Fiéis Defuntos: Pandemia obrigou a novas formas de luto, diz sacerdote com formação em Psicologia Clínica de Saúde

Padre Luís Pedro Costa, da Diocese de Lamego, considera que a fé tem papel fundamental para «fazer sentido da morte»

Foto: Agência ECCLESIA/CB

Cinfães, 28 out 2020 (Ecclesia) – O padre Luís Pedro Costa, da Diocese de Lamego, disse à Agência ECCLESIA há “um novo luto” que as pessoas estão “a viver” por causa da pandemia de Covid-19, que remete essa vivência para “um âmbito familiar” sem a comunidade.

“Apesar de já não estarmos em confinamento, as pessoas continuam a ter de fazer o luto dentro de um âmbito familiar e falta a rede social, que ajuda até a expressar um sentimento”, explicou o sacerdote, mestre em Psicologia Clínica de Saúde.

O pároco de São Cristóvão de Espadanedo e de Santa Maria Maior de Tarouquela considera que este novo luto pode “prejudicar aquilo que é um processo natural”, porque “aceitar a realidade da perda” se torna “muito difícil” para quem neste processo.

O entrevistado destaca que os rituais dessa dimensão da perda “foram retirados”, durante o confinamento, nomeadamente “o velório, a celebração, a proximidade das pessoas, a rede social e a rede comunitária”, que é quem “acolhe quem sofre”.

Aceitar a realidade é habituar-se a viver sem a pessoa, há rotinas que se criam, há hábitos que se têm e isso é um bocadinho mais difícil de mudar do que aquilo que a gente pode pensar e, por fim, estabelecer um vínculo diferente com a pessoa que partiu porque ela não tem obrigatoriamente, nem deve, desaparecer da nossa vida”.

O padre Luís Pedro Costa considera “fundamental” que a morte da pessoa faça sentido para quem está de luto, por isso, nas suas homilias exequiais, insiste “muito” na “parte da esperança” porque as pessoas vão começar a viver a vida de uma forma diferente quando colocam “o outro num vínculo diferente e que vai haver o reencontro”.

A esperança hoje, segundo o entrevistado, “torna-se mais difícil”, mas as pessoas vão “redescobrindo” o que leva “à criatividade da esperança que é muito importante” para encontrar “novas formas de manifestar o amor”.

“Tem havido essa necessidade, novas formas de inventar a proximidade, novas formas de contacto, tudo isto são situações de esperança e é muito importante na dimensão da vivência do luto e na dimensão da vivência da nossa fé perante o outro irmão que precisa de nós, esta Igreja em caminho, condicionados com aquilo que temos de momento mas não resignados”, desenvolveu.

O padre Luís Pedro Costa afirma que o mestrado em Psicologia Clínica de Saúde “é um complemento essencial” à formação em Teologia.

“Sinto-me muito mais enriquecido no meu ministério, sem dúvida, com o estudo constante da psicologia e da teologia; No fundo a psicologia e a teologia é para ajudar as pessoas a serem felizes: Continuo a achar e digo sempre que o projeto que Deus tem para mim, e para nós todos, é sermos felizes”, desenvolveu o pároco de São Cristóvão de Espadanedo e de Santa Maria Maior de Tarouquela, na Diocese de Lamego.

O sacerdote, que escreveu a tese ‘Religião e processos de significado de luto’, afirma que a religião “tem um papel fundamental” para ajudar a “fazer sentido da morte”, a partir da fé na ressurreição.

“Podemos ter toda a fé do mundo que perante a perda de alguém que amamos vamos sofrer. Se não podemos retirar o sofrimento temos de retirar aquela carga fatalista que aprece que vivemos dentro desta perspetiva que nada mais há”, assinala o padre Luís Pedro Costa.

O sacerdote realça a importância da “Igreja comunidade, uma rede de apoio que é sempre essencial” e alerta para as “expressões” que se transmitem “à pessoa enlutada não são palavras de esperança” e “vão um bocadinho contra aquilo que deve ser a vivência da morte”.

Foto: Agência ECCLESIA/CB

O luto, acrescenta, é não só por “alguém, um ente querido” mas também pela “perda de emprego, por uma coisa que se quer conseguir atingir e não se consegue”.

Segundo o especialista “só passado um ano” é que se consegue perceber se uma pessoa adulta “está a conseguir ultrapassar” o luto; para as crianças fala-se em seis meses.

Em ambiente de consulta, o padre Luís Pedro Costa explica que recebe católicos, pessoas de outras confissões cristãs e outras religiões, entre outros.

“A gente sofre sem saber porquê, é diferente de sofrer quando sabe qual o motivo e qual é a razão, e aqui muitas vezes é a purificação das ideias porque continuamos ainda com a ideia de que Deus é a causa. Digo sempre que Deus não é a causa, Deus é a solução”, acrescenta.

A entrevista integra a próxima emissão do programa 70×7, este domingo, pelas 17h30, na RTP2.

CB/OC

A Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) divulgou uma nota sobre a comemoração dos Fiéis Defuntos (2 de novembro), pedindo às autoridades que evitem o encerramento de cemitérios, em dias “intensamente sentidos pela piedade dos fiéis católicos”.

O Conselho de Ministros aprovou um decreto que declarou o dia 2 de novembro como dia de luto nacional, em Portugal, “como forma de prestar homenagem a todos os falecidos, em especial às vítimas da pandemia”.

O Governo anunciou ainda a proibição de circulação entre concelhos de 30 de outubro até 3 de novembro.

A CEP vai celebrar uma Eucaristia de sufrágio pelas vítimas da pandemia em Portugal, no dia 14 de novembro, às 11h00, na Basílica da Santíssima Trindade do Santuário de Fátima.

A ‘comemoração de todos os fiéis defuntos’ remonta ao final do primeiro milénio: foi o Abade de Cluny, Santo Odilão, quem no ano 998 determinou que em todos os mosteiros da sua Ordem se fizesse nesta data a evocação de todos os defuntos “desde o princípio até ao fim do mundo”.

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Agência ECCLESIA

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