7000 quilómetros de fé

“Peregrinar não é apenas andar, não se pretende apenas percorrer um caminho ou realizar um determinado número de quilómetros. Trata-se de andar num caminho motivado «por» ou «para algo». A peregrinação tem um sentido motivador e uma riqueza pessoal, cultural e religiosa que é necessário descobrir”. É com este pressuposto que Amaro Franco se põe a caminho. Já perdeu a conta às vezes que caminhou a Santiago de Compostela. Depois de em 2001, ter peregrinado a pé a Roma, este peregrino propõe-se agora realizar, da mesma forma, com início no próximo dia 4 de Outubro, uma peregrinação aos três maiores santuários da Cristandade: Santiago de Compostela, Roma e Jerusalém. São mais de 7000 km, passando por 13 países diferentes, que pensa percorrer durante cerca de oito meses, estando a chegada a Jerusalém prevista para Maio ou Junho de 2008. A caminho de Roma em 2001, numa peregrinação feita a partir de Viana do Castelo até ao Vaticano, teve conhecimento de um peregrino francês a caminho de Jerusalém. “Contactei com os seus colegas, com formadores e apesar de não me ter cruzado com ele, fui acompanhando de casa em casa a sua experiência, que muito me tocou”, explica à Agência ECCLESIA. Depois de voltar de Roma e “mastigar toda a experiência de quatro meses a caminhar”, sentiu que a sua próxima meta seria Jerusalém. O sonho nasceu assim. A resposta a este sonho “é muito pessoal”, dificilmente explicável mas adianta que o seu espírito precisa de estar a caminho, “quero sentir uma entrega, uma liberdade em Deus mesmo tendo de fazer um percurso maior”. “Penso a caminhar, porque o caminhar liberta-me”. Será uma peregrinação em que “não estou sozinho”. O cruzamento com tantas pessoas que vai encontrar pelo caminho garantem-lhe “a companhia e as interpelações”. Alguns amigos estão a tentar arranjar-lhe companhia para alguns percursos, “durante alguns dias e em especial em itinerários em Espanha ou França”, acrescenta. Partindo da Sé de Braga, seguindo o Caminho Português, Amaro Franco vai dirigir-se ao sepulcro do Apóstolo São Tiago Maior em Compostela, onde prevê chegar no dia 13 de Outubro. Depois segue pelo Caminho Primitivo até a Igreja de São Salvador de Oviedo, nas Astúrias, prevendo a sua chegada para o dia 1 de Novembro. Em Oviedo cumpre os primeiros 500 km. De Oviedo, percorrendo o Caminho Astur-Leonês, pensa chegar a Léon entre os dias 8 ou 9 de Novembro. Dali, segue pelo Caminho Francês até Saint-Jean-Pied-de-Port onde calcula estar no dia 1 de Dezembro. Os primeiros 1000 km seriam alcançados em Pamplona. Seguindo pelo Caminho do Piemonte, pensa chegar a Lourdes na abertura das comemorações dos 150 anos das aparições da Virgem Maria a Bernadette, assinalados a 8 de Dezembro. A chegada à fronteira de Itália está prevista para início de Janeiro de 2008, chegando a Roma ainda nesse mês ou princípio de Fevereiro. De Roma, segue para Assis, San Marino, Florença, e Veneza, que pensa alcançar no princípio do mês de Março. As etapas iniciais, ou até Roma, estão previstas, “tenho a vantagem de já ter feito esse caminho”, apesar de algumas alterações, pois o percurso em Roma não está totalmente fechado. “O caminho quer em França quer em Itália, em 2001, não estava sinalizado”, situação diferente agora seis anos depois. Entre Roma e Veneza o caminho está também traçado, “passando por Assis que é um caminho que está sinalizado”. Sobre o percurso até Veneza – o chamado «Caminho da Luz» – está ainda à espera de informações sobre as etapas a percorrer. “Tenho recebido mapas que me indicam estradas, mas interessam-me caminhos”. A partir de Veneza conta com a experiência de um amigo, Pe. Luiggi que realizou o caminho até Jerusalém. Em Setembro vão encontrar-se, ainda em Portugal, para trocarem informações sobre a viagem. A partir de Veneza “não há caminhos sinalizados”. Há registo de peregrinos a fazer o percurso até Jerusalém, “havendo ainda uma organização francesa que apoia pessoas que queiram fazer o caminho”, adianta Amaro Franco, referindo que “por ano há cerca de seis pessoas a fazer o caminho de Jerusalém, mas portugueses ou espanhóis não tenho conhecimento”. Depois de Itália segue pela Eslovénia (Ljubljana), Croácia (Zagreb), Sérvia (Belgrado e Nîs), Bulgária (Sofia e Plovdiv), Turquia (Istambul, Eskisehir, Konya e Adana), Síria (Halab), Líbano, Israel e Palestina. A chegada a Jerusalém está prevista para o final do mês de Maio ou início do mês de Junho. Conta estar de regresso a Portugal entre Julho e Agosto de 2008. Para um percurso de 7000 quilómetros “não há preparação possível”, adianta, por isso opta por se preparar emocionalmente “sobretudo através da oração”. É complicado “deixar tudo para trás” – a família, as pessoas com quem convive diariamente, “a tranquilidade da vida numa cidade, o conforto da internet e dos telefones”, explica. Na verdade é uma peregrinação que com a dificuldade inerente e apesar de preparada, “há sempre o factor desconhecido, ainda mais com um percurso longo como este”. A sua preparação incide no “espírito aberto e aceitar tudo o que aparecer no meu caminho”, refere, adiantando que nem tudo serão facilidades no caminho, pois “o mais fácil é desistir”. Aguardando informações, o peregrino enfrenta outros problemas. Espera informações de algumas embaixadas, “mas enfrento dificuldades para conseguir autorização de entrada na Síria e no Líbano”. O problema é “não aceitarem a entrada nestes países sabendo que estou a caminho de Jerusalém”, adianta. Apesar das dificuldades, Amaro Franco não esmorece. “O ser humano é excepcional” e tem encontrado demonstrações de incentivo. Em Portugal e Espanha conta utilizar os albergues de peregrinos, em França poderá também encontrar alguns albergues, mas “em maiores dificuldades vou tentar ficar em igrejas e paróquias”. Contando com o “apoio institucional” e tendo recebido a bênção de D. Jorge Ortiga, “vou contactar com o Arcebispo para me abrir algumas portas”, nomeadamente na Igreja de Santo António dos Portugueses, em Roma, onde pensa descansar uns dias. Esta peregrinação está a ser amplamente divulgada. “É quase uma peregrinação nacional”, constata o peregrino, que pretende conseguir algumas ajudas de custo. Mas adianta que independentemente do financiamento “eu vou partir dia 4 de Outubro”. A verba financeira prende-se sobretudo com a possibilidade de criar uma página na internet e um blog para que quem fica possa acompanhar diariamente a peregrinação. “Criar ferramentas para que as pessoas possam também peregrinar com textos, reflexões e fotografias de cada etapa”, explica. Estão em elaboração novos materiais de forma a “envolver mais as pessoas”. Um kit de peregrino, “a possibilidade de se receber um postal pelo caminho”, uma colecção de serigrafias de alguns artistas são ideias a desenvolver, adianta o peregrino. Mas as dificuldades não se prendem apenas com o financiamento. As mudanças climáticas – uma vez que inicia a peregrinação no Outono, enfrentando o Inverno e terminando no Verão – que vai encontrar desenha um quadro difícil de prever. “O ideal seria eu partir de Braga com uma mochila de cinco quilos com roupa adequada para essa altura e à medida que fosse enfrentando as variações de temperaturas, tivesse uma mochila adequada à minha espera”, explica. Mas também para esta estafeta é preciso financiamento. Amaro Franco recorda a peregrinação em 2001 que fez a Roma e na altura “também senti medos” – houve sofrimento físico “tendinites, problemas musculares, tive que ir ao hospital”, recorda. Vai enfrentar países em guerra “mas tento não pensar nisso”. As experiências que foi acumulando nas peregrinações anteriores que foi fazendo ao longo da vida, são recordações que o vão acompanhar. Cheio de confiança afirma que “o peregrino é apóstolo, porque mesmo o que vai calado, transmite a fé que o move”.

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