«Há uma base de entendimento que começa pela nossa condição frágil, pela dúvida, pela incerteza, pela intuição de que o outro me salva, eu dependo do outro», destaca capelão hospitalar
Lisboa, 19 jan 2021 (Ecclesia) – O padre António Pedro Monteiro defende que o caminho de unidade dos cristãos pode ser realizado numa “pastoral de mesa”, que possibilite o encontro “olhos nos olhos” disponíveis para “um conhecimento de verdade”.
“Gosto de pensar que Jesus era conhecido por ser um glutão e um ébrio. Isto é uma inquietação para nós. Ele é descrito como comendo e bebendo com pecadores, cobradores de impostos, pecadoras públicas. É um grande método pastoral – desculpem se é prosaico – a possibilidade de nos encontrarmos à mesa. Só assim é que nos conhecemos, e na verdade, só amamos o que conhecemos”, explica à Agência ECCLESIA o capelão hospitalar e padre da congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos).
O religioso acredita que o caminho se faz por “pequenos gestos e gestos concretos”.
“Já que há caminhos que estão quase vedados, quase encerrados – discussão teológica, doutrina, culto – há outros caminhos em aberto”, avança.
O padre António Pedro Monteiro é capelão hospitalar em dois estabelecimentos em Lisboa, no Hospital de Santa Marta e na Maternidade Alfredo da Costa, espaços privilegiados para o diálogo e para o “rezar juntos, caminhar juntos, trabalhar juntos” que o Papa Francisco indica ser necessário no caminho ecuménico.
“A Igreja reconhece que é necessário rever alguma postura (nos hospitais); deixa de ser a que ensina e é a que cuida, é mais mãe do que mestra, mais hospital de campanha do que escola. Há uma base de entendimento que começa pela nossa condição frágil, pela dúvida, pela incerteza, pela intuição de que o outro me salva, eu dependo do outro. É um registo onde nos sentimos pares, onde não temos nada a ensinar, muito a escutar, a aprender e a partilhar”, explica.
Ainda adolescente, a estudar no Seminário dos Dehonianos, em Coimbra, participou em eventos da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos quando “se deu o espanto”, e o padre António percebeu que havia uma “diversidade das famílias cristãs”.
“Não existe se não se vê, se durante o nosso caminho somos privados de contacto e, sobretudo, de contacto informal, pode dar-se o caso de irmos caminhando como se fossemos os únicos, os melhores e as coisas se esgotassem no que fazemos e no que somos. É fácil crescermos como os verdadeiros, os mais antigos, os autênticos, fundados por Jesus. Repetimos frases que, rapidamente podemos dizer, que são erradas. As coisas vão-se diluindo quando nos conhecemos e percebemos que as convenções e as frases que fomos arrumando para nos justificarmos, vale pouco”, sublinha.
O sonho de unidade da Igreja que explica, já se concretizava nos encontros, é para o padre António um caminho do qual não quer desistir.
“Gosto de pensar que o projeto de Jesus fomos concretizando com estas intuições de Paulo, em pequenas comunidades, mas o sonho de Jesus está por cumprir. Não prescindo da palavra sonho por ter medo de no dia em que deixarmos de sonhar, corremos o risco que, já percebemos nos dias e contextos, fazer sempre o mesmo, fazemos o que é urgente, replicamos os mesmos eventos, ficamos numa espiral fechada”, assegura.
Enquanto religioso e na diversidade de trabalhos que realizam, o padre António Pedro Monteiro acredita que poderá haver um diferencial no trabalho ecuménico realizado por congregações religiosas e missionários.
Sublinhando não querer fazer “generalizações”, o padre António fala num trabalho “sempre urgente” e de preparação “de eventos” numa comunidade paroquial e os religiosos com “alguma liberdade” poderão colaborar com o urgente e “ajudar a pensar no necessário”.
“Só conseguimos continuar a sonhar e a cumprir o sonho de Jesus se todos os dias nos esforçarmos por não sermos o mesmo, não fazer da mesma forma, com os mesmos e para os mesmos. Que bom se pudessem acrescentar esta possibilidade de pensar no necessário fora do calendário previstos, dos destinatários previstos, fora dos mesmos métodos”, valoriza.
O programa Ecclesia na Antena 1 vai esta semana centrar-se em testemunhos de religiosos colocam o diálogo ecuménico e inter-religioso na sua ação missionária e apostólica.
LS