Cristo, para que Ele converta os corações, de tal modo que as questões sociais possam progredir, se empreenda a reconciliação, se combata por exemplo a sida enfrentando as suas causas profundas e tratando os doentes com a devida atenção e amor. A dimensão social e o Evangelho são inseparáveis entre si” A concluir, Bento XVI advertiu uma vez mais que “o mundo tem necessidade de Deus, nós temos necessidade de Deus”. “Mas de que Deus?” interrogou-se, logo sublinhando que o Deus de que o mundo precisa é o Deus de Jesus Cristo, o Deus incarnado, cuja “vingança” (de que fala o profeta na primeira leitura desta Missa) é a Cruz, o “não” à violência, o amor “até ao fim”, até ao extremo. Para o Papa, este é o Deus de que temos necessidade: “Não faltamos ao respeito às outras religiões e culturas, ao profundo respeito pela sua fé, se confessamos em alta voz e sem meios termos aquele Deus que à violência opõe o seu sofrimento; que perante o mal e o seu poder eleva, como limite e superação, a sua misericórdia”. Antes da recitação do Angelus, por volta do meio dia, quase a concluir a celebração, o Papa recordou em duas palavras o ponto central da sua homilia: “tanto na vida de cada um como também para a convivência serena e pacífica entre os homens, é necessário ver Deus como centro da realidade e como centro da nossa vida pessoal”. Exemplo excelente desta atitude de fé – fez notar o Papa – encontramo-lo em Maria, a Mãe do Senhor. “Durante toda a sua vida terrena, ele foi a Mulher da escuta, a Virgem de coração aberto a Deus e aos homens. Assim o entenderam desde os primeiros séculos do cristianismo os fiéis, dirigindo-se-lhe confiadamente e invocando a sua ajuda e intercessão junto de Deus”. Este o papel de Maria: “Ela, Maria, permanece a serva do Senhor que nunca se põe no centro, mas nos quer conduzir a Deus, quer-nos ensinar um estilo de vida em que Deus é reconhecido como centro da realidade e da nossa vida pessoal”.

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