Universidade Católica e Cáritas Portuguesa inauguraram Ano Laudato Si com conferência do cardeal filipino
Lisboa, 23 jun 2020 (Ecclesia) – O cardeal Luis Antonio Tagle, Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, disse hoje que gostaria de ver a encíclica ‘Laudato Si’ ensinada em Universidades de “economia, de engenharia, de tecnologia” e estudada em áreas de “segurança nacional”.
“Acredito que (a encíclica) pode ser um guia para o desconfinamento mas será um caminho difícil de fazer. Espero que a «Laudato si» seja estudada em escolas de economia, de engenharia e tecnologia, também por pessoas de áreas da segurança nacional para, que em diferentes frentes, possamos trabalhar juntos para um mundo melhor”, afirmou o cardeal filipino na inauguração do Ano ‘Laudato Si’, iniciativa da Universidade Católica Portuguesa (UCP), em parceria com a Cáritas Portuguesa.
O cardeal filipino partiu da sua experiência na Ásia para afirmar a necessidade de se escutarem vivências “fora do mundo ocidental”, bem como “outras religiões e tradições”, e afirmou que a pandemia de Covid-19 convida a “rever o estilo de vida”.
“Aprendemos também com as tradições de outras religiões. Em especial os monges budistas: eles levam a simplicidade da vida a sério – mendigam para eles e partilham com os pobres; o que sobrar, os monges comem. Há ordens medicantes na Igreja católica que pedem, não só para si mas para outros. Perante a pandemia somos pedintes. Talvez cristãos e não cristãos sejam convidados a rever o seu estilo de vida”, sublinhou.
A conferência digital quis inaugurar um ano de atividades da UCP em torno da convocação do Papa Francisco do Ano ‘Laudato Si’, numa parceria entre a instituição de ensino e a Cáritas Portuguesa que o cardeal Tagle encorajou, assinalando a importância da reflexão e da necessária “paciência” porque, explicou, “ninguém promove um mundo melhor sozinho”.
“Nenhuma pessoa sozinha pode promover um mundo melhor, mas é uma ação conjunta. Trata-se de uma transformação de um mundo que aceitamos durante muitos anos e para a mudança acontecer, é necessária paciência”, reconheceu.
O responsável indicou “ações simples” que no contexto universitário, mas também “nas famílias”, os jovens podem ser “motivados para entrar nos ensinamentos da «Laudato Si»”: “Que tal agradecer antes de comer? Ou agradecer a quem prepara a comida? Ou partilhar a minha t-shirt que já não uso, mas outra pessoas precisa? Quando os jovens começam a sentir a alegria de ser grato e ser cuidador com alguém, então podem ser mais comprometidos pessoalmente e profissionalmente com a «Laudato Si»”.
Na conferência que proferiu, o cardeal sublinhou a pertinência da encíclica, com “ensinamentos para todos os tempos” e afirmou a atualidade da mesma perante a “experiência da pandemia” que o mundo enfrenta, refutando a ideia de um “documento verde” mas propondo-a como “corpo da Doutrina Social da Igreja”.
“É o espírito do reino de Deus, o espírito sobre os impactos da transformação, da renovação da sociedade, das atividades humanas e das condições que indicamos como vida social, que procuram a dignidade das pessoas e o destino dos bens da terra, o que chamamos de bem comum”, indicou.
Sendo um documento da Igreja é dirigido “não apenas a cristãos”, daí que o Papa Francisco convoque “pessoas de outras disciplinas para o debate, reflexão, discussão e à procura da dignidade humana, no uso e no desenvolvimento da criação”.
“A ‘Laudato Si’ vê a Universidade, como a Católica, como uma aliada que pode empreender um debate para promover a dignidade humana e o bem comum através do cuidado e da esperança para o mundo”, explicitou.
O colaborador do Papa, presidente da ‘Caritas Internationalis’, entende que a encíclica lançada em 2015 ajuda a “redescobrir ou a recuperar o horizonte do dom”, nas pessoas e nas coisas, contrariando a visão “utilitarista do tempo atual” e é o “antídoto para a cultura prevalecente, a que descarta vidas humanas”.
“Ao encaramos o dom que temos, valioso, apreciado, não o queremos destruir, mas tratar para que cresça, se desenvolva em todas as suas potencialidades. A «Laudato Si» ajuda-nos a recuperar isso, a ver cada ser humano como um dom e não como um objeto ou o seu uso”, reconheceu.
O contexto pandémico mostrou, “de forma escandalosa”, como a circulação de dons, e a economia circular “está longe da realidade”, lamentou, colocados ao serviço de “armamento e segurança”, e retirando recursos para dar “o básico às pessoas”.
“No momento em que um dom é captado por uma pessoa, quando é detido por alguém deixa de ser um dom. Assim, devemos questionar a nossa estrutura económica, as formas de comércio e de transações, a publicidade, os sistemas financeiros, a promoção do estilo de vida, eles promovem a circulação de dons?”
“Bens essenciais, alimentos, medicamentos, água, dons essenciais de Deus não estão disponíveis para todos, em especial para os pobres. Quando os peritos dizem para lavarmos as mãos frequentemente para que o vírus não se espalhe, há pessoas que não tem água para beber e para lavar as mãos. Estão muito vulneráveis aos vírus”, indicou.
O cardeal Tagle afirmou que a encíclica do Papa Francisco é ainda um convite ao homem para que ele se perceba como “criatura” que habita o mundo, como “custódio da criação” e não como “dono”.
“Nas questões sobre imigrantes e refugiados a linguagem revela uma mentalidade de donos da terra, mas somos apenas cuidadores e convidados. E como convidados devemos ser responsáveis pelo uso. Devíamos preparar este mundo para outra geração, não apenas para os imigrantes, mas para os que virão”, afirmou.
A encíclica que o Papa Francisco publicou em 2015 é também um convite à celebração “da vida, de cada folha, de cada nascer do sol e de cada pessoa”.
Esta pandemia, porque estamos dentro das nossas casas, levou-nos a perder o sol, o cheiro da erva, do cheiro do pão nas ruas. Estamos num mundo funcional. Somos convidados a cuidar, com simplicidade, a celebrar e a entregar o que temos às novas gerações para que eles celebrem”.
No início do encontro o presidente da Cáritas Portuguesa explicitou o desejo a partir da conferência encontrar “resultados para a vida”.
“A Laudato Si trouxe o desenvolvimento humano integral e a ecologia humana envolve muitas coisas: uma casa onde morar, cuidar das relações de vizinhança, inserir as pessoas numa rede de comunhão e pertença, com um único objetivo de promover o bem comum. Que esta iniciativa seja mais um tijolo na construção da casa comum”, afirmou Eugénio Fonseca.
LS