Migrações humanas à deriva no mar de ninguém

Comunicado da OCPM e Obra Secretariados Diocesanos da Pastoral de Migrações 1. As migrações forçadas, desesperadas e traficadas na/da região subsaariana são “sinal dos tempos” eloquentemente trágico dos desequilíbrios sociais a nível regional e de desigualdade de oportunidades de vida que caracteriza esta parte do hemisfério humano. Dois mundos – o europeu e o africano – aliados pelo Mediterrâneo, tão interdependentes, vizinhos e com imensa história em comum, tornam-se cada vez mais “estrangeiros” um face ao outro: por a riqueza de uns ter origem no empobrecimento de outros; e pelas fronteiras de uns terem sido impostas por aqueles que hoje se orgulham de as não ter mais. 2. Em 2002 foram feitas perto de 10.000 intercepções ao largo das Canárias. Em 2005 as autoridades recolheram, das frágeis embarcações 5.000 pessoas. Acredita-se que, pelo menos, nesse mesmo ano, outros 1.000 terão morrido no Atlântico, ao tentar a travessia a todo o custo, confiando mais no destino do que nos próprios “passadores”. No entanto, relativamente ao ano em curso já se contabilizam cerca de 6.000 imigrantes subsaarianos (1.500 apenas na primeira metade de Maio) recolhidos com vida do mar pela polícia espanhola: uns acabam instalados em centros de detenção e outros são repatriados “à força”, fruto da negociação entre países de origem e de trânsito. Ontem, em Ceuta e Melilla, uns saltaram muros e vedações super vigiadas. Hoje, outros, desejosos de chegar às ilhas Canárias – paraíso euro-atlântico – pagam a armadores de barcos duvidosos e aceitam a travessia em embarcações “à pinha” sem bússola, à deriva da própria ilegalidade. Importa não esquecer que as praias de refúgio, tão procuradas na vizinha Espanha, poderão, em breve, situar-se na costa portuguesa insular ou continental… 3. Neste Dia de África que hoje se assinala, a OCPM e os Secretariados diocesanos da Pastoral de Migrações (SDPM), reunidos recentemente, saúdam todas as comunidades africanas a residir no País e agradecem o seu contributo para o progresso do país e testemunho de fé “integrada” nas paróquias. Afirmam a sua inteira solidariedade com os voluntários cívicos, homens e mulheres religiosos e defensores dos direitos humanos que procuram encontrar soluções humanas e justas, em Espanha, na Europa e África, para a “grave situação de emergência humanitária” que se continua a viver no Norte e Costa ocidental africana sem sinais de abrandar. A nova vaga de imigrantes e refugiados subsaarianos é forte sinal de denúncia dos efeitos perversos da actual política de cooperação da União Europeia e política migratória e de asilo – de teor restritivo, repressivo e minimalista – para defender a fronteira externa da União Europeia (UE) da imparável e lucrativa imigração ilegal de que a própria UE é cúmplice no delito por não favorecer de forma legal, ordenada e “comunitária” a mobilidade de cidadãos de países terceiros e a sua justa e necessária integração. 4. Por fim, apelamos aos cristãos, aos homens e mulheres religiosos, seja qual for a religião, para que nas suas orações quotidianas pessoais e comuns celebrem a memória dos milhares de imigrantes e refugiados mortos no mar, no deserto, nas montanhas, nas fronteiras e mãos de traficantes, dos quais se desconhece a identidade de muitos. Que em Deus encontrem a definitiva Pátria de paz e felicidade, procurada para si e para os seus familiares nos tortuosos caminhos da ânsia da dignidade desencontrada por continuar a “não haver lugar para eles na casa comum”. Porto, 25.05.2006 Obra Católica Portuguesa de Migrações com Secretariados Diocesanos da Pastoral de Migrações de Viana do Castelo, Porto, Bragança-Miranda, Lamego, Coimbra, Setúbal, Évora e Beja

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