Conduzidos pelo Espírito

Homilia da Missa Crismal, em Évora “O Espírito do Senhor está sobre Mim, porque Ele me ungiu” (Lc.4,18). Uma vez mais, nesta manhã de Quinta – feira Santa, a liturgia nos convida a meditar nesta passagem do Evangelho de S. Lucas. Estamos a celebrar a Missa Crismal um nome que provém da bênção do Crisma e dos outros Santos Óleos, que serão utilizados na celebração dos sacramentos e de outros actos litúrgicos. Reunimo-nos, nós os membros do presbitério diocesano à volta do altar desta Igreja-mãe numa atitude de intima comunhão. É neste enquadramento sugestivo, que ecoam aos nossos ouvidos as palavras proferidas por Jesus na sinagoga de Nazaré, há dois mil anos: “O Espírito do Senhor está sobre Mim”. Palavras proféticas proferidas por Isaías e que o Filho de Deus feito homem, aplica a Si mesmo e à sua missão. Também nós temos razão para aplicá-las a nós, porque Ele nos ungiu. Meditar no Espírito Santo, na sua presença activa em nós, assume particular importância na nossa época, uma época de materialismo acentuado e de agressivo laicismo. Vive-se, de facto, como se Deus não existisse ou como se Deus fosse um obstáculo ou inimigo do homem. O Papa João Paulo II, fazendo o diagnóstico nesta situação, escrevia na Exortação Apostólica Ecclesia in Europa: “Numerosos são os sinais preocupantes que inquietam, no início do terceiro milénio, o horizonte do continente europeu (…). No continente europeu, certamente não faltam prestigiosos símbolos da presença cristã, mas, com a afirmação lenta e progressiva do secularismo, correm o risco de reduzirem-se a meros vestígios do passado em vários sectores públicos, é mais fácil definir-se como agnóstico do que crente. A cultura europeia dá a impressão de uma “apostasia silenciosa” por parte do homem saciado, que vive como se Deus não existisse” (nn.7-10). São palavras duma enorme gravidade, escritas pelo saudoso e grande Papa, na sequência do Sínodo dos Bispos para a Europa. Perante tal quadro, é legítimo interrogarmo-nos: Não se deixará a comunidade cristã, por vezes, absorver por esta onda secularizante e materialista? E, nós sacerdotes, não correremos também o risco de nos deixarmos conduzir pelo espírito do mundo, em vez de sermos conduzidos pelo Espírito Santo, pelo Espírito de Deus, que esteve sempre presente em todos os passos de Jesus? Aproveitemos este encontro sacerdotal para olharmos para o exemplo que Jesus nos deixou. Ao ser baptizado no rio Jordão, “Deus ungiu-O com o Espírito Santo e com poder. E Jesus andou por toda a parte, fazendo o bem e curando todos os que estavam dominados pelo diabo, porque Deus estava com Ele”(Act. 10, 37-38). Não foi conduzido, portanto, por razões pessoais, por interesses materiais, não agiu motivado objectivos humanos, políticos, económicos ou ideológicos, mas apenas pelo Espírito de Deus, para fazer a vontade do Pai, que consistia na salvação dos homens. Foi assim, que, conduzido pelo Espírito Santo, se retirou para o deserto, a fim de iniciar o seu ministério, dedicando-se à oração, ao sacrifício e à luta contra o demónio e o mal (Mt4,1-11). Conduzido pelo Espírito, evangelizava, curava os doentes. Conduzido pelo Espírito orava no meio das actividades apostólicas como quando, ao observar a simplicidade e a sabedoria dos humildes, “estremeceu de alegria sob a acção do Espírito e disse: “Bendigo-Te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelastes aos pequeninos” (Lc, 10,21). Conduzido pelo Espírito, ofereceu-se a Si mesmo no Sacrifício da Cruz” (Hbr.9,14-15). Durante aqueles anos de vida pública, antes da Páscoa, Jesus deixou-se conduzir pelo Espírito. Depois da Páscoa, Jesus Ressuscitado passa a conceder o Espírito. No domingo da Ressurreição, dirigindo-se aos Onze Apóstolos, “soprou sobre eles, dizendo: “Recebei o Espírito Santo”. Os pecados daqueles a quem perdoardes serão perdoados. Os pecados daqueles a quem não perdoardes não serão perdoados “ (Jo.20,22-23). Esta entrega do Seu Espírito aos discípulos, isto é, à Igreja assume a sua grande expressão na manhã do Pentecostes. S. Pedro, explicando ao povo o extraordinário acontecimento, exclamou: “Foi este Jesus que Deus ressuscitou, e disto nós somos testemunhas. Tendo sido elevado pelo poder de Deus, recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e derramado como vedes e ouvis” (Act. 2,32-33). Ser discípulo de Jesus, isto é, ser cristão ou católico significa pois ser conduzido pelo Espírito Santo. Nós, padres, temos razões especiais para vivermos a mensagem acerca da presença actuante do Espírito Santo. O Papa Bento XVI, dirigindo-se, no início deste ano aos seminaristas de Roma, disse: “Convido-vos a manter o olhar fixo em Cristo, autor e aperfeiçoador da fé (cf. Hb 12,2). Com efeito, quanto mais permanecerdes em comunhão com ele, tanto mais sereis capazes de seguir fielmente as suas pegadas, de tal maneira que, “na caridade que é o laço da perfeição” (Cl.3,14) amadureça o vosso amor pelo Senhor, sob a guia do Espírito Santo”. Coloquemo-nos pois docilmente, neste dia dos sacerdotes, sob a guia do Espírito Santo Ele nos orientará com segurança na fidelidade ao nosso compromisso feito no dia da Ordenação. Recordemos as palavras proferidas pelo Bispo ordenante na oração de ordenação: “Nós vos pedimos, Pai todo poderoso, constituí este vosso servo na dignidade de presbítero; renovai em seu coração o Espírito de santidade (…) Pela sua pregação, as palavras do Evangelho frutifiquem, pela acção do Espírito Santo”. Precisamos de estar atentos a esta acção silenciosa e forte do Espírito em nós. O que reclama silêncio interior e libertação dos ruídos incessantes que nos cercam. Como aconteceu com Jesus, o Espírito conduzir-nos-á pelos caminhos da nossa vocação. Conduzir-nos-á aos tempos de oração diante do sacrário, ajudar-nos-á a celebrar na fé a Eucaristia; fará de nós mensageiros de união, de paz, de perdão, de alegria. O Espírito ensinar-nos-á a servir, na obediência à vontade do Pai, submetendo a nossa vontade à vontade divina. Com o dom do Espírito seremos testemunhas de Jesus Cristo, de seu Reino, da sua mensagem salvadora, seremos luz e sal e não deixaremos que os critérios do mundo nos dominem e pervertam. Coloquemos este projecto de vida espiritual, de vida segundo o Espírito, de vida interior nas mãos e no Coração Imaculado de Maria.

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