A cruz escondida

A guerra, na Síria, comentada por uma criança de 10 anos

“Tenho um amigo no Céu…”

Jad Abed desconhece o que significa viver em paz. Tinha apenas dois anos quando começou a guerra na Síria. Desde então, a casa onde vivia foi destruída por uma bomba, assim como a escola, o bairro, grande parte da cidade. Mas o que Abed mais lamenta é a morte de um dos seus maiores amigos. “Agora está no Céu…”

Tem apenas 10 anos. A guerra roubou-lhe a inocência da infância, o prazer das brincadeiras ao ar livre, as gargalhadas descontraídas com os amigos, tudo. A guerra tirou-lhe também a casa, a escola e até a vida de um amigo. Um dos melhores amigos. Mesmo que a guerra acabasse agora, neste preciso instante, Jad Abed já não iria conseguir ser apenas uma criança. Jad Abed nasceu há dez anos na cidade de Alepo, uma das mais martirizadas na guerra da Síria. Alguns bairros ficaram completamente desfigurados tal a violência das batalhas que ali aconteceram. “Recordo o ruído das bombas a caírem perto de nós e uma que explodiu no telhado da nossa casa, fazendo com que parte do edifício desmoronasse. O meu pai tirou-nos logo de lá e levou-nos para o sítio onde vivemos hoje. Não podemos regressar a casa pois está quase toda destruída. Espero que os meus brinquedos estejam intactos.” Quando Abed revolve a memória, lembra-se invariavelmente de um Natal em que a guerra estava mais encarniçada, em que os mercados estavam meios vazios, em que não havia nada. Nem pão… Foi ainda antes de a sua casa ter sido destruída. Uma noite, nesse Natal, recorda Abed, começámos a ouvir assobios e gritos pedindo às pessoas para virem para as ruas. Iria haver algum ataque? O que seria? “Os meus irmãos e eu estávamos aterrorizados. Porém, depressa demos conta que estavam a chegar umas carrinhas com uma ração de pão para cada família. Foi um dos Natais mais duros…”

“Perdi um amigo…”

A guerra na Síria entrou já no oitavo ano. Os combates, agora, estão confinados apenas a algumas regiões onde resistem ainda bolsas de grupos rebeldes. Alepo é considerada como a cidade mártir tal foi o grau de destruição que se verificou em alguns dos seus bairros. Jad Abed pede-nos para rezarmos por todas as crianças sírias que, como ele, não puderam viver tranquilamente a sua infância. Ele não quer brinquedos, nem roupa ou guloseimas. Nada disso. Pede-nos paz. Precisa que a guerra desapareça para sempre, que deixe de ser um pesadelo. Jad Abed é uma criança e pede-nos que rezemos por todas as crianças sírias, para que possam viver o resto das suas vidas sem medo, sem o ruído das bombas em bairros em ruínas. “Precisamos de paz para podermos curar as nossas feridas e regressarmos, o mais depressa possível, a uma vida normal.” Jad Abed tem apenas 10 anos. Estas são palavras difíceis de imaginar numa criança. Abed pede-nos paz pois conheceu, como poucos, o horror da guerra. “Perdi um amigo, um bom amigo, que morreu num bombardeamento quando estava à espera do autocarro escolar. Agora tenho um amigo no Céu que vai contar a Deus o que está a acontecer aqui, na Síria…” Jad Abed tem apenas 10 anos.

Paulo Aido

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Agência ECCLESIA

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