Responsável pela Pastoral no território realça a necessidade de «reinventar» linguagens e métodos sem colocar em causa o essencial dos sacramentos e da liturgia
Aveiro, 28 jun 2019 (Ecclesia) – Um inquérito da Diocese de Aveiro revela que nos últimos 18 anos quase 30 mil pessoas deixaram de ir à Missa dominical no território.
Em entrevista à Agência ECCLESIA, o padre Licínio Cardoso, coordenador da Pastoral na Diocese de Aveiro, ressalva que estes são “dados ainda muito preliminares” mas que representam uma realidade “desafiante” para a Igreja Católica local.
“A primeira constatação que fazemos é que em 2001 tínhamos cerca de 66 mil pessoas que habitualmente iam à Eucaristia dominical, e agora notamos que há um abaixamento para as 37 mil pessoas, cerca de 44 por cento”, indica o sacerdote.
Para aquele responsável, parte destes números está relacionada “com a demografia, com a taxa de natalidade”, pois é visível a existência de “assembleias cada vez mais envelhecidas”.
No entanto, o padre Licínio Cardoso frisa que a quebra populacional não explica tudo e considera fundamental um trabalho de recuperação a vários níveis, a começar pela formação cristã.
Por um lado, “há um universo de gente que se declara cristã, que se considera católica, mas para quem o Domingo e a Eucaristia já não têm aquele valor que devem ter, como Dia do Senhor, como dia da comunidade que se reúne”.
“Vemos também que os miúdos passam pela Catequese, mas Jesus passou ao lado. Então a nossa grande aposta vai passar pela família, queremos implementar a catequese familiar ou catequese com famílias”, aponta ainda o coordenador da Pastoral da Diocese de Aveiro, que destaca também o contexto dos jovens, cada vez mais fora da prática cristã.
“Paróquias onde o esquema do crisma é a meta, é evidente que nesses meios a baixa da prática cristã é maior. Temos de conseguir fomentar um maior envolvimento dos jovens”, acrescenta.
A Diocese de Aveiro está a viver até 2021 um triénio dedicado à temática da vocação, e o próximo ano pastoral será precisamente dedicado à vocação da família.
A intenção é “ter uma vida cristã menos centrada em doutrinas, em estruturas e tradições, mas uma vocação muito voltada para a descoberta de Jesus”, concretiza o padre Licínio Cardoso, que quer dedicar uma atenção redobrada a outras realidades que influenciam a vida das famílias cristãs, na cultura atual.
Como a progressiva perda da “valorização do Domingo como dia de descanso, dia da família”, ou a conciliação do tempo em família com o mundo do trabalho.
“É de facto uma luta, a questão do tempo. Se calhar temos de pensar em alternativas para valorizar a Eucaristia, independentemente de ser ou não ao Domingo”, admite o mesmo responsável.
Questionado sobre o modo como este estudo interpela também a comunicação da Igreja Católica da região, a sua relação com as comunidades locais, o sacerdote aveirense admite a necessidade de uma nova linguagem.
“Nota-se que há uma dupla questão sobre a linguagem: a nossa linguagem sacramental não impacta hoje nas pessoas, porque as pessoas desconhecem essa linguagem. Depois temos uma linguagem sacramental muito associada ao moralismo, de quem pode e quem não pode, de quem é regular ou de quem é irregular”, analisa o padre Licínio Cardoso.
Este responsável defende a importância de “reinventar” a linguagem pastoral, mas sem com isso pôr em causa o que é essencial , o sentido da fé, dos sacramentos e da liturgia.
“As pessoas muitas vezes quando falam disso querem a simplificação não da linguagem mas dos conteúdos. Nós, como alguém já disse, não podemos descafeinar a exigência do Evangelho, não podemos torná-la light. Temos é que a apresentar um pouco mais como o Papa, que vai reinventando o discurso, mas o substrato é sempre o mesmo. E esta nossa capacidade de reinventar está um pouco mais complicada”, concede o sacerdote.
Ao longo dos próximos meses, os dados do inquérito vão ser cruzados ao nível das paróquias e arciprestados, uma vez que agora só estão reunidos “números absolutos por concelho”, sendo que os casos mais complicados dizem respeito às regiões de Ílhavo e de Aveiro, onde a participação na Missa dominical está pouco acima dos 9 por cento; por outro lado, Vagos é o concelho de Aveiro onde a adesão às celebrações é mais elevada, estando situada acima dos 20 por cento.
O objetivo passa também por relacionar todas as estatísticas apuradas “com os dados de inscrições na catequese” e “nas aulas de EMRC”, isto para perceber o trabalho a fazer com os mais novos.
“Acreditamos que para novembro ou pouco mais além desse período conseguiremos ter estes dados todos, porque depois também queremos que eles sejam trabalhados em cada arciprestado e em cada paróquia, para que as pessoas tenham uma noção do que se está a passar”, refere o padre Licínio Cardoso, que entende o inquérito como uma ferramenta fulcral para o trabalho da diocese aveirense, nos próximos anos.
“Há mais pastoral para além dos números, mas não pode haver pastoral sem estes números porque eles indicam-nos a realidade em que estamos inseridos”, conclui o coordenador da Pastoral da Diocese de Aveiro.
JCP