Paulo Rocha
Angola e Portugal cruzam-se nos caminhos da História. Ao longo de mais de meio milénio, aconteceram encontros e desencontros, contam-se casos sombrios, momentos mais ou menos felizes estampados em páginas de capítulos que é impossível apagar, mesmo que algumas vontades o desejassem. E percorrem-se também narrativas únicas, simpatias e amizades entre pessoas, famílias, grupos… Entre países!
Passados tempos de opressão, vividos anos de guerra pela libertação e depois entre civis, há um novo horizonte na história de Angola. E que horizonte, num país de largos e longos olhares, no campo, na cidade e nos bairros sem fim que lhe dão um dinamismo único.
O ciclo político que se inaugurou em setembro de 2017 parece abrir uma nova era. Mesmo sem certezas e a viver de grandes expectativas, os angolanos, a maioria dos angolanos, espera que se estreitem as assimetrias sociais escandalosas, muitos acreditam na possibilidade de melhor repartir o poder e as riquezas e começam a considerar como possível o fim de um fatalismo que deixava na pobreza a maioria das populações para juntar na mão de alguns bens ganhos legitima ou ilegitimamente.
Tendências na história de um povo partilhadas com os portugueses, agora de sobremaneira por causa da presença do presidente angolano, na sua primeira visita de Estado, a motivar também a revisão na opinião lusa acerca de povos africanos, tendencialmente negativa e conservando com facilidade estigmas de um racismo bacoco e marcas de insegurança e de corrupção.
E é sobretudo a presença em terras africanas que dá outro alcance a essa revisão do juízo sobre um povo. A que me foi possível experimentar durante alguns dias, pouquíssimos dias e na velocidade que acompanha quase todos os trabalhos de reportagem, confirma, desde logo, a necessidade de conhecer em proximidade para depois julgar – uma certeza de todos os tempos e cada vez menos possível diante da confiança cega na mediação tecnológica – e a urgência de estar, pisar terras e lodos, olhar lágrimas e sorrisos, falar a mulheres e homens e apertar mãos calejadas pelo tempo para depois… Para depois calar e ouvir! Tentar compreender tradições e culturas e aceitar as urgências de cada povo. É nessa ocasião que se percebe o que se pode fazer pelo outro, pelos outros, na disponibilidade de corresponder às surpresas do momento, que o são só para os de fora. Em Angola, por exemplo, há guerras que permanecem: um país cheio de fome, pobre em qualquer canto e habitado por povos que dependem de um trabalho agrícola para subsistir, onde a principal luta é por uma enxada! Hoje!